Análise

Se clubes querem apoio à MP dos direitos de TV, é melhor jogar limpo com torcedores

Por
André Pugliesi
20/07/2020 15:31 - Atualizado: 29/09/2023 23:14
Se clubes querem apoio à MP dos direitos de TV, é melhor jogar limpo com torcedores
| Foto: Arquivo/Gazeta do Povo

Trinta e nove clubes de Série A, B, C e D do Brasileiro, entre eles Athletico, Coritiba e Paraná, assinaram manifesto de apoio à MP 984, a proposta assinada por Jair Bolsonaro que altera os direitos de transmissão dos jogos. Perfeito, a manifestação é livre.

Agora, para que o lobby das equipes avance em Brasília, e, ainda, ganhe respaldo nas arquibancadas, é preciso jogar limpo. E o manifesto divulgado pelo grupo tem pontos questionáveis e, diria até, comicamente inacreditáveis.

O texto diz, para começar, que "com mais partidas sendo exibidas, teremos um futebol mais democrático, mais acessível e mais barato". E aí já surge uma pulga atrás da orelha do tamanho do ex-zagueiro Odvan, do Vasco.

O futebol na TV pode ficar mais barato? Pode. Vai ficar? Difícil dizer. A experiência com a pulverização de streamings de filmes e séries, até então, mostra que, para contar com um catálogo abrangente, sai tão ou mais caro que uma assinatura de TV à cabo.

O formato, digamos, "normal" do pay-per-view do Brasileirão, do canal Premiere, oferece praticamente todos os jogos da Série A, mais de 300 partidas por um valor único. Montante que, aliás, sempre foi bem alto.

Como seria no formato da medida provisória, que confere aos mandantes os direitos da partida? Ok, eu assino o streaming do meu time e vejo os 19 duelos dele como mandante. Agora, quanto sairia para ver todas as partidas do Nacional? Quantos streamings eu teria de pagar?

Impossível responder. Duro acreditar que clubes que cobram caríssimo por ingressos aos jogos passem a encampar uma "democratização" on demand. Mas, vai que o mercado se acomoda com as novas opções e os preços caem? Melhor esperar.

Outro ponto fala que a MP "empodera os clubes a negociar seus direitos e incentiva a união entre as equipes. Quanto mais os clubes estiverem unidos, mais vão ganhar". De novo, mais um pulga atrás da orelha, agora do tamanho do Júnior Baiano.

União entre os clubes? A história do futebol brasileiro mostra que camaradagem não é o forte entre as nossas equipes, ao contrário. São inúmeras os capítulos de traições, com a participação, sempre, de CBF e federações locais.

Vamos lá: tais como a criação e, posteriormente, a implosão, do Clube dos 13, a pitoresca Primeira Liga e quaisquer outros episódios que tenham envolvido a divisão de mais do que R$ 1 para o fim que fosse.

Tomemos como base o cenário local. Athletico e Coritiba se reuniram para transmitir um Atletiba via Youtube em 2017, formato que, posteriormente, fez os rivais brigarem até na Justiça. Sem contar outros episódios, de graves a prosaicos.

Diante de uma nova perspectiva de divisão dos direitos, distribuição do dinheiro, entrada de investidores em potencial, enfim os clubes vão esquecer décadas de sacanagem? O mundo atual não permite otimismo nem para ir à esquina, mas, vai que acontece.

Há, por fim, o ponto que considero, digamos, até anedótico: "E o país ganha com os clubes mais sólidos financeiramente, maior geração de empregos e crescimento de impostos pagos aos governos".

Tudo bem, vamos abraçar o melhor cenário, crer em "clubes mais sólidos financeiramente", acreditar em "maior geração de empregos", mas, pensar em "crescimento de impostos pagos aos governos", aí não dá, né. A pulga vira o David Luiz: além de grande, cabeluda e desengonçada.

Em levantamento do início do ano, clubes de futebol no Brasil deviam à União R$ 5,3 bilhões em impostos. Sem contar outros tipos de tributos, calotes trabalhistas, e deixemos de lado, ainda, os perdões de dívidas, os parcelamentos tais como o Profut etc.

Os clubes brasileiros são péssimos pagadores de impostos, com raríssimas exceções. Historicamente. Assim, confiar que vão quitar os débitos anteriores, pagar os atuais e, ainda, honrar os futuros, só sendo um ingênuo definitivo.

De certo que, embora a movimentação do Flamengo tenha ocorrido por causa própria, sem qualquer discussão, e impulsionada por interesses políticos, debater o desequilíbrio da distribuição das cotas de TV é extremamente saudável. Assim como abrir novas frentes.

Agora, para que o sistema evolua, a grana seja melhor dividida entre os clubes e turbine o futebol brasileiro de uma forma geral, é preciso jogar limpo. Se a conversa caminhar contaminada por lorotas, fica mais complicado.

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Trabalhou na Gazeta do Povo entre 2005 e 2023. Cobriu, in loco, o Pan-Americano do Rio de Janeiro, em 2007, a Copa América da Argentina, em 2010, a Olimpíada de Londres, em 2012, a Copa do Mundo do Brasil, em 2014, e a Copa do Mun...

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