A falta de investimentos pesados na infraestrutura aeroportuária brasileira nas últimas décadas gerou uma incerteza quanto à sua capacidade para atender o aumento da demanda pelo transporte aéreo nos próximos anos.
Dos 12 aeroportos mais movimentados do país, somente três (Brasília, Confins e Viracopos) suportarão o crescimento com a atual estrutura de pistas ou poderão ser ampliados sem grandes impactos, ou seja, sem remoções de propriedades privadas ou danos ambientais. Cinco estão limitados pela malha urbana (Congonhas, Fortaleza, Porto Alegre, Recife e Santos Dumont) e quatro poderão incrementar o sistema de pistas (Curitiba, Galeão, Guarulhos e Salvador), mas a um custo alto, seja financeiro ou social.
Hoje, o sistema de aeroportos no Brasil atende quase na plenitude a necessidade das companhias aéreas e comporta o volume atual do tráfego aéreo. A preocupação, no entanto, é em relação ao futuro.
“Não se investe em novos aeroportos no Brasil. A grande parte dos investimentos é feita através dos processos de concessão de grandes aeroportos. Com exceção de São Gonçalo do Amarante, em Natal, não foi construído mais nenhum aeroporto no país. Falta uma visão a longo prazo”, opina o professor do Programa de Engenharia de Produção da Coppe/UFRJ, Elton Fernandes.
“As aeronaves hoje têm equipamentos de última geração, com motores super potentes, mas muitas vezes a infraestrutura não permite usar na plenitude essas aeronaves”, reforça o diretor de Segurança e Operações de Voo da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), Ronaldo Jenkins.
A administração dos principais aeroportos brasileiros ficou por décadas a cargo da Infraero, do governo federal. A falta de recursos para a empresa, motivada pelo baixo investimento em infraestrutura e à consequente lentidão dos processos licitatórios, travou projetos que, se realizados, se antecipariam ao crescimento da demanda.
Desde 2012, no entanto, o processo de concessões tem colocado uma nova perspectiva em relação à infraestrutura aeroportuária no país. Até agora, seis aeroportos são administrados pela iniciativa privada (Brasília, Confins, Galeão, Guarulhos, São Gonçalo do Amarante e Viracopos). Outros quatro serão concessionados em 2016 (Florianópolis, Fortaleza, Porto Alegre e Salvador).
“Depois de concessionados, nossos aeroportos estão passando por uma transformação muito grande. Brasília, Guarulhos e Galeão estão tocando uma série de obras para aumentar a capacidade de pista e de pátio. Isso tudo somado à implementação da Navegação Baseada em Performance [PNB, na sigla em inglês] tem melhorado a infraestrutura aeroportuária”, observa o chefe da Seção de Planejamento de Aeródromos do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea), capitão Marcos Roberto Peçanha dos Santos.
Ampliação e novos aeroportos
Mesmo os aeroportos concessionados, ou que estão nesse caminho, estão limitados em relação ao crescimento físico. A malha urbana que se concentrou ao redor dessas estruturas dificultam e, em alguns casos, impedem a ampliação no sistema de pistas e de terminais.
“O espaço aéreo é um recurso finito, tem uma limitação. Hoje a maior limitação é a infraestrutura aeroportuária, até por conta de recursos. Crescer os aeroportos não é uma tarefa simples”, completa o capitão Peçanha.
Não é mesmo. Exemplos não faltam. O aeroporto Galeão, por exemplo, que no contrato de concessão tem uma obrigatoriedade de construir a terceira pista quando atingir 215,1 mil pousos e decolagens por ano, deve encontrar obstáculos na desapropriação de áreas próximas.
O mais movimentado do Brasil, o de Guarulhos, opera atualmente com duas pistas paralelas. Caso o aumento da demanda se confirme, em algum momento haverá a necessidade da construção da terceira pista. Como consequência, a desapropriação de uma área superior a 2 quilômetros quadrados. Um custo muito alto que neste momento não é viável nem mesmo para a concessionária que administra o complexo.
Diante desse cenário, é normal que surja o interesse pela construção de novos aeroportos, mais afastados das cidades e que apareçam como alternativas ao sistema atual. Seriam importantes para desafogar os terminais existentes e para atender a aviação regional.
O capitão Peçanha, do Decea, amplia essa realidade para toda a América Latina. “A malha urbana ao redor dos aeroportos é um problema internacional. No Brasil, é muito semelhante com o restante da América Latina. Alguns países já estão construindo novos aeroportos que permitam uma expansão. É um movimento normal e salutar. Se extrapolar a capacidade, não tem jeito, é preciso um novo aeroporto, mesmo que seja mais distante dos centros urbanos”, diz.
Otimização
Enquanto isso não acontece, os vários agentes do segmento da aviação procuram formas para otimizar a capacidade de pista e de pátio dos aeroportos.
Os órgãos de controle de tráfego aéreo planejam maneiras para melhorar o fluxo do espaço aéreo e mesmo reduzir a distância entre as aeronaves nas aproximações.
É o que se pretende implementar em Guarulhos, por exemplo. E usar, quando a infraestrutura permitir, operações simultâneas. É o caso de Brasília e que futuramente será o de Confins e Viracopos, com a construção de novas pistas.
Sem a necessidade imediata ou diante da falta da recursos, os administradores dos aeroportos investem em intervenções pontuais, como pistas de taxiamento que permitam saídas rápidas após pousos ou que cheguem até as cabeceiras das pistas de pouso e decolagem. Já as companhias aéreas investem em novos equipamentos e em treinamento das tripulações técnicas.
“Temos que otimizar a infraestrutura existente. Não adianta querer fazer uma coisa que a infraestrutura não tenha capacidade de absorver”, alerta Ronaldo Jenkins, da Abear. O capitão Peçanha complementa: “precisamos ficar atentos a indicadores de desempenho, tanto da capacidade do espaço aéreo como de espaço nos aeroportos, e então vamos tratando de uma maneira pontual.”
Plano aeroviário nacional
A ausência dos investimentos vultuosos para a infraestrutura aeroportuária e a pouca atenção dos poderes públicos locais torna o crescimento desenfreado da malha urbana ao redor dos aeroportos em um processo praticamente irreversível.
Isso tem a ver com a ausência de um Plano Aeroviário Nacional, que pensaria de forma global e integrada os aeroportos do país. Hoje, o sistema depende de iniciativas individuais dos administradores, seja a Infraero, as concessionárias ou governos estaduais e municipais. Não há uma uniformidade no planejamento.
“Quando existia o DAC [Departamento de Aviação Civil, que foi absorvido pela Anac em 2006], tínhamos esse Plano Aeroviário Nacional. Os planos eram refeitos de quatro em quatro anos. Hoje não temos mais isso. São iniciativas próprias, da Infraero, das concessionárias, não existe uma planificação nacional”, critica o diretor da Abear, Ronaldo Jenkins.
Uma iniciativa da Secretaria de Aviação Civil (SAC), órgão voltado exatamente para fomentar o desenvolvimento da infraestrutura aeroportuária no Brasil, tenta reativar esse plano aeroviário. Por enquanto é um projeto em vias de se tornar realidade.
“A perspectiva é de que a demanda dos aeroportos continue crescendo e o plano aeroviário nacional vai fazer a avaliação dessa infraestrutura para atender adequadamente toda a demanda pelo serviço”, diz o gerente de projeto do Departamento de Planejamento e Estudos da Secretaria de Aeroportos da SAC, Rodrigo Cruz. “Não podemos pensar um aeroporto como uma infraestrutura isolada e sim como parte de uma rede”, completa.
Raio-X dos 12 aeroportos brasileiros mais movimentados
Clique nos ícones para ler mais informações. Em vermelho, os aeroportos cercados pela malha urbana. Em amarelo, aqueles que podem crescer. Em verde, aeroportos com poucos obstáculos para crescimento. Aproxime o mapa para visualizar as áreas patrimoniais e possíveis obras.
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