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Por: Ana Biselli e Rodrigo Junqueira

Em 1493, após semanas e semanas no mar, Cristóvão Colombo, em sua segunda viagem ao Novo Mundo, chegou à esse arquipélago ao leste da Porto Rico. Diante da grande quantidade de ilhas e ilhotas e de uma certa saudade de companhias femininas, o grande almirante não teve dúvidas: batizou as ilhas com o singelo nome de “Las Once Mil Virgenes”.
Um século mais tarde, com os nativos das ilhas já extintos e com a derrota espanhola na guerra contra a Inglaterra, as várias potências européias resolveram que o mais justo seria dividir as tais 11 mil virgens irmamente, afinal havia virgens (ou ilhas) para todos. Deste modo, apareceram as Ilhas Virgens Espanholas (hoje, parte de Porto Rico), Francesas, Britânicas e Dinamarquesas. Isso mesmo, até mesmo os dinamarqueses estiveram por aqui. E gostaram tanto dos ares do Caribe que 50 anos mais tarde, através de trocas comerciais, adquiriam também as Virgens Francesas, além de expulsar os ingleses de uma de suas ilhas.
Finalmente, com as Virgens divididas entre Dinamarca e Inglaterra, os escravos começaram a ser trazidos aos milhares, tanto para as plantations (grandes fazendas) de cana-de-açúcar e algodão como para serem redistribuídos pelas outras ilhas do Caribe. No seu auge, as Virgens Dinamarquesas eram o principal centro de distribuição de escravos do mundo.

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Mas, com o fim da escravidão, as fontes de dinheiro secaram. Ninguém queria mais trabalhar nas plantations sob um sol escaldante, por horas a fio enquanto, logo ali, aquelas praias maravilhosas eram um convite irrecusável ao ócio. Amargando décadas de prejuízos, a Dinamarca resolveu vender o seu quinhão das Virgens aos Estados Unidos, aproveitando um súbito interesse americano, durante a 1.ª Guerra Mundial, quando temiam que as ilhas acabassem nas mãos dos inimigos alemães.

Assim, finalmente, chegamos à configuração atual, com as Once Mil Virgenes originais divididas entre EUA (Ilhas Virgens Americanas, ou USVI) e Inglaterra (Ilhas Virgens Britânicas, ou BVI). As ilhas estiveram praticamente fora dos mapas até que, a partir da década de 70, explodiram para o turismo. Considerando a beleza de sua natureza, principalmente das suas praias e suas águas transparentes, é de se estranhar que isso tenha demorado tanto tempo para acontecer.
Foi nesse paraíso que chegamos, após nossa temporada em Porto Rico. Apesar de termos 1000 dias para viajar por toda a América, só teríamos uma semana para dividir entre esses dois quase países, pois eles ainda são administrados por EUA e Inglaterra. Muito pouco tempo, infelizmente. Mas, como diz o poeta, a fila tem de andar e aproveitamos ao máximo, de forma intensa, esses sete dias nessas ilhas ainda bem desconhecidas dos turistas brasileiros.

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Chegamos na ilha de St. Thomas, a principal e mais movimentada da USVI. De lá, fugindo do movimento, seguimos logo para outra ilha, St. John, com uma população 10 vezes menor que das outras duas ilhas importantes do país (além de St. Thomas, a ilha de St. Croix, originalmente francesa). St. John chega perto da perfeição: uma ótima infra-estrutura, bons hotéis e restaurantes e bem pouco movimento de turistas. Praias, parques e trilhas muito bem cuidados e limpos, boas estradas e aluguel de carro bem barato. Ficamos dois dias aí, explorando toda a ilha, desde ruínas muito bem conservadas de plantations dinamarqueses (é tão estranho imaginar esses nórdicos como senhores de engenho! Vocês já imaginaram escravos falando dinamarquês?) até praias de areias brancas, finas como pó, e águas transparentes, perfeitas para a prática de snorkel.
De lá, atravessamos o canal de ferry e chegamos às BVI, na ilha de Tortola. Foram três dias neste país, com direito a mergulhos, praias e boa comida. Os mergulhos foram no mais famoso naufrágio do Caribe, o Rhone. Navio inglês de passageiros, o mais moderno e famoso de seu tempo, considerado inafundável pela marinha e pela imprensa da época, um dos primeiros navios a vapor da história. Pois bem, a natureza não gosta de navios inafundáveis e o Rhone foi a pique em 1867, sob um furacão categoria 5, em águas rasas próximas a Tortola. Mais de 150 pessoas morreram, muitos pertencentes à aristocracia caribenha da época. Foi a principal notícia por meses a fio, em jornais do mundo inteiro. Hoje, parte de um parque nacional, o naufrágio oferece mergulhos incríveis, oportunidade quase única de se conhecer um navio do século 19 ainda em ótimas condições. Como está em águas bem rasas, é possível mesmo fazer snorkel neste naufrágio. A visibilidade maior que trinta metros ajuda bastante!

O nosso último dia em BVI, passamos em outra ilha, chamada de Virgin Gorda. Lá está a principal atração turística do arquipélago, conhecida como “The Baths”. São enormes rochas que se amontoam numa praia de areias bem claras e mar azul turquesa, formando caminhos e pequenas cavernas entre elas. Enquanto a luz do sol entra pelas frestas, iluminando os salões , a água do mar entra por baixo, formando verdadeiras piscinas cobertas. Água bem limpa e azul, o eco do mar ecoando nas rochas que formam as paredes e o teto do local. A melhor palavra para descrever o local é “mágico”. Parece um cenário de filme, mas é apenas mais uma obra-prima da natureza, dessas de encher os olhos.

Por fim, no nosso último dia nas Virgens, voltamos para USVI, num moderno ferry que mais parece um avião. Fomo conhecer Charlotte Amalie, em St. Thomas. É a capital da ilha, cheia de construções reminiscentes dos tempos dinamarqueses: castelos, fortes, escadarias e algumas das mais antigas igrejas luteranas e sinagogas do Novo Mundo. Uma aula de história!
Partimos, mais uma vez, com aquela sensação de ter podido ficar por muito mais tempo, mas também cientes que aproveitamos ao máximo os dias que lá estivemos e que seguimos para novos lugares onde também nos esperam paisagens maravilhosas, costumes pitorescos e personagens que nos ajudam não só a entender a cultura local, mas que, em si só, são pontos altos da viagem. Foi assim com o Jim, um inglês crescido no Quênia, que morou dois anos numa estação científica na Antártida e radicado há 30 anos na BVI. Ele nos recebeu de braços abertos em seu restaurante e nos deu uma valiosa aula dos costumes locais, além de um show de slides sobre seu tempo na Antártida, numa espécie de noite VIP.
Ou então o casal americano Rick e Marcia, que nos receberam tão bem em St. Thomas, nos levaram para conhecer a ilha e trocar experiências. Esse calor humano que temos encontrado em todos os lugares tem feito a nossa viagem muito mais especial, tornando esse enorme continente que compartilhamos muito mais humano. São personagens como esses que temos certeza, vamos continuar a encontrar nessas nossas andanças.

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Acompanhe a viagem de Ana Biselli e Rodrigo Junqueira todas as quintas-feiras em nosso blog. Também acesse o site dos aventureiros: http://mildias.com/