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CARREGANDO :)

Por: Ana Biselli e Rodrigo Junqueira

Custou, mas saimos de Curitiba de novo. E dessa vez, com a nossa querida picape Fiona. É a etapa rodoviária da nossa viagem que está só começando. Incrível a dificuldade que foi nos desvencilharmos das nossas tarefas e afazeres em Curitiba. Acabamos ficando dois dias a mais que o esperado. Também, como é que se arruma um carro para uma viagem de mais de dois anos? Que roupas devemos levar? Que ferramentas ou equipamentos serão necessários durante esse período? Se for para levar tudo aquilo que um dia talvez necessitemos, iríamos precisar de um caminhão para acomodar tudo. Assim, é preciso escolher bem, sacrificar alguns itens e fazer tudo encaixar no porta-mala da Fiona. Assim fizemos e, finalmente, pudemos colocar o pé na estrada.

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Com o atraso de dois dias, resolvemos deixar o Pico Paraná para mais tarde. Em Julho deveremos estar de volta a Curitiba, numa passagem rápida para visitar uma sobrinha que está por nascer. Aí, teremos nova oportunidade de subir e acampar na mais alta montanha do Paraná. Assim, seguimos direto para o estado de São Paulo. O tempo chuvoso facilitou a nossa escolha entre os dois destinos possíveis: Cavernas do Petar e Ilha do Cardoso. Na hora da chuva, melhor estar numa caverna do que numa praia, certo? Assim, também a linda Ilha do Cardoso ficou para ser visitada em Julho. Seguimos direto para Iporanga, no vale do Ribeira, onde está a entrada principal desse parque estadual que ostenta mais de 350 cavernas!

Logo no início da viagem, um sinal de sorte! Ultrapassamos uma Defender com placa do Equador, toda carregada e adesivada. Deu para perceber que eles também estavam rodando a América! Eu nunca tinha visto um carro do Equador no Brasil e vê-lo justo no início da nossa viagem foi muito legal. Buzinamos para eles, fizemos festa e eles retribuíram. Depois dessa, os problemas da cidade grande e os atrasos da viagem definitivamente ficaram para trás.
Duas horas e pouco mais tarde, chegamos à Iporanga. Viemos por um atalho, uma estrada de terra que liga Barra do Turvo à esta região. É a vantagem de se viajar num carro grande: a gente não tem medo de buraco! Uma economia de 50 km faz esse paraíso chamado Petar ficar mais perto ainda de Curitiba. O parque vem sendo reestruturado há mais de dois anos e quando o plano de manejo de toda a região ficar pronto, nos próximos 12 meses, serão dezenas de cavernas abertas ao público. Mas a grande maioria permanecerá fechada, exceto aos felizardos pesquisadores que as exploram. Hoje, enquanto o plano não é terminado, há apenas um punhado delas abertas. Mas é o bastante para que o visitante passe dias e dias se maravilhando com essas verdadeiras obras de arte da natureza.

Nós estivemos no local por três dias. Foram intensos! No primeiro, visitamos três cavernas na área dos Núcleos Santana e Ouro Grosso. O parque é dividido em quatro núcleos e o Santana é mais conhecido e visitado e é o que oferece mais infraestrutura. A região tem várias pousadas, bem próximas a entrada do parque. Também o núcleo Ouro Grosso fica bem perto. Estivemos primeiro na caverna Água Suja. O nome não é justo porque o rio que atravessa a caverna tem águas transparentes. A boca, ou entrada da caverna, é muito bonita, mas o mais interessante é seguir caverna adentro, para bem longe da luz, seguindo pelo rio na altura da cintura. A beleza do lugar e a quantidade de espeleotemas nos faz esquecer do frio da água e roupas molhadas. Espeleotemas são as formações de calcário construídas através dos milênios pelo lento gotejamento através das rochas. Estalactites, estalagmites, colunas, acortinados, ninhos de pérola, terraços, são todas formas que hipnotizam nossos olhos. São a prova de que, de certa forma, as cavernas também são organismos vivos. Só que numa escala temporal bem diferente da nossa!

O ponto alto dessa caverna está a 800 metros da entrada. O rio forma ali uma cachoeira com mais de quatro metros de altura. O barulho, naquela câmara quase fechada, é ensurdecedor. E o banho que tomamos lá tem algo de mágico, rejuvenescedor. Passado o encanto, lembramos do frio e de que está na hora de voltar. Com certeza, saímos mais ricos de espírito do que entramos. É uma experiência única! Outro ponto alto da visita a qualquer caverna é se aproximar da saída dela. Nunca a claridade do dia ou o verde das plantas parecem tão acolhedores como nesse momento. Entrar numa caverna é mágico. Sair dela, também!

De lá, seguimos para a Santana, a caverna que dá nome a este núcleo. É a de mais fácil acesso e a mais visitada. Por isso mesmo, fomos logo na sexta, para fugir dos grupos grandes de turistas. Congestionamentos em cavernas, ninguém merece! Os espeleotemas dessa caverna são ainda mais bonitos. E nela, apesar do rio estar próximo, não precisamos nos molhar. Há pequenas pontes e escadas em locais estratégicos. Apesar do senso de aventura ser bem menor, a beleza continua impressionante. Dando asas à imaginação é possível ver vários tipos de formas nas formações de calcário. De bolo de noiva à pata de elefante, de cara de índio à Nossa Senhora, de colunas gregas à porta-retratos. O mais incrível é pensar que menos de 10% dessa caverna está liberada para a visitação. Vários dos salões mais bonitos, pela fragilidade de suas formações, ficam longe dos nossos olhos. Mesmo assim, tendo chance, vá conhecer. Melhor ainda se for num dia de semana!

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Nesse mesmo dia, ainda estivemos na caverna Lambari, no núcleo Ouro Grosso. Outra caverna alagada, com água até o pescoço. Atravessamos uma montanha junto com o rio, de um lado ao outro. E, no caminho de volta ao carro, um encontro fortuito com uma Jararaca. Nessa hora, é sempre bom estar atento. E lembrar também que somos nós os invasores e não ela.

O dia seguinte foi melhor ainda. A caverna Temimina, no distante núcleo Caboclos, em Apiaí, é a mais bonita das cavernas abertas à visitação. Mas a trilha de acesso não é das mais fáceis. São três quilômetros através da mata e do mato. É possível encontrar rastros frescos de vários animais, incluindo os de onça. Onça com filhote! Tudo isso contribui para tornar o caminho ainda mais interessante, nos cinco sentidos, literalmente. A visão da mata e dos vales, o som dos pássaros, o cheiro fresco da urina da onça, o gosto açucarado das frutas silvestres e o tato da vegetação molhada nas nossas roupas e pele.

A caverna tem uma entrada magnífica, quase suntuosa. Por dentro, uma enorme galeria em forma de túnel, mais de 30 metros de altura e 50 de largura. O rio que cortou tudo isso forma verdadeiras praias lá dentro. Praias sem sol. Mas também sem chuva ou nuvens! Chuva, talvez não tenha, mas há uma formação conhecida como “chuveirão”. Perfeita! Tem até uma banheira embaixo. A tentação do banho é enorme, mas isso não é recomendado pois pode danificar a formação.

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De volta ao início da trilha, a descoberta que nem tudo são flores. A Fiona tem um pneu furado. Ótimo aprendizado prático sobre como usar o compressor, o kit de conserto de pneus e sobre como trocar um pneu neste carro enorme. Agora estamos muito mais preparados para este tipo de situação que, esperamos, não vai ser tão frequente.

Por fim, nem só de cavernas vive o Petar. Também há muitas cachoeiras e em algumas se pode fazer o rapel. Foi o que fizemos na cachoeira dos Arapongas, no último domingo. Apesar do dia chuvoso, quem está numa cachoeira é para se molhar mesmo! A experiência de estar pendurado num abismo de 60 metros com aquela visão da cachoeira caindo sobre nós e o lindo vale verde lá abaixo vale qualquer sacrifício.
De almas lavadas, terminamos mais uma semana, a primeira nessa nova fase da viagem. Semana que vem, voltamos à praia e chegamos à segunda maior cidade das Américas: São Paulo.

Acompanhe a viagem de Ana Biselli e Rodrigo Junqueira todas as quintas-feiras em nosso blog. Também acesse o site dos aventureiros: http://www.mildias.com.

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