Você já assistiu a alguma peça de teatro com legendas? Se assistiu, deve ter percebido como é difícil seguir a cena e as palavras ao mesmo tempo, num contexto que difere muito daquele do cinema, ao qual estamos habituados.
Mas esse é um mal necessário para se ter acesso a produções internacionais, como as que o Festival Internacional de Teatro Palco & Rua de Belo Horizonte traz ao Brasil. São 19 espetáculos de fora do país dentro do evento que começou no sábado e vai até dia 24 de junho.
A Gazeta do Povo acompanhou dois deles neste fim de semana. E é possível dizer que, dependendo do estilo da peça, fica mais fácil acompanhar o texto.
Diga-se de passagem que é impossível abandonar as legendas e entregar-se à audição do espanhol, por melhor que se fale o idioma. O uso da língua no contexto artístico e os termos regionalizados atrapalham a compreensão.
A apresentação de “Los Autores Materiales”, do coletivo colombiano La Maldita Vanidad, permitiu um acompanhamento mediano das legendas. A começar pelo farto uso de silêncios, que contribuem em muito para a tensão proporcionada pelo tema: em um apartamento-república, três estudantes acabam de assassinar o locatário, Don Joaquín, e tentam esconder o corpo da empregada que logo chega com um filho a tiracolo.
A trama é inspirada no filme “Festim Diabólico”, de Alfred Hitchcock. Instalado numa casa antiga reformada com elementos de arte contemporânea (Casa MAC), o público se segura nos bancos de madeira de tanta ansiedade. Na montagem, as legendas foram previstas para passar em uma televisão, que bem ou mal acaba se integrando ao cenário. E o texto é menos importante que a cena desenrolada diante dos olhos, interpretada por excelentes atores.
Foi diferente em “Los Hijos Han Dormido”, do aclamado argentino Daniel Veronese. Aqui, a montagem de “A Gaivota”, de Anton Chékhov, coloca dez atores em cena, muitas vezes falando ao mesmo tempo.
Há que se entrar no clima do autor russo, que estreou, justamente com esta “A Gaivota”, no fim do século 19, uma série de textos em que o que conta não é tanto o desenrolar de ações, mas principalmente um olhar revisionista da vida.
Mesmo sintonizando o clima certo, a peça tem diálogos constantes, e o espectador se vê entre a cruz e a espada, obrigado a optar entre ler as legendas e olhar de relance para o palco, ou tentar acompanhar auditivamente e também perder muito do significado.
Por fim, é uma pena que as legendas não entreguem todo o texto, e sim um resumo dele. E é preciso dizer também que, muitas vezes, espetáculos brasileiros tornam algumas falas incompreensíveis por problemas técnicos.
Feita esta consideração, resta mergulhar em tudo de novo que o FIT-BH proporciona. A cobertura da Gazeta do Povo continua amanhã e a meta é acompanhar mais de dez espetáculos.