Uma das marcas do Atlético sob o comando de Mário Celso Petraglia é a busca por soluções pouco convencionais para o time e o clube. Lothar Matthäus foi uma que deu muito errado. A pré-temporada XXG do ano passado foi uma que deu muito certo. Miguel Angél Portugal é outra solução pouco convencional, que obviamente precisará de tempo para que seja possível dizer se ele fará companhia a Matthäus, à pré-temporada ou se ficará entre estes dois extremos. Há alguns aspectos, porém, que indicam para onde pode ir o trabalho do treinador.
Desde que parou de jogar, Miguel Ángel Portugal divide sua experiência no futebol entre treinador e dirigente. No seu site, se apresenta como técnico e scouting, função exercida em dois momentos no Real Madrid. É um perfil diferente dos treinadores brasileiros, mas próximo ao que se espera de Dejan Petkovic, técnico do sub-23 e coordenador das categorias de base. Funções para as quais Pet se preparou, em um renomado curso promovido pela Federação Espanhola.
Há uma clara vontade do Atlético de buscar um modelo europeu para o comando do time. Menos técnico, mais manager. Mesmo na Europa essa função passa por transformações. Mesmo na Inglaterra o manager tradicional, com plenos poderes para treinar o time na beira do gramado e coordenar a busca por reforços, está perdendo força. A aposentadoria de Alex Ferguson deixou apenas Arséne Wenger como representante desta escola. A onda do momento é ter um diretor esportivo acima do treinador. Os técnicos de lá continuam tendo mais tinta na caneta que os daqui, mas o poder foi dividido, entre outras coisas, porque não são mais tão estáveis como eram antigamente.
É para este formato mais atual que a contratação de Portugal parece se voltar. Ele terá mais autonomia que Mancini simplesmente porque sua experiência lhe permite dar estes passos a mais. Porém ainda estará subordinado a Antonio Lopes e, como tudo no Atlético, a Petraglia. Com Petkovic a autonomia deve ser um pouco maior, especialmente porque o sub-23 permite ousar um pouco mais na dupla função.
O trabalho de campo, que é o que ficará mais visível ao torcedor, é algo em que Portugal precisa mostrar mais resultado. Sua carreira é pobre. Apenas um título, no Bolívar. Na Espanha, uma semifinal de Copa do Rei com o Racing Santander.
Desde que deixou o Racing, em 2011, Portugal não consegue se encaixar no mercado do seu país. Um mercado dominado por estrangeiros, não na quantidade, mas na qualidade dos cargos: Barcelona, Atlético de Madrid e Valencia têm comandantes argentinos; o Real Madrid, um italiano. Ernesto Valverde (Athletic Bilbao) e Joaquín Caparrós (Levante) são os nomes locais mais importantes. Não chegam aos pés de Vicente Del Bosque (seleção), Pep Guardiola (Bayern), Roberto Martínez (Everton) e Rafa Benítez (Napoli), a real elite dos treinadores espanhóis.
Portugal entrou na diáspora de técnicos espanhóis, detonada pela busca da reprodução do modelo campeão mundial. Foi o impulso que fez a Roma apostar em Luís Enrique — e se arrepender. E que trouxe alguns para a América do Sul. José Mari Bakero, companheiro de Guardiola no Barcelona de Cruyff, treinou o Juan Aurich, do Peru, ano passado. Manuel Alfaro de la Torre acaba de assumir o Jorge Willsterman, da Bolívia, país que tem outro espanhol, Javier Azkargota, como ídolo: foi ele quem levou a seleção à sua única Copa, em 1994.
Exceto as experiências no Real Madrid B, dirigir o Atlético será o grande trabalho de Miguel Ángel Portugal. Por ora, é um negócio melhor para ele do que para o clube. Será igualmente bom para o Furacão se os resultados vierem (óbvio) e se derem uma forma mais clara ao novo modelo de treinador que o Rubro-Negro claramente busca com as apostas para seus times principal e sub-23.
