O último texto de Adolfo Sachsida interessa ao cidadão preocupado com os rumos da pós-modernidade em que estamos imersos, bem como com a tecnocracia liberal que a dirige. Ele crê que a Revolução da Inteligência Artificial será tão boa (no longo prazo), mas talvez tão catastrófica (no curto e médio prazo) quanto a Revolução Industrial. Ao fim do processo, a expectativa de vida dos países industrializados havia dado um salto; no período de transição, porém, uma atroz exploração do homem pelo homem teve lugar, lançando mulheres e crianças pequenas aos trabalhos mais insalubres, com uma jornada de trabalho tão longa que comprometia as horas de sono.
Os liberais vulgares agora se ufanam da Revolução Industrial. Se seguirmos por esse caminho, teremos igual direito de celebrar a escravidão no Brasil, já que entre 1500 e 1888 a expectativa de vida certamente subiu. Sachsida, no entanto, é prudente demais para aderir a esse ufanismo, e seu texto alerta para a necessidade de minorar ou evitar o estrago pela Revolução da Inteligência Artificial. Ainda assim, fico com uma série de pulgas atrás da orelha.
A primeira delas é que eu li primeiro essa previsão em A Quarta Revolução Industrial, de Klaus Schwab. Ele tem certeza de que praticamente todas as profissões de classe média serão substituídas por inteligência artificial - até em coisas que demandam tanta experiência e humanidade como a medicina. Ora, uma coisa que Klaus Schwab e Adolfo Sachsida têm em comum é não serem da área de TI. Valendo-me da experiência alheia, repito o seguinte parecer: só acredita nas profecias de Harari quem nunca escreveu um código na vida. Harari é o filósofo oficial do WEF de Klaus Schwab, que fica prometendo maravilhas distópicas com base numa fé materialista na tecnologia. A crermos nele, o homem em breve inventará Deus por meio da tecnologia, e nós, humanos, somos seres sem livre arbítrio porque a tecnologia poderá prever todas as nossas decisões.
Francamente, meu charlatômetro apita no volume mais alto toda vez que vejo Harari falar. O leitor pode se perguntar quem é Bruna para se achar mais esperta que a tecnocracia globalista. É muito justo, e eu respondo com tranquilidade que já é óbvio que essa gente joga o cérebro fora ao tratar de inovação tecnológica. Quem tem dúvidas, assista ao documentário The Inventor: Out for Blood in Silicon Valley, sobre Elizabeth Holmes. A mulher se vestia igual a Steve Jobs e ficava fazendo umas palestras de autoajuda à Greta Thumberg e arrecadou bilhões de dólares para a sua startup só no gogó. A mulher que parecia ter "CHARLATÃ" tatuado na testa enganou até Henry Kissinger! O recente caso do submersível foi outro exemplo de como a elite global é crédula quando se trata de inovação tecnológica.
A crermos nele, o homem em breve inventará Deus por meio da tecnologia, e nós, humanos, somos seres sem livre arbítrio porque a tecnologia poderá prever todas as nossas decisões
Pois bem. Se a inteligência artificial não avançar a ponto de suplantar os médicos, é possível emburrecer os médicos para colocá-los abaixo da inteligência artificial. A Gazeta do Povo já traduziu artigos sobre a queda da qualidade dos cursos de medicina nas universidades de elite dos EUA, que agora tratam a "inclusão" e o conforto emocional de militantes como prioridade, em detrimento dos futuros pacientes. Se os alunos das faculdades de medicina forem todos lacradores burros, não é implausível que um robô os supere. Como o WEF banca a lacração, nós teríamos sido coagidos a trocar médico por robô.
E isso me leva à questão que me parece ignorada por Sachsida: até que ponto a Revolução Industrial (tragédia inclusa) foi uma consequência inexorável do avanço técnico, em vez de uma imposição da elite? Até onde eu sei (e eu quero estudar esse assunto), a Revolução Industrial se beneficiou não só do avanço técnico, mas também de uma mudança fundiária da Coroa, que expulsou os camponeses das terras comunais e lançou-os na cidade com a roupa do corpo. A Coroa agradou os capitalistas ao lançar no mercado de trabalho urbano um monte de camponeses mortos de fome que aceitavam trabalhar por qualquer salário. Assim, podemos dizer que a Revolução Industrial resulta, em parte, de coação estatal. Na prática, a Coroa vendeu o povo como escravo.
Ao contrário dos liberais vulgares, Sachsida não dissimula a importância do Estado para a manutenção da ordem. Assim, propõe "que a sociedade se prepare [...] tomando medidas que vão desde o aprimoramento dos métodos educacionais até a melhoria nas regras de assistência social. Quando uma pessoa de 40 anos perde o emprego para uma máquina, o custo social desse efeito é elevado." De fato, o governo Bolsonaro se orientou por aí: agiu muito sobre a alfabetização fônica e ampliou muito o auxílio social quando foi necessário. E agiu também no sentido da digitalização do governo, que é onde reside o meu medo.
Vejamos: não é que a Coroa inglesa tenha pecado por não ter criado um imposto negativo e dado bolsas por aí. Não é que ela tenha pecado por falta de políticas públicas, pois ela fez políticas públicas moralmente ruins que coagiram o povo a aderir à Revolução. Então o que eu temo no caso brasileiro, seja sob Bolsonaro ou Lula, é a coação estatal para aderirmos à brincadeira de Klaus Schwab. Com a diferença de que a ciência da Sociedade Lunar dá de 10 a 0 na dos golpistas do Vale do Silício. A Royal Society tinha Newton; o WEF tem Harari.
Seja como for, a crença na inexorabilidade da Quarta Revolução Industrial, pela inteligência artificial, levou o governo Bolsonaro a investir na digitalização. O pix não é coação e deve ser saudado como um aumento da liberdade, que inclusive fez o pobre usar menos o cartão de crédito e tomar pé do seu saldo. Já o portal gov.br só falta coletar informações sobre as calçolas da gente. Um amigo quis fazer uma queixa na ANAC e o site exigia leitura facial. Ora, isso é coação.
Ao contrário dos liberais vulgares, Sachsida não dissimula a importância do Estado para a manutenção da ordem
É verdade que as empresas de e-commerce já pedem leitura facial dos clientes, mas eu penso que o papel do Estado é impedir a coleta abusiva de dados, em vez de aderir ao oba-oba. Quando os liberais querem vender estatais, dizem que é um perigo deixar a Petrobrás na mão do PT. Mas os nossos dados podem ficar? A minha primeira experiência com identificação facial foi sob o governo Rui Costa, que pôs torres chinesas no carnaval de Salvador e pegou uma muquirana foragida por homicídio. Foi usada para o bem, mas pode vir a ser usada para o mal à medida que a dissidência seja criminalizada
Por fim, ainda há o Real Digital, que, como esta Gazeta mostrou, pode ser usado para punir os correntistas. Haja concentração de poder! Deixar a Petrobrás com o PT é um perigo, mas isto não?
Temo que o governo passado tenha ajudado a pôr os brasileiros à venda, crendo na falsa profecia de Klaus Schwab.
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