Ouça este conteúdo
No dia 25 de janeiro, o Projeto Veritas, um site norte-americano de jornalismo independente, publicou um furo: a Pfizer viria explorando mutações do vírus da covid a fim de desenvolver novas vacinas. Jordon Trishton Walker, apresentado como um diretor de pesquisa e desenvolvimento da Pfizer, não sabe que está sendo filmado enquanto se gaba um bocado da argúcia de sua empresa. A Pfizer estaria fazendo experimentos com o vírus em macacos a fim de se antecipar e fazer vacinas de mRNA eficazes – basicamente, pesquisa de ganho de função, coisa que foi proibida no território dos EUA, mas financiada pelos EUA em Wuhan. Se a vacina atual não funciona direito, a próxima funcionaria melhor. E, mesmo que não funcionasse, as agências reguladoras declarariam que são seguras e eficazes, porque seus membros, que não são vitalícios, trabalharam ou trabalharão para a Pfizer.
O furo foi recebido com frisson, ceticismo e silêncio. O frisson é natural, dado o conteúdo das revelações. O ceticismo é salutar, dada a gravidade do assunto. O silêncio é que absolutamente anormal.
Vamos ao ceticismo. Agências de checagem de fato à parte, vale destacar as ponderações de Maajid Nawaz, um jornalista inglês e ex-terrorista islâmico que é crítico do autoritarismo sanitário desde o começo. (A propósito, enquanto escrevo isto, vejo que ele se orgulha de suas denúncias de espionagem do exército britânico sobre os cidadãos críticos da política de confinamento terem sido confirmadas.) Basicamente, ele dizia no dia 26 de janeiro que aquilo parecia bom demais para ser verdade, e que é preciso desconfiar do próprio viés de confirmação. A principal objeção era que Walker, graduado por Yale em 2013, era jovem demais e tosco demais para ser chefe de uma importante diretoria da Pfizer. Seu histórico de publicações era pífio.
O day after
Os céticos foram céticos, portanto. No dia seguinte, o Twitter do Projeto Veritas publicou mais uma filmagem de Jordon Walker. Peter O’Kiefe, o dono do site, abordou-o num restaurante querendo que ele falasse sobre o que tinha dito. Exaltado, Walker diz que estava mentindo para impressionar um date, roda a baiana, dá um chilique homérico e fica no celular dizendo que está se sentindo "unsafe".
Creio que o episódio, somado ao fato de ele ser de Yale, sirva para explicar como alguém tão pouco qualificado chegaria a um posto importante. Walker é uma “pessoa de cor” e gay (o repórter do furo era um homem). Colocá-lo num posto de liderança aumenta a pontuação ESG da Pfizer. Mas como eles não iriam pegar um moreno gay aleatório no meio da rua, contratariam um egresso da Ivy League. Esta, a seu turno, está numa espiral decadente, justo por ter acabado com a meritocracia na seleção. Agora — como vemos nesta entrevista de Victor Davis Hanson a Jordan Peterson — está em vigência uma mistura de pagou-passou (só que pagou muito, claro) com discriminação por cor, sexo, orientação sexual e identidade de gênero. Elas recebem uma grana alta e formam egressos “diversos” para serem contratados por essas empresas ESG. A demografia que mais sofre nem é o dos homens brancos, mas a dos orientais, que, como os judeus na Alemanha, costumavam ser mais frequentes nas universidades do que na população geral.
No dia 27, o Veritas ainda colocou uma foto do perfil de Walker no Teams corporativo a Pfizer, mostrando que ele ainda trabalhava lá.
A Pfizer responde
O vídeo do Projeto Veritas foi visto por milhões. Ainda assim, nada de a imprensa convencional falar nada.
Será que tudo não passava de um funcionário mentindo num encontro romântico, ou havia alguma verdade naquilo? A promiscuidade entre as agências regulatórias e a Big Pharma não são novidade para os norte-americanos; só para nós, que nos achamos os maiores corruptos do mundo e romanceamos os EUA. O que importa é saber se a Pfizer está fazendo experimentos com o vírus nos macacos.
Eis que no próprio dia 27, mas já à noite, ela lança um comunicado para responder ao Veritas, ainda que sem citá-lo nominalmente. Em primeiro lugar, vale notar que ela não negou que Walker fosse diretor lá. E em segundo, como notaram muitos usuários do Twitter e o próprio Veritas, ela admitiu que faz, sim, experimentos com o vírus: “No desenvolvimento da vacina Pfizer-BioNTech contra a COVID-19, ainda em andamento, a Pfizer não conduziu pesquisa de ganho de função, nem de evolução dirigida. Trabalhando com colaboradores conduzimos pesquisa na qual o vírus original SARS-CoV-2 foi usado para sintetizar a proteína de espícula de novas variantes de interesse. Esse trabalho é empreendido uma vez que uma nova variante de interesse foi identificada pelas autoridades públicas. Essa pesquisa nos permite avaliar rápido a capacidade de uma vacina existente para induzir anticorpos que neutralizam uma variante de interesse recém-identificada.”
Será que isso é perigoso? Será que a parte dos experimentos em macacos é invenção de Walker? Se não for, quem vai lá conferir?
O silêncio da imprensa
Se uma árvore cai numa floresta sem que ninguém a ouça, ela faz barulho? Essa é uma questão filosófica meio pop dos Estados Unidos, surgida naquele país no século XIX. Com tamanho subjetivismo, não é de admirar que a coisa escalou de tal modo que agora se perguntar: se um fato ocorreu e nenhum jornal deu, ele ocorreu mesmo? Ao que parece, a resposta dos poderosos tende a ser que não. Assim, basta orquestrar a grande imprensa e cooptar algumas das Big Techs para impedir que fatos desagradáveis tenham acontecido.
O Google, dono do Youtube, tirou do ar o vídeo do Veritas. Desta vez Zuckerberg, dono do Facebook e do Instagram, não foi proativo na censura — mas sabemos que ele costuma aderir às diretrizes relativas à pandemia e ao “discurso de ódio”. Quanto ao Twitter, hoje sabemos que aderia a tudo isso, e que o fazia graças a pedidos diretos do FBI.
Se o Twitter não tivesse sido comprado por Elon Musk, é certo que o furo do Veritas não teria vindo à tona, porque o perfil do site tinha sido derrubado pelo Twitter no tempo do FBI. O Veritas bem poderia ter publicado no seu próprio site, claro, mas os milhões de visualizações vieram do Twitter. Agora estamos assim: a internet permitiu que jornalistas independentes não mais precisassem das bênçãos da grande imprensa, mas a difusão da internet tornou muito difícil, para o usuário, peneirar conteúdo de qualidade. Antes sentávamos e ligávamos a TV, passivos. Hoje temos que navegar e buscar ativamente num milhão de fontes.
Sem dúvida, as plataformas de redes sociais ajudaram muito nisso. Nós pegamos dicas com nossos amigos e não precisamos criar um blogue para veicular notícias; somos nós mesmos um pouco jornalistas e articulistas. Assim, o jeito eficaz de controlar a internet é colocar as plataformas nas mãos de uns poucos (Bill Gates, Larry Page, Mark Zuckerberg e Jack Dorsey) e manter uma relação de parceria com eles. Se nós temos agora um pouco de liberdade, é porque esse cartel ideológico do bem se rompeu e temos Elon Musk no lugar de Dorsey.
Até ontem, pauta da esquerda americana
Como eu venho tentando entender o que aconteceu com os EUA na Era Progressista, zanzei pelas referências da Wikipédia anglófona até escolher um livro que remontasse a George Creel, o Goebbels dos EUA que é anterior ao próprio Goebbels.
Caí em The Death of the Liberal Class (2010), de Chris Hedges. É um jornalista premiado que tece longas páginas com um elogio de Chomsky e parece crer sinceramente que Jesus Cristo era um hippie. É interessante como a descrição que ele dá dos EUA em 2010 seria, hoje, tida por uma descrição de direita. Ao que parece, há não muito tempo atrás era consenso na esquerda americana que as megacorporações compraram o Estado (segundo ele, o problema começa com W. Wilson) e que os dois partidos vivem um simulacro de democracia, sendo na verdade lobistas de uma estratégia das tesouras. Vale citar um trechos do começo que ele fala da imprensa: “A mídia, a igreja, a universidade, o Partido Democrata, as artes, os sindicatos – os pilares da classe liberal – foram comprados por dinheiro corporativo e por promessas de migalhas lançadas pelos círculos estreitos de poder. Os jornalistas, que valorizam mais o acesso aos poderosos do que a verdade, reportam mentiras e propagandas e nos lançam numa guerra no Iraque. Muitos desses mesmos jornalistas nos asseguraram que era prudente confiar as nossas economias a um sistema financeiro tocado por especuladores e ladrões. Essas economias de vidas inteiras foram engolidas. A imprensa, servindo aos patrocinadores corporativos, ao mesmo tempo torna invisíveis setores inteiros da população cuja miséria, pobreza e ressentimento deveriam ser o principal foco do jornalismo.” Trata-se aqui dos desempregados do cinturão da ferrugem, que foram reduzidos pelo Partido Democrata a “homens brancos”, portanto indignos.
O que a esquerda dizia da indústria bélica é o que a direita diz da Big Pharma: cria problemas para meter a mão no cofre da viuvinha. O diabo é que a viuvinha em tela tem a impressora do dinheiro mundial. Resta ver onde isso vai dar.
Mas fiquemos tranquilos, pois se ninguém noticiar nada, é porque não aconteceu nada.