Você sabia que o Brasil é o país que mais espanca e barbariza mãezonas e avozinhas no mundo inteiro? Pesquisadores da conceituada Small Pumpkin University entrevistaram dez mil voluntários em quinhentos municípios de todas as regiões do país e descobriram que aproximadamente nove em cada dez brasileiros já atentaram contra a vida da própria genitora. Afinal, 87,36% dos entrevistados admitiram ter deixado, alguma vez, o chinelo com a sola voltada para cima. Trata-se de um índice alarmante, um sinal inequívoco de que vivemos numa sociedade estruturalmente matricida.
O Brasil é o pior país do mundo. Aqui, os homens têm mitocôndrias negras com cromossomos Y europeus, prova inequívoca de que somos todos fruto do estupro de nossas mamães.
Tendo isso em vista, eu, euzinha, do alto de minha superioridade moral, venho convidar gentilmente você, leitor, a parar de bater na mãe e de tentar matar a mãe. Vou oferecer cursos com especialistas antimatricídio que vão ensinar você a não bater na mãe. Mas se você quiser continuar sendo matricida, minhas colunas não são para você.
Quem não tem brio nenhum?
O leitor desta Gazeta com certeza sacou que o início deste texto é uma brincadeira. E isso por uma série de razões, que vão desde o perfil do jornal até aquela que considero a mais importante de todas: é maluquice sair acusando de crimes graves gente que você sequer conhece. Bater na mãe é feio e é crime; não é acusação que se faça com leviandade, inclusive porque dá rolo na justiça.
Mas e se você não fosse leitor desta Gazeta, e sim de uma publicação progressista? E se eu não fosse eu, e sim uma feminista famosa em panelinha intelectualóide? Aposto que aconteceria o seguinte: você ficaria incomodado, mas sem ter coragem de abrir a boca contra mim. E então teria a ideia de pesquisar se a Small Pumpkin University é real e descobriria que não existe.
Aí, pelas minhas costas, começaria a fazer um tititi pelo WhatsApp, comentando que a Small Pumpkin não existe, enquanto que eu (digamos que você seja um leitor branco do sexo masculino) começaria um contratititi, e diria nas redes sociais que estou sofrendo ameaças de homens brancos negacionistas do matricídio estrutural. Aí eu pediria a sua cabeça e, a depender da sua profissão, você poderia acabar desempregado. No caso de alguma leitora mulher tomar partido seu, eu usaria os meus contatos para ferrá-la.
No frigir dos ovos, a maioria do leitorado progressista entende que compensa ficar de bico fechado e que é não só aceitável, como necessário, ficar recebendo dedadas na cara com ofensas aviltantes. O resultado disso é gente sem brio nenhum, que só não leva cusparada de cabeça baixa porque a Internet ainda não transmite saliva. Gente de espinha quebrada, pronta para dizer “Sim, senhor”.
Sob as botas de uma grande corporação
No meio desta terça-feira, algum desocupado da Uber achou que era uma boa ideia a empresa enfiar o dedo na cara dos clientes e mandar uma cartinha mandando não serem racistas. Assim, sem cerimônia, chamando o cliente pelo nome de batismo, sem um senhor ou senhora, nem sobrenome. Com nojinho, a Uber alerta logo em negrito que, se você for racista, a Uber não é para você. (Resta saber se, fazendo uma autodeclaração de racista, a Uber vai devolver o dinheiro infecto do cliente racista, para se livrar de quaisquer contaminações).
Campeã da luta antirracismo, a empresa diz que vai “remover ofensores da plataforma”. Em princípio, eu poderia ser favorável a essa política. O que é um ofensor? Alguém que ofendeu outrem pela sua cor, foi acusado do crime de injúria racial, julgado e condenado? Muito bem, que a Uber adote mais uma política em harmonia com as leis vigentes no Brasil, assim como já usa o nosso sistema para impedir criminosos de trabalharem como motoristas. Mas ofensor pode ser uma tradução furreca de offender, que é “infrator” em inglês. Nesse caso, existem regras não escritas que definem o que é racismo, e a plataforma julga e executa os motoristas e clientes.
O comunicado continua assim: “Mais do que remover ofensores da plataforma, queremos ajudar a prevenir que esses comportamentos aconteçam.” Notaram o mau uso do verbo prevenir? Em português, prevenimo-nos contra coisas (ex: prevenção contra a AIDS), prevenimos pessoas (ex: deixou fulano prevenido). Mas não prevenimos que tal e tal coisa aconteçam. Nosso verbo para isso é impedir. E impedir em inglês é prevent. Tradução furreca, português quebrado.
Como a Uber vai impedir o comportamento racista? Arranjando “um time de especialistas para desenvolver conteúdos com informações importantes que ajudarão nossos parceiros [i.e., empregados] e usuários a entender mais sobre o assunto, refletir mais sobre suas atitudes e fazer parte da mudança com a gente. Em breve, eles [i.e., os “conteúdos”] serão disponibilizados no aplicativo da Uber”.
O resto a gente já sabe. Vêm aí aquelas lumenas e djamilas que, se procurarem direito, encontram racismo antinegro dentro de um tubo de pasta de dente, enquanto xingam brancos e pardos por causa da cor de sua pele. Coisa, aliás, proibida pela legislação brasileira.
No Brasil, racismo é crime e é feio. Nos EUA, não é crime. Como é possível a corporação sair acusando todo mundo de racista no Brasil? A Uber pretende levar os brasileiros à justiça? Vai nada. Vai é pegar as teorias progressistas mais tresloucadas, apresentar como verdade inquestionável e julgar sumariamente os brasileiros segundo ela – do mesmo jeito que o Facebook tem lá os seus juízes pagos para analisar postagens e deletar.
Quem votou na Uber?
Que eu saiba, a Uber não tem nenhum assento no Congresso. A empresa tem feito com o transporte urbano o mesmo que as Big Techs, de um modo geral, se esforçam para fazer: quebrar o sistema econômico descentralizado e virar monopolista. A Amazon já censura livros. O que vai acontecer com escritores e leitores se só a Amazon puder vender livros? O Google e a Apple detêm o oligopólio de sistemas operacionais de celulares. Quando eles resolveram tirar a rede social Parler da loja de aplicativos, ela ficou fora dos celulares.
O que vai acontecer com a locomoção urbana se a Uber acabar com os ônibus e os táxis? Cada brasileiro sem carro próprio vai ter que ter o seu direito de ir e vir condicionado à censura arbitrária e aos julgamentos sumários da empresa?
Quem tiver a espinha inteira, que largue essa empresa e vá para a concorrência. Ninguém deve receber dedo na cara, ser acusado de crime e deixar por isso mesmo.
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