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Bruna Frascolla

Bruna Frascolla

"Justiça social"

Maior ameaça às liberdades não vem do Estado, vem do mercado global

Bolsa de Valores de São Paulo
Bolsa de Valores de São Paulo (Foto: EFE/ Sebastiao Moreira)

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Se o Brasil fosse progressista, o PSOL ganharia eleições majoritárias. E o presidente não seria Boulos, não. Se o próprio PSOL levasse a sério os princípios do PSOL, Sônia Guajajara seria presidente do Brasil, pois a mulher-índia seria cabeça de chapa em vez de vice do homem-branco-cis-hétero.

Nesse hipotético Brasil progressista, uma candidata poderia se declarar lésbica e não-binária a fim de angariar votos. Faria campanha eleitoral fumando crack e ostentando conservas com fetos abortados ou pênis cortados, se o Brasil gostasse tanto de progressismo quanto os progressistas presumem.

Mas ninguém gosta de progressismo além de duas categorias: banqueiro e vagabundo. Empregar vagabundo dá prejuízo. Arcar com prejuízo é coisa que poucos conseguem. Só negócio grande. Assim, basta financiar o serviço de vagabundos organizados para colocar barreiras às empresas que não possam ou não queiram aderir ao cartel e controlar o sistema financeiro. Não é à toa, portanto, que uma montanha de banqueiro e megaempresário se interessa tanto por “justiça social”: pegam um pedacinho da montanha de dinheiro que têm e despejam em ONGs. Estas têm acesso a uma infinita mão de obra barata e qualificada – ou pseudoqualificada, graças à inflação de diplomas.

Vejam a situação de um doutor em biologia ou ciências humanas no Brasil pós-Haddad: após passar quatro anos ganhando 2.200 reais por mês, defronta-se com o desemprego. O PT interferiu em todo o sistema de pós-graduação brasileiro, aproximando-o da realidade dos EUA, onde há pesquisador demais para emprego de menos. Antes da passagem de Haddad pelo Ministério da Educação, uma meia dúzia de acadêmicos fazia pós-graduação e tinha em vista a possibilidade de passar num concurso para uma universidade. Desde Haddad, os programas de pós têm que colocar para dentro o máximo de estudantes possível, e os graduandos sem vocação acadêmica vão fazendo cursos mais avançados como um meio de postergar o desemprego. Depois do curso, sabem que uma seleção de professor substituto numa cidade de interior que paga mal terá no mínimo uma centena de candidatos.

Milícia ongueiro-judicial

Diante desse cenário, se uma ONG pagar um salário de 5.000 reais para um doutor, estará de ótimo tamanho; será um verdadeiro felizardo em comparação aos seus ex-colegas que tiveram de virar motorista de aplicativo ou fazer bolo de pote. E dado o rebaixamento da qualidade da pós, o que não falta é doutor picareta disposto a chancelar qualquer tipo de bobagem que sirva aos interesses de quem pague bem: poderá dizer que há índio onde não há, ou inventar dano ambiental inexistente. Cinco mil reais por mês dá 60.000 reais por ano – o que é nada para o pessoal do Vale do Silício que banca a Fundação Ford. Assim fica fácil ter a Ciência ao seu lado: quando os cientistas são semianalfabetos que rodam bolsinha na esquina.

Agora somem isso à facilidade em adular as vaidades. Usando-se a imprensa para incensar o guerreiro da justiça social que salva o planeta, ou os negros, ou as mulheres, compra-se ainda o concursado bem pago.

Em seguida, juntem esses vagabundos qualificados ao ativismo judicial. Um procurador do ministério público amiúde é indiscernível de um ongueiro genérico. As próprias ONGs têm condições de bancar advogados – outra classe cheia de profissionais excedentes que não têm onde cair mortos. Aí pronto: tem-se uma milícia ongueiro-judicial para assediar qualquer instituição, sob as bênçãos da mídia.

Liberais que não se mancam

A despeito de toda a movimentação ESG, os liberais não se mancam. Continua sendo bonito falar mal do Estado, reclamar de opressão do Estado, celebrar o mercado. Como se o mercado global não fosse, hoje, com suas múltiplas regulações, o maior veículo de tirania no Ocidente. O mais recente assalto do ESG à autodeterminação dos brasileiros foi a imposição de quotas identitárias para a listagem na bolsa de valores. A B3 (ex-Bovespa) apenas imita Nasdaq.

Como vimos nesta Gazeta, a XP foi assediada pela Educafro – que aliás é uma das ONGs mais sequiosas por reparações coletivas em atividade no Brasil. Nossa lei trabalhista e nossa Constituição proíbem a discriminação racial na contratação de funcionários; no entanto, a ONG se sentiu ofendida por a XP ter tirado uma foto de seus trabalhadores na qual supostamente só havia brancos, e essa percepção subjetiva de ofensa serve como pretexto para assédio judicial.

Na mesma matéria vimos que um membro da XP está dizendo que é muito bonito esse negócio de obrigar as empresas a contratarem pela raça, pelo sexo ou pela orientação sexual. Não bastam os tribunais raciais na esfera estatal; agora há de haver tribunais raciais na esfera privada também. E do jeito que a ideologia de gênero avança, daqui a pouco vai ter tribunal de gênero também. Vão decretar que as conservadoras na verdade são homens presos no corpo de mulheres e que os barbudinhos fãs de Los Hermanos são mulheres presas em corpos de homens. Tudo, frise-se, na contramão dos sentimentos dos brasileiros. Tudo isso se faz sem um voto.

É óbvio que a maior ameaça às liberdades no Brasil não vem do Estado. Vem do mercado global, cheio de atores mais ricos do que muitos Estados nacionais.

Sempre haverá quem diga que os monopolistas são problemas criados pelo Estado. Na certa têm razão quanto a alguns casos – pensem na relação da JBS com o BNDES, ou então na relação que os conglomerados educacionais têm com os governos dos EUA e do Brasil. Mas duvido que tenham razão em todos. Vide o caso da Standard Oil, que foi desmembrada porque os EUA de antanho não permitiam a formação de monopólios. No Brasil, quando a Antarctica se fundiu com a Brahma, não faltaram protestos contra a formação de monopólio. A expansão da Kroton não gera protestos públicos, e seu dono -- que também é dono da Antarctica e da Brahma -- é muito bem visto pela imprensa comum por bancar políticos.

Equilíbrio do poder

Quando não gostamos do governo, podemos votar na oposição. O mercado regulatório global, porém, resolveu educar a nós todos e determinar, por conta própria, quais são as metas que você e eu devemos ter em sociedade. Devemos viver almejando quotas porque assim decidiu Larry Fink lá na Califórnia, ou Klaus Schwab lá em Davos. Ninguém nos chamou a votar; só a obedecer – to comply, no jargão corporativo. Temos que ter a liberdade de dizer I do not comply; de mandar a compliance lá para Davos ou para a Califórnia.

Nós somos maioria. O judiciário nos traiu e agora manda em nós, mas nós seguimos sendo maioria. Não é sábio entregar o Estado às ONGs e ao ativismo judicial, pois é sua vocação natural defender os interesses majoritário de um povo; de declarar uma guerra, se preciso for. É preciso ter em mente que Estados bem organizados podem e devem fazer frente a ataques cometidos contra o seu povo.

No passado, fazia sentido pensar no Estado como um perigoso centro de poder, forte demais em comparação aos atores privados. Para descentralizar o poder, de fato era preciso investir no privado. No mundo global, a lógica se inverteu: o esquema ESG é um poder forte demais em comparação à plêiade de Estados nacionais. Para descentralizar o poder, é preciso fortalecer o poder dos Estados que façam frente a ele.

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