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Propaganda quer fazer crer que sucesso na vida é ter um grande número de parceiros sexuais
| Foto: Bigstock

A liberdade para disseminar quaisquer ideologias, nos EUA, só se consolidou na década de 30, quando a comunicação de massa era um fato. Penso que não seja uma coincidência que essa liberação tenha se dado justamente no alvorecer da era da propaganda, e penso que foi uma obra deliberada dos progressistas para enfiar propaganda no lar dos cidadãos sem que eles pudessem tomar medidas legislativas contra ela.

Se a propaganda já tinha poder antes da TV e na época em que as mulheres ficavam em casa cuidando dos filhos, imagine-se depois, quando as crianças inclusive passaram a demandar menos atenção dos adultos por se distraírem com a TV e, agora, com os celulares.

A moral inaugurada pelo progressismo no começo do século XX era a de Margaret Sanger: a mulher deve trocar o trabalho do lar pelo trabalho na rua e deve pagar as próprias contas. Ela não deve apenas ter a liberdade para decidir pagar as próprias contas, como não deve ter um lar; deve se “libertar” dos afazeres domésticos inerentes à constituição de uma família. Além do salário, com essa mudança a mulher ganharia também a liberdade de transar com quem quisesse, quando quisesse. Métodos contraceptivos seriam disponibilizados aos montes. O aborto só muito depois passou a ser propagandeado, e a própria Margaret Sanger não via com bons olhos. De todo modo, a operação consistiu em aumentar o sexo enquanto se diminuíam as suas consequências naturais, a saber, a estabilização da relação da mulher com um homem e a geração de filhos.

Muito se fala que a monogamia é uma construção social e um dado cultural particular, e é verdade. No entanto, é difícil pensar numa sociedade constituída sem que haja algum grau de estabilização das relações sexuais. O sultão não é monogâmico, mas é casado. A poligamia propagandeada pelos progressistas atuais é um surubão estéril; é volátil e pornográfico, não tem nada a ver com a criação de filhos. O precedente mais parecido com o sexo sem compromisso é o bordel, onde as mulheres vendem o sexo a vários homens, sem se estabilizarem. Diz-se que a prostituição é a “profissão mais velha do mundo”, mas não há precedentes de uma civilização-bordel, onde o tempo inteiro ninguém é de ninguém.

Não é de admirar, portanto, que a natalidade caia. O povo é capaz de ter cachorro em vez de filho, e depois ainda passar varíola do macaco pro cachorro.

Mudança na cultura

É claro que nem todo o mundo aderiu à moral progressista, e até mesmo entre os maiores militantes da causa encontramos casais tradicionais, sem sequer filhos fora do casamento. Veja-se o galã predileto das feministas, Rodrigo Hilbert (1980), ou o homem-branco-cis-hétero mais desconstruído do pedaço, Bruno Gagliasso (1982). Até Wagner Moura (1976) é o pai de uma família tradicional.

Será o caso do “diga o que eu digo, mas não faça o que eu faço”? Talvez, mas não basta para explicar. Se olharmos para a geração mais velha da liberação sexual, sobretudo na esquerda, veremos biografias agitadas. Caetano Veloso (1942) tem filhos de casamentos diferentes, compôs músicas de amor para homens com quem se envolveu, e, já quadragenário, seduziu uma adolescente. Zé Celso Martínez (1937), o ícone brasileiro da revolução sexual, não deixa nenhum rastro de família tradicional em sua biografia. A própria Margaret Sanger, que era estritamente progressista e não se misturava com o marxismo, teve uma vida amorosa/familiar mais agitada do que a de Giovanna Ewbank (1986) e Fernanda Lima (1977), que se casaram só com seus atuais maridos e pais de seus filhos (a saber, os já citados Gagliasso e Hilbert). Sanger teve dois casamentos; o primeiro, com o pai dos três filhos, terminou num divórcio. (Antigamente os divórcios costumavam ser longos.) No ano seguinte ao divórcio, casou-se com o segundo marido, que veio a se tornar contrabandista e fabricante de diafragmas. Não teve mais filhos.

A minha explicação para isso é geracional. Antes, para aderir à moral sexual dos progressistas era preciso ser da pá-virada; os certinhos faziam o que é de bom tom. Nos dias de hoje, porém, é de bom tom defender o que os velhos da pá-virada faziam. Daí resulta que os certinhos são muito da pá-virada da boca pra fora. Casam, têm filhos, não separam, trabalham, acumulam propriedade privada – são, em suma, perfeitos burgueses capitalistas –, mas apontam o dedinho pro porteiro que vai votar em Bolsonaro e elogiam a liberdade sexual da funkeira lá longe, na favela. Também dizem achar muito bonita a liberação da consciência proporcionada pelas drogas, mas, se os filhos aparecerem com algo mais pesado que um baseadinho, a casa vai cair. Para os filhos dos outros, crack é libertador.

Mas é assim com os trintões e quarentões, que cresceram com pais que ainda tinham uma moral tradicional. A propaganda progressista não teve curso livre em sua formação.

Aprender com coluna de fofoca

Imagine quem está ainda na casa dos vinte, e que ainda por cima trabalha no meio artístico. Ocidente afora, a propaganda tem deixado claro que a vida serve para transar, e que ter sucesso na vida é ter um grande número de parceiros sexuais. (Dalrymple costuma mencionar o caso de um garotinho que chorava muito por ter sido xingado de virgem. Ele não sabia o que isso significava, mas era péssimo.)

No caso das mulheres, creio não haver precedentes dessa moral em outras culturas. Mulher em idade fértil que transa com muitos homens é malvista em qualquer outra cultura de que eu possa me lembrar. (Até se for prostituta, é sinal de que está muito barata.) E não basta simplesmente fazer sexo com várias “pessoas”, é preciso gostar e ter muitos orgasmos.

Como a nossa cultura fala muito de sexo, é natural que as crianças fiquem curiosas. Na minha época, os avós reclamavam da indecência da TV; hoje, além de verem coisas picantes na TV, as crianças têm uma internet inteira para pesquisar. Assim, a idade do acesso à pornografia vem caindo, e, se antes era coisa de menino, hoje é coisa de menina também. Com as notícias sobre celebridades, aprendemos que a cantora Billie Eilish (2001) começou a ver pornografia aos 11 anos e que isso lhe fez muito mal. “Nas poucas primeiras vezes em que eu fiz sexo, eu não estava dizendo ‘não’ às coisas que não eram boas. É porque eu pensei que era daquilo que eu tinha que gostar”, disse ela. As meninas costumam ter o traço da agradabilidade; costumam se empenhar em ser aceitas. Se a sociedade diz que o bom é transar, resta ver como é que se transa. E o modelo de transa que ela vai encontrar na internet não é o papai-e-mamãe com atores fingindo amor. É tabefe e estrangulamento, no mínimo. Na certa vai aprender que usar vibrador e fazer sexo anal é altamente empoderador. Gays sentem prazer porque têm próstata; mulheres não têm, mas vão fazer de conta que gostam, sim, pois do contrário são reacionárias, puritanas etc.

“Sou assexuada”

Depois de não gostar, a moça vai se deparar com uma porção de propaganda feminista que diz que, se não foi bom, é estupro. Por aí se entende por que tem tanta denúncia de assédio em meios progressistas: o consentimento não é claro nem para a mulher, que de fato faz coisas que não queria fazer.

Outra resposta possível a essa situação é, percebendo que não gosta e se recusando a repetir, a moça concluir que há algo de errado consigo. Foi o que fez provisoriamente Bruna Marquezine (1995). No podcast da supracitada Giovanna Ewbank, ela explicou que não podia estar no “surubão de Noronha” porque estava numa fase em que acreditava ser assexual. Mas depois passou. Explicou-se assim: “Acho que porque eu via minhas amigas falando muito e alguns até me cobrando ‘pelo amor de Deus, se eu tivesse a sua idade e seu corpo, eu ia estar dando para meio Rio de Janeiro’. Eu falava ‘gente, não quero. Não quero mesmo’. Foi um processo de me preencher mesmo, me sentir inteira e me sentir atraente de novo, suficiente de novo e me interessar pelas pessoas. Tem uma coisa de parceiros e estar mais à vontade comigo. Então, tá mais a vontade na cama, para falar o que eu quero, o que eu gosto. Aí, ficou um pouco mais divertido e passou sua fase.” Por aí se vê qual é a concepção de normalidade dela, que até então teve um longo namoro sem que se falasse em casamento.

Com a ideologia de gênero, inventou-se a assexualidade; é a letra A de LGBTQIA. Se uma menina normal vê pornô, acha que sexo é aquilo e, por conseguinte, acha que aquilo não é pra ela, conclui que pertence à comunidade LGBTQIA como assexual. Como tudo nessa ideologia é “espectro”, os ativistas inventaram a demissexualidade (sic), e a associação dos assexuais caracterizou essa peculiar orientação sexual como a necessidade de ter vínculo emocional para ter atração sexual. Ou seja, uma descrição de uma mulher normal é, agora, a descrição de uma LGBTQIA. Poderia ser só uma associação de esquisitões, mas vemos que Bruna Marquezine tem a mesma concepção de mulher normal que eles. E, como mostra a matéria do The Guardian, milhares passaram a se identificar como demissexuais após o termo surgir na internet em 2006.

É possível que por aí se entenda o aumento de relações lésbicas entre meninas que não são lésbicas. Ficar sem fazer sexo é feio, o celibatário (ou incel) é tratado como um terrorista potencial, e, como o pornô homem-mulher é recheado de bizarrices, resta fazer sexo entre meninas (mesmo não gostando), que pelo menos não machuca. O celibato só é possível, no progressismo, se for transformado numa identidade. A identidade “assexual” é só o começo. Com a moda trans, a menina pode rejeitar o próprio corpo e não querer ser mulher, sem sequer querer ser um homem. Escrevi aqui sobre Maia Kobabe, que cresceu lendo pornô gay e se considera uma pessoa assexual não-binária.

Moral da história? Não dê smartphone para criança e preste atenção às identidades reivindicadas pelos coleguinhas.

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