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Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
Marcelo Andrade/Gazeta do Povo| Foto:

O deputado federal e pré-candidato Jair Bolsonaro está cada vez mais perto de se tornar presidente da República, algo (exercer a presidência) que eu não desejaria ao meu pior inimigo. Duas pesquisas recentes de intenção de voto são as evidências empíricas do seu atual momento.

O levantamento realizado pelo DataPoder360 mostrou Bolsonaro como líder em três cenários distintos com variação de 21% a 25%. Também em três cenários, a pesquisa feita pelo Datafolha mostrou o candidato do PSL na liderança com 19% das intenções de voto. E, sim, continua a ser estranho o instituto inserir como candidato um presidiário condenado pela justiça – Luís Inácio Lula da Silva.

O atual e grande problema para Bolsonaro e demais candidatos é o alto índice de rejeição individual somado a uma parcela significativa de eleitores que não decidiu em quem votar ou que está disposta a votar nulo ou em branco. Até a eleição, porém, esses elementos adversos podem ser uma ótima janela de oportunidades para ganhar votos hoje dado como perdidos. Há um espaço para convencimento que nenhum candidato pode menosprezar.

As duas últimas semanas contribuíram para solidificar a percepção de parte da sociedade de que ele é a pessoa mais indicada para ocupar a função a partir de janeiro de 2019. Três fatos foram fundamentais para isso: 1) a paralisação dos caminhoneiro e os seus desdobramentos políticos e econômicos; 2) o agravamento da violência no país, especialmente no Rio de Janeiro e o drama da mãe que faleceu ao saber que seu filho policial militar havia sido assassinado por bandidos; 3) a constrangedora disputa judicial entre Polícia Civil, Polícia Federal e Exército para ver quem poderia ficar com as armas e munições apreendidas com traficantes.

Bolsonaro, que assumiu há anos essa bandeira, nem precisa ter um projeto pronto e acabado de segurança pública. O que mais importa para parte dos eleitores neste momento é ter a percepção de que ele é o único candidato que se preocupa com o assunto e que, portanto, fará o que nenhum outro terá a coragem de fazer.

Coragem é uma palavra-chave para a eleição de 2018. Bolsonaro pode ser acusado de não ter traquejo verbal, de tergiversar quando questionado sobre projetos específicos, de não dominar os assuntos de sua predileção, mas transmite a imagem para uma parcela crescente da sociedade de que, mesmo desconhecendo os detalhes do problema, terá o destemor e a disposição para enfrentá-lo.

Em política, a imagem de confiabilidade e empenho pessoal é fundamental. Um candidato pode morrer na praia mesmo que ofereça soluções detalhadas e plausíveis se não conseguir estabelecer com as pessoas os vínculos primordiais de honestidade e de confiança. Num momento em que a classe política – e não a política per se como se costuma afirmar por aí – tem recebido a moção pública de repúdio que merece, Bolsonaro é visto como um político que jamais se deixou corromper e que tem vontade e energia para enfrentar o sistema degradado.

Nem se trata de fenômeno novo na política brasileira. Em outro momento e em circunstâncias distintas, políticos como Jânio Quadros capitalizaram eleitoralmente em cima da imagem de honestidade. O exemplo de seu fracasso político na curta presidência é, inclusive, pedagógico para qualquer postulante ao cargo. Percepção pública, por isso mesmo, não garante a realização de bom governo, mas pode garantir a eleição. Sem a vitória eleitoral, obviamente, não há governo – nem bom nem ruim.

Outro aspecto importantíssimo que tem sido ignorado é aquilo que eu defini como política com testosterona para falar sobre a política externa do governo de Donald Trump. Bolsonaro é seu representante e somente Ciro Gomes, do lado negro da força, consegue aparentar fazer parte do clube. Muitos estão fartos de políticos frouxos e covardes e, por essa razão, os dois lideram a pesquisa do DataPoder360 e Ciro aparece em terceiro lugar no levantamento Datafolha.

Os demais candidatos, contudo, a despeito de eventuais qualidades, parecem aos olhos do brasileiro médio desprovidos da virilidade necessária para liderar um país repleto de janelas quebradas e com mais de 60 mil homicídios por ano. Marina Silva, por exemplo, que aparece na segunda posição na pesquisa do Datafolha, conseguiu até aqui manter a preferência de parcela do eleitorado que não se vê representada por Bolsonaro ou Ciro, mas, a depender de sua campanha, ela corre o risco de naufragar como na eleição anterior.

Um aspecto que, como estudioso da política brasileira, tem me chamado a atenção é a capacidade do pré-candidato do PSL de aprimorar a sua atitude pública e o seu discurso num espaço de tempo tão curto. O personagem irritadiço e sempre pronto a voar na jugular de quem o provocava tem se mostrado cada vez mais paciente, bem humorado e, vá lá, humilde nas entrevistas e intervenções.

Quando, por exemplo, afirma que não é especialista em economia e, por isso mesmo, se aproximou do economista Paulo Guedes, reforça a imagem de político sincero que não tem medo de confessar suas limitações, mas que, principalmente, sabe escolher o melhor em cada área de governação. Nesse caso, a aparente fragilidade é convertida em demonstração de inteligência.

Desconheço um candidato à presidência que tenha sido tão beneficiado pelas circunstâncias e pelos seus adversários como Bolsonaro neste momento. De agora até o início e desenrolar formal da campanha, quando os partidos acionam suas estruturas locais, muito há de acontecer. Se por um lado os aspectos positivos de Bolsonaro poderão sobressair, seus aspectos negativos serão usados contra ele.

É fato: o fenômeno Jair Bolsonaro se ergue sob os escombros do establishment, que tenta sobreviver. As oligarquias políticas não são invencíveis, mas não estão mortas e farão de tudo para preservar a parte que elas acham que lhes cabe nesse enorme latifúndio político que é o Estado brasileiro. Quando o Fator Bolsonaro se apresentar maior do que é hoje, os oligarcas levarão a cabo o projeto de união de centro-esquerda num ambiente político onde sobra esquerda e centro, mas falta direita.

Analisando de acordo com as circunstâncias de hoje, se não é impossível, será um enorme desafio para Bolsonaro superar a máquina constituída e capilarizada país afora de siglas profissionais como PSDB, PMDB e PT. A seu favor, porém, existem os brasileiros exaustos com os políticos que estão aí e que são vistos por eles como responsáveis pela situação do país.

A eleição, hoje, caminha para um segundo turno entre Bolsonaro e Ciro Gomes, que, em se tratando de oligarquia, é PhD em Harvard. Bolsonaro já rompeu os 20% de intenções de voto e, ao contrário do que os especialistas têm afirmado com convicção questionável, tem potencial de crescimento porque os fatores que o beneficiaram na semana passada não serão resolvidos até a eleição, principalmente a insegurança pública. Pelo contrário, os problemas tendem a aumentar. As condições favoráveis, no entanto, podem mudar e as chances de Bolsonaro diminuírem.

Arrisco-me a dizer que o maior adversário de Bolsonaro, neste momento, não é Ciro Gomes, mas ele próprio: suas falas, escolhas, alianças. Se continuar, entretanto, a fazer a leitura correta do cenário político, a aprimorar as suas intervenções públicas nos discursos, entrevistas e redes sociais, e ainda ter a seu favor os equívocos dos adversários, poderá ser bem-sucedido naquilo que a maioria dos comentaristas políticos hoje considera uma impossibilidade: não só vencer a eleição presidencial, mas fazê-lo no primeiro turno.

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