Projeto de lei muda a fórmula de cobrança do ICMS sobre os combustíveis produzidos no Brasil.| Foto: Jonathan Campos/Arquivo/Gazeta do Povo
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As mudanças nas regras de cobrança do ICMS aprovadas às pressas pelo Congresso e sancionadas imediatamente pelo Presidente da República são tão tardias quanto bem-vindas. O novo ICMS encerrará décadas de abuso fiscal e oportunismo tributário por parte dos Governos Estaduais que, justo em momentos de crise, elevavam sua arrecadação injustificadamente, encarecendo ainda mais o preço dos combustíveis e outros produtos essenciais. Tal expediente era viabilizado pela incidência ad valorem do ICMS: uma alíquota aplicada sobre o preço estimado (!) do combustível na bomba, um percentual que variava de um Estado para outro, mas cuja média correspondia a inacreditáveis 26,5% do preço final da gasolina e 13,9% do diesel (segundo dados oficiais da ANP coletados entre 27 de fevereiro e 05 de março deste ano).

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A lei complementar, agora vigente, substituiu esse modelo obtuso, complexo e sem transparência pela incidência ad rem do tributo: um valor fixo por litro de combustível, que já virá embutido no preço da refinaria. O ICMS será unificado e conhecido pelo grande público: o mesmo imposto será aplicado em todos os Estados da Federação e eventual revisão desse valor terá periodicidade semestral, conferindo previsibilidade a quem paga e também a quem arrecada. Embora a nova regra enfrente resistência por parte dos Governadores, a aposta dos especialistas é que o modelo beneficie o caixa dos Estados; isso porque a incidência monofásica do tributo – em apenas uma etapa da cadeia de produção, na saída da refinaria – favorece a fiscalização e atrapalha a sonegação fiscal.

As notícias são auspiciosas, mas o luto é necessário: choremos a gasolina derramada...  

Governos Estaduais dispunham de dois mecanismos para rechear seus cofres surfando a onda – ou melhor, o tsunami – das altas do petróleo no mercado internacional, um conspícuo e outro mais discreto: aumentar a alíquota do ICMS ou ampliar a base de cálculo do imposto sobre os combustíveis, conhecida pela sigla PMPF (preço médio ponderado ao consumidor final). O PMPF era uma aferição periódica de preços realizada pelos próprios Estados; na prática, um palpite institucionalizado e enviesado em benefício do fisco estadual. Pior, governadores e secretários da fazenda atuavam em conluio para incrementar sua arrecadação: em março de 2021 – quando a União concedeu isenção temporária nos tributos federais sobre o diesel, visando dissuadir uma greve nacional de caminhoneiros – 18 Estados, mais o Distrito Federal, aproveitaram a oportunidade para rever (para cima, claro!) o PMPF e assim anularam os efeitos positivos da suspensão do PIS/CONFINS.

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A sanha arrecadatória – e a ganância dos governadores – pode ser expressa em algumas cifras bilionárias: 2021 registrou um aumento de 22,6% na arrecadação de ICMS em relação ao ano anterior; nada menos que R$117 bilhões a mais. Adicione a isso um arrego fiscal sem precedentes, que contemplou a suspensão temporária de dívidas e o repasse emergencial de verbas federais extraordinárias para enfrentamento à pandemia, na ordem de 125 bilhões de reais para os governos locais. O Banco Central calculou o superávit primário de Estados e Municípios em R$38 bilhões de reais só em 2020; o Tesouro Nacional divulgou que o caixa das Prefeituras e Governos praticamente dobrou de 2019 para 2020, atingindo o recorde da série histórica: R$82,8 bilhões.

É nesse contexto de bonança fiscal – e de enriquecimento dos Estados às custas da União – que a guerra política pelo ICMS, ora vencida pelo governo federal, deve ser analisada. Os Governadores, blindados pela má vontade da velha imprensa com o Presidente da República, sentiam-se à vontade para reclamar para si os espólios da crise internacional do petróleo, tributando os combustíveis arbitrariamente de forma a agravar ainda mais o quadro inflacionário brasileiro. E faziam isso ilesos, como demonstrou pesquisa recente do PoderData, indicando que 42% da população atribuía ao governo federal a culpa pela alta dos combustíveis. Não fosse a emergência da guerra (e do calendário eleitoral), nossos ínclitos Parlamentares estariam até agora alheios a esse confisco tributário que se perpetuou por anos nos palácios e assembleias de todo país.

Que a nova regra do ICMS para combustíveis sinalize ao grande público os benefícios de uma tributação unificada, simplificada, transparente, monofásica, previsível e ad rem. Impostos não servem para enriquecer o Estado, servem para custeá-lo.