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Caio Coppolla

Caio Coppolla

Semana da Mulher

Mulheres indefesas por lei

A cada 6 horas e 30 minutos, uma mulher morre por homicídio qualificado em razão de gênero. (Foto: Pixabay)

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Escrevo este artigo por ensejo do Dia Internacional da Mulher. A justificativa histórica para a escolha da data ainda é fonte de debate, mas é consenso que o 8 de março tem origem em movimentos de matiz socialista do começo do século 20, seja na América ou na Europa – parece mais plausível que a celebração da “mulher heroica e trabalhadora” se deva a uma greve de 1917, organizada por operárias russas em protesto contra a fome e a 1ª Guerra Mundial, ato reputado pelos bolcheviques como momento inaugural da revolução e posteriormente celebrado em todo o bloco soviético. Portanto, não é de hoje que a esquerda arroga para si o virtuoso monopólio da defesa dos interesses da mulher, uma narrativa que só se intensificou ao longo dos anos em ramificações como o feminismo, o progressismo, as ações afirmativas e as políticas identitárias.

Contudo, honrando seu histórico de hipocrisia e contradição, a esquerda brasileira atua diuturnamente contra a garantia mais básica de uma mulher: sua segurança física. Enquanto denuncia a violência doméstica fruto da cultura patriarcal, a esquerda resiste ao aumento das penas para os agressores; enquanto qualifica todo homem como um estuprador em potencial, a esquerda assegura aos estupradores de fato o direito à liberdade até o trânsito em julgado do processo; enquanto manipula estatísticas sobre desigualdade de remuneração entre os gêneros, a esquerda garante ao assaltante inúmeras oportunidades de subtrair o patrimônio de mulheres indefesas durante os saidões nos presídios... Exemplos não faltam para comprovar o desserviço que o progressismo, na sua cruzada pelo abolicionismo penal, presta às mulheres, cada vez mais vulneráveis por força de lei – uma lei que pensa o direito penal sob a ótica do criminoso, agressor e culpado, e não da sua vítima, indefesa e inocente.

Uma das supostas vitórias da esquerda no âmbito da política criminal foi a tipificação do feminicídio. Cumpre esclarecer que não se trata de um crime, mas de uma circunstância qualificadora do homicídio [Código Penal, artigo 121: “Matar alguém”]. Em termos de acréscimo à pena, o feminicídio [§ 2°, inciso VI] traz as mesmas consequências de outras qualificadoras comumente utilizadas para enquadrar assassinos de mulheres e estabelecer a dosimetria de suas penas, a saber, o motivo fútil e torpe [§ 2°, incisos I e II]. O feminicídio apenas confere objetividade à lei, na medida em que determina expressamente que homicídios cometidos “contra a mulher por razões da condição de sexo feminino” se enquadrem entre as qualificadoras do tipo penal. Portanto, trata-se, essencialmente, de uma nova embalagem para um mesmo produto podre: uma lei tão leniente que permite que nossos maiores covardes não passem sequer 1 dia na prisão... duvida?

Imagine um homem agressivo, sexista e de péssima índole; há inúmeros. Ele enxerga suas eventuais companheiras como sua propriedade e dá vazão às suas frustrações pessoais prevalecendo da sua força física para ameaçar, humilhar e machucar as mulheres que cruzam a sua vida. Ele faz isso há anos, protegido pelo medo das vítimas, pelos padrões psicológicos típicos de relacionamentos abusivos, pelo seu poder econômico e, infelizmente, por certa tolerância social à violência contra a mulher. É um agressor inveterado, que já espancou várias de suas parceiras; em outras palavras, já cometeu vários crimes. Mas embora sua conduta criminosa seja reiterada e haja provas cabais e abundantes desses delitos, ele será réu primário até que sua primeira sentença condenatória transite em julgado – o que levará anos, muitos anos. Um “belo” dia, esse homem (?) chega em casa e, por qualquer pretexto idiota – geralmente ciúme patológico, visto que é inseguro e tem baixa autoestima – desfere facadas nos membros e abdômen da sua mulher. Ato contínuo, foge em retirada. Os vizinhos ouvem a comoção, saem em socorro da vítima e conseguem leva-la ao hospital. Por um milagre, ela sobrevive. Todo esse ódio, dor e sofrimento relatados encontram seu tipo na letra fria da lei: houve uma tentativa de homicídio, qualificada pelo gênero da vítima.

No dia seguinte ao delito, o agressor comparece voluntariamente à polícia com seu advogado – desses que só lutam pela “defesa do direito de defesa” e raramente aparecem ao lado das vítimas. O denunciado, “um cidadão-exemplar, réu primário sem antecedentes criminais, pai-de-família, trabalhador com residência fixa, que agiu irrefletidamente sob impulso passional”, confessa o crime e posteriormente é detido por ordem judicial – isso porque (ainda) nos resta a prisão preventiva [Código de Processo Penal, artigo 313, incisos I e III]. Infelizmente, a prisão preventiva é revogada por habeas corpus, uma vez que a defesa persuadiu o juízo de que as medidas protetivas à vítima não seriam violadas pelo denunciado.

Chega o julgamento, o réu (confesso) é considerado culpado por tentativa de homicídio qualificado, e o juiz – um garantista, que enxerga o direito penal como um mecanismo de proteção ao acusado em face do punitivismo estatal – aplica a pena mínima prevista, com a justificativa legal da primariedade do condenado e outras circunstâncias que o abonam, todas elas brilhantemente argumentadas por seu bem remunerado advogado criminalista.

A pena mínima para homicídio qualificado, incluindo o feminicídio, é de 12 anos de reclusão. Todavia, este é um caso de tentativa de homicídio qualificado, e crimes tentados tem sua pena reduzida de um a dois terços. O juiz, fingindo parcimônia, reduz o tempo de reclusão para apenas 8 anos. Ocorre que, nos termos do artigo 33 do Código Penal [§ 2°, alínea “b”]: “o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto” – o que significa que o condenado apenas repousará na colônia penal, ficando livre para trabalhar e praticar outras atividades da vida civil durante o dia.

De fato, nosso covarde agressor de mulheres parece ser um homem de sorte: faltam vagas na colônia penal superlotada, condição indigna denunciada minuciosamente em um tocante relato do advogado de defesa, tão bem pago quanto eloquente. Não há outro caminho se não a aplicação imediata da Súmula Vinculante número 56, do STF: “A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso”. Trocando em miúdos: nosso agressor iniciará o cumprimento da sua pena em regime aberto [art. 33, § 1°, alínea “c”], dormindo no seu próprio domicílio, completamente livre para praticar atividade lícitas durante o dia.

É a definição prática da impunidade: no Brasil de hoje, um homem de natureza violenta e misógina, agressor contumaz de mulheres, que chegou ao cúmulo de tentar matar sua companheira a facadas em um acesso de raiva, pode ser julgado pela Justiça e, ainda assim, por força de lei e da interpretação dos tribunais, não passar sequer uma semana na cadeia. Todo esse arcabouço legal e jurisprudencial, que favorece a escória da sociedade em detrimento de suas vítimas, descende da esquerda.

É a esquerda que romantiza o criminoso como uma vítima social corrompida por um sistema opressor, ignorando o livre arbítrio que orienta toda escolha pessoal; é a esquerda que se mobiliza para defender direitos dos agressores, mas se omite em dar protagonismo ao sofrimento das suas vítimas; é a esquerda que acredita que a finalidade principal da pena é a ressocialização – e não a prevenção de outros crimes, a punição pelo delito e a retribuição moral às vítimas e à sociedade; é a esquerda que busca a atenuação das penas, a descriminalização de ilícitos e a despenalização de crimes leves, como se extinguir a punição tornasse o Brasil um lugar mais justo e seguro.

Não, este país é menos seguro por causa da esquerda; e em especial, as mulheres deste país estão menos seguras por causa da esquerda. Oportunistas, desinformados e ingênuos de plantão celebram a tipificação do feminicídio e outras medidas de apelo midiático como se fossem grandes vitórias para as mulheres, conquistas históricas que trarão justiça de verdade às milhares de vítimas de violência doméstica extrema. Não são, como bem demonstrado no caso ilustrativo – mas recorrente – do agressor que tenta assassinar sua mulher a facadas e, nos termos da lei, passa pelo nosso sistema penal com menos de uma semana de detenção. Imagine quantos monstros vagam por aí livres para se ressocializarem com suas futuras vítimas; imaginem o inferno psicológico de tensão e medo em que vivem suas antigas companheiras que foram violentadas, sabendo que seus agressores estão soltos.

Quem é bem informado e deseja, de coração, proteger as mulheres, jamais votaria nessa esquerda brasileira que, ao fazer e interpretar leis, coloca sua ideologia bandidólatra – ou seu próprio medo de ir parar na cadeia – acima da segurança das nossas irmãs, namoradas, esposas, filhas, mães e avós. Mulheres são o ápice da criação e seu bem-estar deve ser guardado com prioridade por qualquer sociedade que se pretenda civilizada.

Segundo o levantamento mais recente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, com base em dados oficiais de 2020, a cada 6 horas e 30 minutos, uma mulher morre por homicídio qualificado em razão de gênero.

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