Em artigo para a Folha de S. Paulo, o renomado diretor José Padilha (“Tropa de Elite”, “O Mecanismo”) teceu duras críticas à atuação e ao caráter do ex-Juiz e Ministro da Justiça, dr. Sergio Moro. Alguns destaques:
“Sergio Moro finge não saber o que é milícia porque perdeu sua independência e hoje trabalha para a família Bolsonaro”.
“O pacote anticrime que Sergio Moro enviou ao Congresso —embora razoável no que tange ao combate à corrupção corporativa e política— é absurdo no que se refere à luta contra as milícias. De fato, é um pacote pró-milícia, posto que facilita a violência policial”.
Ao rebater a análise do diretor hollywoodiano, Moro foi cirúrgico: “excesso de ficção”.
Opinião vs Fatos
Daniel Patrick Moynihan, senador e embaixador americano, registrou para a posteridade: “Todos tem direito à sua própria opinião, mas não aos seus próprios fatos”.
As críticas de Padilha (opinião) estão descoladas da realidade (fatos). Em síntese, ele acusa Moro de leniência e até conivência com as milícias – conivência vem do latim, conivere: literalmente “fechar os olhos”. Mas basta uma análise superficial da legislação encaminhada pelo Ministério da Justiça ao Congresso para verificar que este não é o caso. Eis alguns tópicos do pacote anticrime:
Se o leitor fosse um miliciano (ou seu preposto no Poder Legislativo), aprovaria tais medidas?
Premissas equivocadas…
No artigo, Padilha desenvolve sua argumentação baseado na premissa de que aquilo que beneficia a polícia beneficiará a milícia. Além da confusão conceitual eivada de preconceito e da flagrante generalização, o autor mostra ter caído vítima da narrativa do “Brasil miliciano”, que caricatura o país como uma versão ampliada do Rio de Janeiro (que Padilha conhecia tão bem antes de desertar para os EUA).
…discurso capturado
Oportunistas que são, os apologistas da impunidade já se apropriaram do “lugar de fala” (sic) do cineasta. É mais um “discurso de autoridade” para se somar aos seus esforços contra o governo, a Operação Lava Jato e a execução provisória das penas – a propósito, a prisão após julgamento em 2ª instância também consta do pacote anticrime. Duvido que Padilha se oponha ao encarceramento de corruptos sentenciados por órgãos colegiados, mas sua contribuição à Folha de S. Paulo reforçou a trincheira da bandidolatria no debate público.
Gritante contraste
Em 2014, José Padilha brincou de combater o crime ao dirigir o filme Robocop. Na mesma época, o então Juiz Sergio Moro enfrentou os criminosos mais poderosos do Brasil, arriscando sua própria vida.
De lá pra cá, a Operação Lava Jato infligiu amargas derrotas à cleptocracia, sendo responsável por 242 condenações contra 155 réus. Somadas, as penas ultrapassam 2242 anos. Entre os presos estão um ex-Presidente da República, um ex-Presidente da Câmara Federal e grandes empreiteiros do país – o tipo de gente que se achava (e vivia) acima da lei.
Portanto, ainda que a opinião equivocada seja um direito, a realidade se impõe em gritante contraste: há quem fabrique heróis de mentira, mas também há heróis de verdade.
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