O áudio vazado com o discurso de Michel Temer (PMDB) e que mostra o vice-presidente já anunciando como será seu mandato depois da queda de Dilma Rousseff (PT) é uma nova bomba em Brasília, pelo menos por dois motivos.
Por um lado, Temer fica parecendo, mais do que nunca, um conspirador Questionado um ano atrás sobre se passaria para a História como um “oportunista”, o vice afirmou que isso só aconteceria se ele conspirasse contra a presidente.
Agora, o áudio mostra Temer não apenas falando como futuro presidente (anuncia políticas, ações, planos) como também criticando duramente a gestão de Dilma. Em certa altura, dá a entender que Lula ia no rumo certo, mas que “a última gestão” pôs tudo a perder. Fala em descrédito, inflação e desemprego. Mas não cita Dilma nominalmente.
Por outro lado, Temer, num áudio que deveria ficar restrito a peemedebistas, fala em sacrifícios para a população. Sacrifícios reais, econômicos. Dá a entender que flexibilizaria direitos dos trabalhadores e faria uma reforma da previdência. Medidas que podem ser necessárias, na opinião de muitos, e que já fazem parte do documento do PMDB, o “Ponte para o Futuro”.
Mas ditas assim de viva voz pelo possível presidente (em caso de impeachment) pode levar os defensores da queda de Dilma no Congresso a perderem discurso. Pois, para a população, ao derrubar a presidente (odiada) poderão estar entregando o poder a um vice que pode se tornar igualmente detestado.
Dentre outras coisas, Temer fala em um governo bastante liberal, em que o Executivo cuidaria apenas do essencial. “O Estado brasileiro tem que cuidar de segurança, de educação, saúde, alguns temas fundamentais que não podem sair da órbita pública, mas o mais tem que ser entregue à iniciativa privada“, diz Temer.
Veja a íntegra do discurso abaixo.
“Eu quero neste momento me dirigir ao povo brasileiro para dizer algumas das matérias que penso devam ser por mim agora enfrentadas. E o faço naturalmente com muita cautela porque na verdade sabem todos que há mais de um mês eu me recolhi exata e precisamente para não aparentar que estaria praticando algum ato, algum gesto, com vistas a ocupar o lugar da senhora presidente da República.
Recolhi-me o quanto pude, mas nesse período evidentemente fui procurado por muitos que estão aflitos com a situação do nosso país. Mas agora, quando a Câmara dos Deputados decide por uma votação significativa declarar a autorização para a instauração de procedimento contra a senhora presidente muitos me procuraram para que eu desse pelo menos uma palavra preliminar para a nação brasileira, o que eu faço com muita cautela, com muita modéstia, com moderação, mas também em face da minha condição de vice-presidente, de substituto constitucional da presidente da República.
E desde logo eu quero afirmar que temos ainda um longo processo pela frente, passando pelo Senado Federal. Portanto também as minhas palavras são provisórias, já que nós temos que aguardcar e respeitar a decisão soberana que o Senado Federal proferirá a respeito desse tema, seja quanto à admissibilidade da autorização, seja quanto ao final o julgamento propriamente dito. Portanto eu quero neste momento prestar uma homenagem ao Poder Legislativo, tanto à Câmara dos Deputados, que já debateu amplamente este tema, quanto ao Senado Federal, que irá debatê-lo.
E desde logo eu quero comunicar aos colegas, homens públicos, senadores, da melhor cepa, sabedcoria, que aguardarei respeitosamente a decisão do Senado Federal. Não quero avançar o sinal.Até imaginaria que eu poderia falar depois da decisão do Senado, mas evidentemente sabem todos os que me ouvem que quando houver a decisão definitiva do Senado que eu preciso estar preparado para enfrentar os graves problemas que hoje afligem o nosso país.
E quero repetir o que tenho pregado ao longo do tempo. Os senhores sabem que há oito ou dez meses tenho feito pronunciamentos refernetes à pacificação, à unificação do país, porque é chocante, para não dizer tristíssimo ver os brasileiros controvertendo-se entre si, disputando ideias e espaços, até aí tudo bem, mas quando parte para uma coisa quase física isso não pode acontecer nesse país. Portanto, ao dizer que a grande missão é a pacificação, da reunião do país, quero dizer que estou repetindo o que venho pregando há muito tempo como responsável por uma parcela da vida pública nacional.
Devo dizer também que isso fica para o que quer que aconteça no futuro, que é preciso um governo de salvação nacional, de união nacional. É preciso que se reúnam, todos os partidos políticos, e que todos os partidos partidos estejam dispostos a dar a sua colaboração para tirar o país da crise. Sem essa unidade nacional acredito que será difícil tirar o país da crise em que nos encontramos.
Para tanto é preciso diálogo. O fundamental agora é o diálogo. Em segundo lugar a compreensão. Em terceiro lugar, para não enganar ninguém, a ideia de que vamos ter muitos sacrifícios pela frente. Sem sacrifícios, não vamos conseguir avançar para retomar o crescimento e o desenvolvimento que pautaram a atividade do nosso país nos últimos tempos, antes dessa última gestão.
É preciso retomar esse crescimento. E não quero que isso fique em palavras vazias. Tenho absoluta convicção, como muitos me dizem,, que a mudança pode gerar esperança. E que a esperança pode gerar investimentos.Não só investimentos nacionais, mas investimentos estrangeiros, porque precisamos restabelecer a crença nas potencialidades brasileiras.
Fiz muitas viagens internacionais no primeiro mandato e verifiquei o quanto os outros países que têm muito dinheiro em suas mãos querem fazer aplicando no Brasil. Ou seja, querem acreditar no Brasil. O que aconteceu nos últimos tempos foi um descrédito no Brasil. E o descrédito é que leva à ausência do crescimento do desenvolvimento. E faz retomar a inflação.
De um lado temos a absoluta convicção de que é preciso prestigiar a iniciativa privada, é preciso que os empresários do setor industrial, do setor de serviços, do agronegócio, dos vários setores da nacionalidade se entusiasmem novamente com esses investimentos. Mas ao dizer isso estou pensando apenas naqueles que possam investir? Não. Estou pensando me manter as conquistas sociais obtidas nos últimos tempos.
Por exemplo, o emprego é uma coisa fundamental para todos os brasileiros. Para que haja emprego, é preciso que haja uma conjugação dos empregadores com os trabalhadores. Você só tem emprego se a indústria, o comércio, as atividades de serviço estiverem caminhando bem. É a partir daí que você tem emprego. E de outro lado, é preciso dizer que afora um projeto pela empregabilidade plena, que é preciso manter certas matérias sociais. Porque o Brasil ainda é um país pobre.
E eu sei que dizem de vez em quando que se outrem assumir, vamos acabar com o Bolsa Família, vamos acabar com o Pronatec, com o Fies, isso é falso. Isso é mentiroso, e é fruto dessa política mais rasteira que tomou conta do país. Neste particular quero dizer que vamos manter esses programas e até se possível revalorizá-los e ampliá-los. E com isso o Bolsa-Família deve ser um estágio do Estado brasileiro. Daqui a alguns anos é possível que a empregabilidade tenha atingido um tal nível que não haja mais necessidade do Bolsa Família.
Mas enquanto persistir a necessidade, nós manteremos, assim como Pronatec, Fies, ProUni, todos esses projetos que acabaram dando certo no país. Portanto lanço uma mensagem para os que têm o capital e lanço àqueles que querem uma mensagem do trabalho e lanço uma mensagem para aqueles que sequer trabalho ainda conseguiram.
É claro que vamos incentivar enormemente as parcerias público-privadas, na medida em que isso possa gerar emprego ao país. Nós temos absoluta convicção de que hoje mais do que nunca o Estado não pode tudo fazer. O Estado depende da atuação dos setores produtivos. Empregadores de um lado, trabalhadores de outro lado. Esses setores produtivos é que, aliançados, vão fazer a prosperidade do Estado brasileiro.
O Estado brasileiro tem que cuidar de segurança, de educação, saúde, alguns temas fundamentais que não podem sair da órbita pública, mas o mais tem que ser entregue à iniciativa privada, no sentido da conjugação da ação de empregadores e trabalhadores. E nesse particular nós pretendemos fazer várias reformas que incentivem uma harmonia entre esses dois setores da produção brasileira.
Tudo isso que eu estou a dizer, devem significar, devo registrar, sacrifícios iniciais para o povo brasileiro. Em segundo lugar, não quero gerar falsas expectativas. Não pensemos que se houver uma mudança de governo em três ou quatro meses estará tudo resolvido. Em três ou quatro meses pode começar a ser encaminhado, para resolvermos a matéria ao longo do tempo.
Se houver esse governo de transição, ou se não houver fica essa sugestão para o governo que vier a manter-se, fica essa sugestão, que não são sugestões por mim formuladas ou formatadas nesse momento, mas que foram feitas ao longo do tempo. Há reformas que são fundamentais para o país. Agora, toda e qualquer reforma não alterará os direitos já adquiridos pelos cidadãos. Mas temos que preparar o país do futuro.
Muitas matérias até estão em tramitação no Congresso Nacional e nós queremos ter uma base parlamentar muito sólida que nos permita conversar com a classe política mas também conversar com a sociedade. Os senhores que assistiram minhas palestras sabem que eu faço uma distinção e uma conjugação entre governo, governança e governabilidade, para dizer que o governo são os órgãos constituídos, Executivo, Legislativo, Judiciário, não tem a menor dúvida. A governança vem exatamente pelo apoio que o governo consegue dos partidos políticos e do Congresso Nacional.
Mas é preciso mais do que isso, é preciso a governabilidade, e a governabilidade exige que haja uma aprovação popular do próprio governo, portanto a classe política unida com o povo levará ao crescimento do país e portanto ao apoio ao governo. É com esses três fatores que vamos lidar.
É claro que não vou falar aqui de reformas que são fundamentais, porque isso será fruto de desdobramento ao longo do tempo, mas como não pensar numa reforma política, numa reforma tributária. E evidentemente que a reforma tributária envolve um outro tema, que é a revisão do pacto federativo. Porque toda vez que você pensa numa reforma tributária está pensando numa divisão de competências e de recursos para as entidades federativas.
É preciso mais do que nunca que as entidades federativas tenham uma autonomia verdadeira, ou seja, que nós tenhamos uma federação real, e não artificial, como tem acontecido nos últimos tempos. Sei por exemplo da grande dificuldade dos estados e municípios nos dias atuais. E há estudos referentes a uma eventual anistia, ou perdão, de parte das dívidas e até uma revisão dos juros que são pagos pelas unidades federadas.
Nós vamos levar isso adiante, vamos estudar com muita detença e vamos levar isso adiante. Porque a força da União deriva da força dos estados e do município. E a força dessas unidades federativas depende da boa vontade e do apoio da classe política e do povo brasileiro. Há matérias controvertidas, como matérias referentes a legislação trabalhista e previdenciária que nós vamos fazer com grande diálogo nacional, onde nenhum setor será esquecido, nem dos trabalhadores, nem dos empresários, nem do povo brasileiro.
Mas toda e qualquer modificação que vier a ser feita será para garantir o futuro mesmo aqueles que já recebem salário, daqueles que recebem aposentadoria. É nestes termos que nós vamos trabalhar. Ou seja, o diálogo de um lado e a conjugação de esforços de outro lado que serão os alicerces, digamos assim, do nosso trabalho. É esta a manifestação que eu queria deixar ao povo brasileiro.”
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