É difícil, mas pode acontecer: às vezes Alexandre Frota ajuda a explicar a vida nacional. O Livre.Jor, uma pequena organização de jornalismo curitibana, teve a ideia de pedir ao Ministério da Educação explicações sobre o que o ator foi fazer ao visitar Mendonça Filho no MEC – a visita aconteceu assim que Michel Temer assumiu interinamente a Presidência.
Na época, o que se cogitou é que Frota, em companhia do grupo Revoltados Online, tinha ido defender o projeto Escola Sem Partido. Segundo o manifesto que o MEC recebeu, nada disso. Aliás, a conversa nem teve a ver com educação, aparentemente. Tratou-se de um pedido para que Temer governe à direita, privatizando, flexibilizando leis trabalhistas e vendo bem quem é que recebe esse tal Bolsa Família.
Mas o primeiro parágrafo talvez seja mais significativo. Antes de fazer suas propostas, o grupo diz que Dilma caiu pela “profunda contrariedade” com a “percepção de que vontades que não emanam do povo brasileiro vinham pautando as ações do governo federal”. “Importa pontuar que, em boa medida, essa contrariedade alçou Vossa Excelência à condição em que hoje se encontra.”
Ao que tudo indica, as propostas que “não emanaram do povo” foram as políticas do petismo ao longo dos 13 anos. Segundo o texto, Dilma caiu por isso: pela ação do BNDES (com obras em Cuba), pelo Bolsa Família, pela proximidade com o MST etc. Como a Constituição brasileira não permite impeachment por esses motivos, resta esperar que o movimento esteja errado em sua avaliação e que Dilma esteja caindo mesmo por atos de corrupção.
O curioso, porém, é que se diz com todas as letras que isso contraria a vontade do brasileiro. Não emanou do povo. Ora, pode-se dizer muito sobre o governo petista, mas a não ser por Aécio Neves, quase todo mundo sabe que o partido ganhou as quatro últimas eleições presidenciais. Naquele velho sistema democrático em que se contam os votos de um candidato, de outro e considera-se eleito o que obtém mais da metade dos eleitores.
Portanto, o que quer que o PT tenha feito, foi avalizado pelos eleitores não uma, mas quatro vezes – com intervalos de quatro anos entre uma e outra consulta popular que daria bastante tempo para as pessoas pensarem de novo, caso se considerassem traídas. Claro que isso não dá carta branca ao governo – muito menos para cometer casos de corrupção.
Mas é típico de certo pensamento achar que a população não sabe o que faz. E que as opiniões que expressa nas urnas não são dignas do verdadeiro espírito popular, que deve ser interpretado por sábios, por quem realmente entende a Nação e seus desejos historicamente consolidados. Certa vez, um colunista disse que até as leis de um país não podem ser feitas se contrariarem esse espírito – e quem julga esse espírito? Ele mesmo, claro.
Georges Lefebvre, em seu brilhante estudo sobre a Revolução Francesa, conta do desespero de um aristocrata durante os Estados Gerais, com as ideias que o Terceiro Estado estava conseguindo implantar. Dizia ele que era preciso melhorar a situação do povo, mas sem que ele participasse do processo. Duzentos e trinta anos depois, tem gente que ainda acredita nisso.
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