Colaboração de Simon Benoit-Guyod:
No domingo, os eleitores franceses não vão apenas decidir do futuro do seu país. O que está em jogo é o futuro da União Europeia num segundo torno completamente inédito na historia da França. São duas visões radicalmente opostas competindo para governar a quinta economia do mundo. De um lado, o ex-ministro da economia do governo socialista de François Hollande, Emmanuel Macron, aparece como o favorito; do outro, a candidata da extrema-direita Marine Le Pen. Em menos de quatro anos, Macron conseguiu uma ascensão politica prodigiosa, surpreendendo uma população acostumada a uma guerra eleitoral entre partidos tradicionais.
Graduado da famosa ENA, que forma a maioria da elite politica francesa, o candidato do centro passou de simples desconhecido a líder de uma força politica que está mudando o espectro politico francês. Seu movimento, chamado “En Marche”, é a grande surpresa dessa eleição presidencial. Social-democrata com tendências neoliberais, Macron espera conseguir o que nenhum presidente tem conseguido desde que o pais entrou num período de tumulto econômico no inicio da década de 1980: modernizar a economia francesa. O candidato de 39 anos, que tem repetido em várias ocasiões não ser de direita nem de esquerda, seduziu os maiores atores econômicos do país com seu plano de oferecer mais flexibilidade no mercado de trabalho. Como Tony Blair no Reino Unido vinte anos atrás, Macron quer levar a França ao caminho da social-democracia liberal, o que criou uma cisão importante dentro do tradicional partido socialista francês.
Ao se posicionar no centro, uma novidade na França, o candidato conseguiu roubar do partido socialista uma parte importante dos seus quadros (incluindo o ex-primeiro ministro Manuel Valls), fragilizando como nunca o partido do atual presidente Hollande. Representado no primeiro torno por Benôit Hamon, o PS, tradicional partido de centro esquerda, chegou ao quinto lugar. Essa derrota histórica deu muita força a Macron e ao trabalhista Jean Luc Mélenchon, candidato da “France Insoumise”.
O desejo de Macron de manter a lei trabalhista de 2015, que levou os maiores sindicatos do pais à rua, e aliviar a fiscalização nas pequenas empresas são sinais claros aos eleitores de Jean Luc Mélenchon, novo líder da esquerda radical, que não esta disposto a fazer concessões. Criticado por sua proximidade com o mundo das finanças internacionais e com a mídia, Macron já sabe que não contará com os votos dos eleitores dos partidos da extrema esquerda no domingo.
Internacionalistas vs nacionalistas
A favor do Euro e da modernização da União Europeia criando um dialogo mais flexível com a Alemanha da conservadora Angela Merkel, Macron aparece como o candidato favorito da classe média urbana francesa. O centrista, que tem conseguido o apoio das principais forças politicas do país para o voto decisivo deste domingo, representa uma visão radicalmente oposta ao projeto de Marine Le Pen. A candidata do Front Nacional, que conseguiu resultados impressionantes nas regiões economicamente mais vulneráveis do pais, tem baseado seu projeto na velha ideia de que o nacionalismo conseguiria colocar a França no lugar que merece.
Desde 2011, quando foi eleita chefe do partido criado por seu pai durante o período de descolonização, Le Pen tem se posicionado como a candidata da ruptura com o “establishment”. Lutando para um “Frexit”, uma volta da França à sua soberania com uma saída da UE e do Euro, a eurocética aproveita um clima de tensão social e racial agravado pelos ataques terroristas que o país sofreu nos últimos dois anos. Esse discurso conquistou muitos eleitores dentro da classe operaria e do mundo rural, que se sentem abandonados pelos políticos tradicionais e excluídos da economia globalizada.
Como Donald Trump nos Estados Unidos, Le Pen conquistou votos nas áreas mais fragilizadas pelas mudanças econômicas pelas quais passou o mundo ocidental nas ultimas décadas. Maior força política no leste e no norte do pais, onde a taxa de desemprego continua acima dos 10%, ela acredita no fechamento das fronteiras, popularizando um discurso no qual o imigrante estrangeiro seria em grande parte responsável pelo declínio moral e econômico da França. Le Pen já sabe que vai recuperar uma certa parte dos eleitores mais radicais da direita tradicional, apesar de o candidato François Fillon, terceiro colocado no primeiro turno, ter pedido votos para Macron.
Se Le Pen ganhar, a França seria mais uma potência internacional a seguir a onda conservadora que tem se espalhado internacionalmente nos últimos anos. Com sua proximidade com Vladimir Putin e sua determinação a romper de uma forma brutal com a União Europeia, uma vitoria da candidata da extrema direita levaria a França, a União Europeia e talvez o mundo inteiro a um futuro cheio de incerteza.
Simon Benoit-Guyod é jornalista francês, 30 anos, formado em jornalismo internacional pela Universidade Paris 3 Sorbonne Nouvelle.
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