Tive pena. Confesso que não chorei porque não é do meu feitio, mas isso não quer dizer que não tive pena. Mais do que isso, abri meus olhos para algo que jamais havia compreendido.
Gustavo Nogy me fez ver a verdade. No começo parecia que ele apenas repisaria o óbvio: que negros com dinheiro são alvo de preconceito menor do que negros sem grana. Mas não: a verdade revelada era mais profunda. Aleluia.
A verdade incluía saber que o racismo é uma praga que corrói a vida de um branco de classe média. Que um autor de livros lançado nas livrarias da moda sofre mais com o preconceito no Brasil do que certos negros – especialmente do que negros que têm consciência do racismo e têm ideologia diferente da dele.
Nogy começa, como todo bom cronista, com um ponto específico. O fato de Taís Araújo, uma atriz negra, ter dito que as pessoas desviam de seu filho na rua, por ser negro. Até mudam de calçada.
Exagero!, ensina Nogy, com seu infalível telescópio que lhe permitiu ver tudo de seu confortável gabinete. O filho de Taís é um privilegiadinho que só anda no Leblon acompanhado de gente rica.
Mais: o filho de Taís não apenas está imune ao preconceito. Criança ainda, ele é o monstro, ou no mínimo é a ponta de uma monstruosidade.
Pois Taís, seu marido e os filhos são opressores. Sim: embora deixe claro que jamais conviveu com o casal, com a família, Nogy teve a argúcia antropológica e cultural de perceber que o casal anda cheio de seguranças, e de seguranças inamistosos.
Ele não crê, como seria de imaginar que acontece em qualquer família normal, que uma criança ande sozinha pelas ruas de seu bairro. Que brinque, vá à praia, sem seguranças.
Muito menos cai na falácia de que as pessoas desviem de meninos negros nas ruas por medo de serem assaltadas. Isso jamais existiu no país. O menino de Taís, além de tudo, é rico, e sua aura de riqueza deve protegê-lo, certamente.
Porque quem pensa diferente deve ser um monstro com faca nos dentes pronto a nos ferir, não? Ainda que seja um menino negro que nunca fez nada a ninguém.
Nogy nos revela isso e mais. Que não existe racismo estrutural ou institucional, e que quem acredita nisso é um tolo que precisa urgentemente conhecer suas verdades. E revela, num lance teatral, que pobre coitado é ele (e que grande mestre ao misturar num só texto a crítica ao coitadismo e ao mesmo tempo se vitimizar sem parecer, com isso, um mero sofista!).
Que ele mal tem trezentos leitores. Que ele só é xingado, maltratado. Que não tem influência. Que é só e meramente um branco, exposto às crueldades de um país como o nosso. Pobre Nogy, mais uma vítima do eterno racismo contra os brancos de classe média. Controle suas lágrimas quem puder.
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