Da coluna Caixa Zero de hoje, na Gazeta do Povo:
Burocratas são craques em resolver problemas com palavras. Recentemente, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, garantiu que a fiscalização do setor aéreo existe, ao contrário do que os fatos fazem imaginar. “A fiscalização existe. A eficácia dessa fiscalização é que é o problema.” O jornalista Roberto Pompeu de Toledo traduziu a fala do ministro assim: “A fiscalização existe. O problema é que a fiscalização não fiscaliza.” No fundo, foi isso mesmo que Jobim disse.
Ontem, foi a vez de o secretário nacional de Direitos Humanos, Paulo Vanucchi, exercer sua habilidade de resolver problemas usando apenas a língua. A ONU afirmou que a tortura nas prisões brasileiras é uma prática sistemática. “Dezenas de milhares de pessoas são ainda mantidas em delegacias e em outros locais no sistema prisional onde a tortura e maus-tratos similares continuam a ‘ocorrer de forma disseminada e sistemática’”, afirma o relatório.
Vanucchi respondeu à maneira dos melhores burocratas. Para defender-se, agarrou-se apenas a um adjetivo. Disse que de maneira alguma a tortura nas cadeias é sistemática. A palavra, de acordo com ele, dá a impressão de que a tortura é ordenada pelo governo. E explicou que não é assim. “A tortura existe no Brasil, mas não correspondente à vontade das autoridades e não é sistemática.”
Então, tá. Tudo resolvido. Tortura existe: isso não dá para negar. Mas não é por vontade das autoridades. Traduzindo, à maneira de Roberto Pompeu de Toledo, a frase de Vanucchi poderia ficar assim. “Os presos são torturados, mas eu não queria que fosse assim.” Ou, então. “Tortura existe, mas é sem querer.”
Os presos brasileiros podem respirar aliviados. Continuarão indo para o pau-de-arara das delegacias, Dormirão em celas superlotadas. Talvez se ache mais outro caso de uma adolescente de 15 anos obrigada a fazer sexo com colegas de cela em troca de comida. Mas tudo isso é sem querer. “Não corresponde à vontade das autoridades.” Ah, bom.
Como a suspensão do X afetou a discussão sobre candidatos e fake news nas eleições municipais
Por que você não vai ganhar dinheiro fazendo apostas esportivas
Apoiadores do Hezbollah tentam invadir Embaixada dos EUA no Iraque após morte de Nasrallah
Morrer vai ficar mais caro? Setor funerário se mobiliza para alterar reforma tributária
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS
Deixe sua opinião