O governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, seria um sério concorrente a ganhar o prêmio de frase mais estúpida do ano, caso ele existisse. A defesa que o governador fez do aborto é tão grosseira que até quem é a favor da causa deve ter ficado chocado.
“Quem é que aqui não teve uma namoradinha que teve que abortar?”, perguntou Cabral à plateia durante uma palestra feita para a revista Exame, dizendo que era preciso tratar do aborto pensando “na vida como ela é”.
O governador teve apenas a decência de se autoexcluir da resposta à sua pergunta, dizendo que é casado e que fez vasectomia.
O fato é que Cabral conseguiu ser grosseiro com homens e com mulheres ao mesmo tempo com sua afirmação.
Os homens, na figura pintada pelo governador, são irresponsáveis (saem engravidando todo mundo) e autoritários (“fazem a mulher abortar).
As mulheres são igualmente irresponsáveis (engravidam o tempo todo) e submissas (a pergunta de Cabral se dirige aos homens, como se a decisão sobre o corpo delas coubesse sempre aos homens).
É claro que tem muita gente que nunca fez isso. Mas é comum que argumentos machistas, ou que envolvam qualquer tipo de mau comportamento, sejam feitos na base do “quem nunca fez isso?”
Alguém aí se lembra de um jogador de futebol que, no início deste ano, apareceu na imprensa perguntando “quem nunca tinha saído na mão com a mulher”?
Era Bruno, o goleiro do Flamengo, defendendo o colega Adriano. Pouco depois ficaria claro quais coisas o pensamento de Bruno também considerava “normais”.
Além de todo o resto, a declaração de Cabral é estúpida porque o simples fato de as pessoas fazerem algo não quer dizer que ele deva ser permitido. Ás vezes, pelo contrário, a lei serve justamente para disciplinar um comportamento comum.
Imagine as seguintes frases ditas por um governador, todas inspiradas no modelo de Cabral:
1- “Quem aqui nunca furou um sinal vermelho?”
2- “Quem aqui nunca saiu na mão com a mulher?”
3- “Quem aqui nunca quis matar alguém?”
Primeiro, é óbvio que muita gente poderia responder “não” a qualquer uma dessas questões. Segundo, mesmo que fossem comportamentos completamente comuns, não ia significar que ignorar a lei de trânsito, agredir alguém ou assassinar pessoas passassem a ser comportamentos toleráveis.
O argumento, além de estúpido, é vazio.
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