Um dos jeitos clássicos de se conseguir votos para um cargo público é botar na cabeça das pessoas que você é a pessoa que pode impedir um grande mal na sociedade. Que você é o herói necessário para derrotar o grande vilão daquele momento.
Em alguns momentos, o “vilão” é um problema real – embora normalmente a solução apresentada e o herói que a defende sejam de araque. Era o caso quando o país tinha hiperinflação (um problema real) e os candidatos faziam propaganda dizendo que iam resolver iam com uma só bala de prata…
Em outros momentos, na ausência de um vilão, cria-se um. Aquele que for mais conveniente. Podem ser os imigrantes, os judeus ou os comunistas. O importante é fazer parecer que o risco é iminente, e que é preciso agir rápido,m sem pensar duas vezes.
Nesta eleição, para muita gente, o vilão tem a máscara de Lula. O vilão é o petismo e tudo aquilo que ele passou a representar no imaginário popular, tanto graças a seus defeitos reais (como a corrupção) como nos defeitos mais escandalosamente imaginários que foram sendo atribuídos ao partido para lhe dar ares demoníacos.
Na disputa nacional, ninguém encarna melhor esse espírito do que Jair Bolsonaro. Deputado irrelevante e histriônico que até recentemente se limitava ao baixíssimo clero e a notícias, Bolsonaro surfou no antilulismo. Se Lula era “a esperança que venceu o medo”, Bolsonaro é a volta do medo em sua forma mais radical.
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Medo do petismo, sim. Mas medo principalmente de um modelo de governo que, nas palavras dos eleitores da “nova” direita, é um monte de coisas: vermelho, venezuelano, bolivariano, comunista, foro-de-são-paulino, gramsciano, trotskista, e sabe-se lá mais o quê.
Mas é principalmente o medo do “outro”. Medo de que a sociedade mude. Medo de que pessoas que não tinham acesso a direitos agora tenham. Medo de que a homossexualidade seja vista como algo aceitável. Medo dos transgêneros. Medo de que a palavra “elite” passe a ser vista com suspeita. Medo de que algo mude.
No Paraná, estado ativamente antilulista há muito tempo, os candidatos tentam surfar na onda com as mais bizarras estratégias. De repente, apareceu uma safra de candidatos a delegado Fleury no estado. Uma coleção de fãs do coronel Ustra. Fala-se velada e nem tão veladamente nos bons tempos da tortura, da censura e do pau-de-arara.
Há gente dizendo que a própria senadora Gleisi atirou no ônibus da caravana lulista. Outro, que já defendia a castração química, agora radicaliza ainda mais. Um sargento do interior grita que quem mais radicaliza é ele. O delegado da capital garante que em termo de ultradireita com ele ninguém pode.
Uma espiral de loucura que pode até começar com um sentimento compreensível de revolta com o Partido dos Trabalhadores, mas que termina numa histeria vingativa e perigosa, muito mais cruel do que propositiva. Mas quem disse que a ideia é propor? A ideia é chegar aos cargos. Depois a gente muda o discurso, se for o caso.
Como dizia Oswald de Andrade: triste xenofobia a que acaba em macumba pra estrangeiro. Igualmente: triste o antipetismo que termina em defesa do pau-de-arara. Mas ei-lo aí. Pronto para ser eleito.
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