Antes de mais tudo: este texto não se pretende um ataque à Lava Jato, nem a seus integrantes. Analisar política, afinal, não é simplesmente achar mocinhos e vilões, erros e acertos. Por vezes, trata-se apenas de contar a história como ela aconteceu – interpretar.
Sempre se comparou a Lava Jato à italiana Mãos Limpas. O próprio Sergio Moro jamais negou que essa é a sua grande inspiração: a operação por lá teve resultados brilhantes, e exigiu coragem dos participantes. Teve quem terminasse morto. E os crimes descobertos foram de cair o queixo – exatamente como aqui.
Mas sempre que se fazia essa comparação, havia em seguida uma advertência: na Itália, a Mãos Limpas acabou exterminando os dois principais partidos políticos e abrindo brecha para que surgisse um populismo barato, com Silvio Berlusconi, que se mostrou ainda mais baixo do que o sistema político anterior.
A eleição de 2018 mostra que, também neste aspecto, a “Mãos Limpas” brasileira copiou seu modelo europeu. A política brasileira tradicional morreu. E, embora muita gente pense nisso como uma coisa boa, o resultado é bastante temerário.
Sim, PT, PSDB e MDB se locupletaram até onde puderam. Fizeram barbaridades, e era importante que pagassem por isso, como estão pagando. Mas o que os substituiu?
Tudo indica que os três maiores estados da federação serão dirigidos por gente que se orgulha de não ser político de profissão. Em São Paulo, João Doria, empresário que recusa o título de político, já levou a prefeitura há dois anos e agora é favorito para se eleger governador.
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No Rio de Janeiro, cujo capital caiu nas mãos de um bispo da Igreja Universal, o governo do estado tem tudo para ser entregue a um ex-juiz – um tipo autoritário que surfa na onda do bolsonarismo.
Fenômeno semelhante acontece em Minas Gerais, onde o Partido Novo (um partido inteiro que recusa a política!) deve fazer seu primeiro governador, um empresário igualmente bolsonarista e igualmente virgem em disputas eleitorais.
No Congresso, a maior bancada continua sendo a do PT, mas que emagreceu. A segunda, bem perto, é a do PSL, um partido que majoritariamente elegeu delegados, policiais e outros agentes de segurança – e pouquíssimos políticos de carreira.
Mas, evidente, o mais visível fenômeno é a ascensão de um capitão da reserva, um deputado de baixo clero, à Presidência – que pode se confirmar em poucos dias. Bolsonaro, um sujeito avesso à política democrática, tem tudo para ser o primeiro presidente fora dos três grandes partidos desde… Fernando Collor.
O problema não está em serem pessoas de fora da política convencional. Isso, em si, poderia até ser bom. Uma renovação. Mas não se trata de uma lufada de ar fresco, e sim de uma troca desesperada por pessoas que muitas vezes se aproveitam meramente da brecha criada e aderem a um discurso fácil contra-tudo-isso-que-está-aí.
Bolsonaro é o exemplo máximo disso. Sua única proposta parece ser “mudar tudo”. Não há base, nem consistência, nem se espera isso dele. É um antivoto, para um anticandidato, para que ele desmonte tudo que havia antes.
Mas, infelizmente, a história mostra que assim nenhum país chega muito longe. É preciso ter propostas, ser construtivo. Ter experiência democrática e participar de um projeto coletivo, e não apenas de uma aventura individual e messiânica, que jamais trouxe bons frutos a ninguém.
O Brasil, graças à corrupção dos políticos e à operação que demonstrou todos os problemas, está pronto para cair na mão de 300 Berlusconis. E quem nos salvará deles?
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