Da coluna Caixa Zero, publicada nesta quarta-feira, na Gazeta do Povo:
O professor João Féder, falecido ontem, foi conselheiro do Tribunal de Contas do Estado durante 33 anos. Ao passar para a aposentadoria compulsória, em 2000, deu entrevista dizendo que se acostumou a perder as votações no TC sempre pelo mesmo placar: seis a um. Era seu jeito discreto de dizer que, ao contrário dele, os colegas não votavam tecnicamente, mas por outros motivos. Como se vê, há problemas que vêm de longe.
O relatório do ministro Francisco Falcão apresentado ontem ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) fala rapidamente do TC. E a citação tem justamente o propósito de questionar a independência dos conselheiros que vigiam as contas alheias. Falcão relatou todas as suspeitas que pesam contra Clayton Camargo, ex-presidente do Tribunal de Justiça do Paraná. Se vai haver condenação, não se sabe. O que se sabe é que o CNJ considerou as acusações graves o suficiente para tirá-lo do cargo.
A maior parte das suspeitas tem a ver com o patrimônio de Clayton Camargo. Mas uma delas tem relação com os três Poderes do Paraná. É a suspeita de que o TJ e o governo do estado teriam atuado de maneira ilícita, junto com a Assembleia Legislativa, em um acordo que tinha duas partes. De um lado, o governo garantia que seus aliados elegeriam Fabio Camargo, filho do presidente do Judiciário, para o TC. De outro, o TJ aprovaria um projeto que poria fim à penúria financeira do governo Beto Richa.
O relatório de Francisco Falcão, embora não tenha decidido sobre o caso, reproduz um trecho do texto da Procuradoria da República. “Um projeto de lei que autoriza o repasse para o caixa do Executivo de 30% dos depósitos judiciais de posse do TJ/PR, de autoria conjunta do Judiciário paranaense e do governo, foi aprovado pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça no mesmo dia em que o ex-deputado estadual Fabio Camargo, filho do Presidente do Tribunal de Justiça, Clayton Camargo, tomou posse como conselheiro do Tribunal de Contas do Estado”.
Falcão não fecha a conta, mas diz que “existe a suspeita de que o Desembargador Clayton Camargo, pai de Fabio Camargo, agiu para beneficiar o filho na eleição para o TCE-PR, tudo a ensejar a prática do delito de tráfico de influência pelo Presidente do TJ/PR”. O caso está no Superior tribunal de Justiça e nas mãos da ministra Eliana Calmon. Aquela famosa por dizer que no Brasil há “bandidos de toga”.
É quase todo o Centro Cívico sob suspeita. Quatro instituições com sede na Praça Nossa Senhora da Salete podem ser afetadas. O TJ, que já teve seu presidente afastado. O Tribunal de Contas, que tem um conselheiro cuja eleição é questionada. O governo do estado, que supostamente teria oferecido vantagens à família Camargo em troca de dinheiro para o caixa. E a Assembleia Legislativa, que pode ter eleito um conselheiro por motivos espúrios.
Todos negam o esquema, claro. E muita água vai passar debaixo da ponte antes que haja um julgamento. Sem contar com a possibilidade de embargos infringentes. Mas é sempre bom saber que hoje, com o CNJ, há alguém investigando tudo isso. Tempos atrás, seria apenas mais uma suspeita jogada para debaixo do tapete.