Da coluna Caixa Zero, publicada hoje, na Gazeta do Povo: Ano novo, vida nova. É o que dizem sempre a cada janeiro. Sempre desejamos o melhor e acreditamos que tudo será diferente no ano que começa. E, às vezes, é mesmo. Na nossa vida particular, principalmente, vale a pena o esforço e a crença de que tudo vai melhorar. Mas aí a gente olha em volta e vê que, em alguns lugares, nada muda. E tudo volta a ser o que sempre foi.
Neste janeiro, por exemplo, já vimos alguns dos nossos mais antigos problemas se repetirem. A penitenciária de Piraquara teve uma rebelião. Numa cadeia velhíssima e, ao que tudo indica, terrivelmente mal cuidada, conseguiram não só dominar o presídio como destruir todas as portas das celas. Morreram seis. Já vimos esse filme. Por quanto tempo continuaremos vendo?
A rebelião mostrou outros problemas clássicos do sistema penitenciário do estado. Superlotação, presos com acesso a telefones celulares, infiltração do crime organizado nas cadeias (que o governo até hoje negava existir). Nas delegacias, uma vistoria feita pelo sindicato dos policiais mostrou mais uma vez o que já sabíamos: até 150 presos para um policial que, ao invés de ir às ruas investigar, fica preso à função de carcereiro.
Nas ruas, também vimos mais do mesmo. As cidades alagam a cada chuva, sempre nos mesmos pontos. Em Curitiba, os bueiros sujos, a falta de manutenção, as casas que a prefeitura sempre promete tirar da beira dos rios, mas que continuam lá – tudo favorece os alagamentos. E, desde 2004, o pedido do Ministério Público para que sejam tomadas providências continua numa gaveta qualquer esperando que alguém se lembre dele. Nem isso muda.
Quem saiu da capital para ir às praias de novo encontrou os mesmos problemas. Faltou até luz, para o deleite do governador, que fez piadinha dizendo que os veranistas deveriam “curtir a escuridão com mais alegria”. Aliás, nem as piadinhas do governador mudaram com o ano novo. Nem as suas obsessões. Nos últimos dias, em seu novo brinquedo, o Twitter, decidiu mais uma vez colocar a culpa de tudo na imprensa – até a manifestação popular que enfrentou em Londrina foi “armação da imprensa local”.
É preciso ter paciência para começar o ano já sabendo tudo o que nossos governantes vão fazer e dizer. É preciso ter muita paciência para saber que além de tudo é ano eleitoral e teremos de aguentar as mesmas mentiras, os mesmos ataques pessoais, as mesmas vociferações contra a imprensa e contra as pesquisas durante vários e preciosos meses de nossas vidas. E tudo isso para, ao fim e ao cabo, escolhermos entre os mesmos que já nos governam há tanto tempo.
Nietzsche, o filósofo bávaro que ficou conhecido por dizer coisas que nós temos medo até mesmo de pensar, tinha uma ideia que o apavorava. Era o “eterno retorno”. Era o medo de que tudo se repetisse infinitamente (e inutilmente) sem nunca acabar, sem nunca mudar. Se tivéssemos de viver nossas vidas infinitas vezes, sem poder mudar nem um pedacinho delas, não ficaríamos exatamente muito felizes.
Por sorte, nossas vidas não são assim. Podemos mudá-las. O duro é que a parte que não depende da gente, que depende dos poderosos de plantão, às vezes lembra demais o pesadelo de Nietzsche. Torçamos para que o retorno, em todo caso, não seja eterno.