É provável que Alexandre Bley, agora ex-presidente do Conselho Regional de Medicina (CRM) do Paraná venha a ser execrado por muita gente. Bley renunciou dizendo que não poderia assinar os registros dos profissionais estrangeiros que o governo federal está trazendo para o país. Não concorda com o sistema e com o fato de eles virem sem fazer o exame de revalidação que ele considera justo.
Como outros médicos já se comportaram de forma estúpida, inclusive xingando cubanos que vieram ao Brasil e os chamando de escravos, todo médico que agora se opõe ao programa do governo federal corre o risco de ser chamado de racista ou coisa parecida. Em alguns casos, faz sentido. Em outros, não. Bley pode estar agindo pelos motivos errados. Mas o discurso dele tem coerência e merece ser ouvido.
Os médicos formam uma aristocracia no país. Têm um poder que não é compatível com a democracia: barram novos cursos, fazem uma reserva absurda de mercado para eles mesmos e se comportam como se não houvesse um grave problema de saúde pública a ser resolvido. Se negam, em geral, a admitir que há falta de médicos em boa parte do país. Negam o óbvio.
Mas isso não tira o direito de qualquer pessoa de contestar as ações do governo. Ainda mais quando realmente parece que elas carecem de legitimidade e de bom senso. Os profissionais de fora estão sendo trazidos na base do pegar ou pegar. Mal são testados, como se o simples fato de haver medicina boa em Cuba garantisse a qualidade de absolutamente todos os profissionais de lá. Por essa lógica, todos os russos seriam bons ginastas e todos os brasileiros saberiam jogar futebol.
Bley pode estar errado. Mas qualquer democracia decente deve dar aos seus cidadãos o direito de contestar. Neste caso, nem se trata de desobediência civil: ele poderia, mesmo no cargo, se negar alegando que considera a lei errada. Mas fez menos, se afastou. Quem discordar dele que se manifeste. Ele fez o mesmo. E tem direito.