A invasão do prédio central da UFPR precisa ser encarada como aquilo que realmente é: como um sintoma, mais um de tantos que apareceram nos últimos tempos. É como uma febre e tratá-la isoladamente não resolverá a situação que a criou.
A tomada do prédio da Santos Andrade é uma decorrência das tensões do país, de uma divisão que está latente e sempre prestes a explodir pelo menos desde 2013 – talvez desde antes, da primeira eleição de Dilma Rousseff.
Ao longo do tempo, essas tensões foram se agravando. Os protestos de pauta difusa em 2013 mostravam um descontentamento meio sem rumo. Sabia-se que se queria mudar algo. Mas cada um queria mudar para um lado. Esquerda e direita lutaram palmo a palmo para dar suas versões sobre aquele verdadeiro teste de Rorschach.
A eleição de Dilma colocou as coisas de modo mais claro. Com a permanência do PT no poder e as denúncias graves de corrupção no governo, os protestos recomeçaram, mas dessa vez com vetor bem mais claro. Quem foi às ruas foi se pronunciar contra o PT e a favor do impeachment.
Os protestos foram apoiados por setores que sempre foram contra o petismo mas que até então não pareciam se ver em condições de tirá-lo do poder, a não ser por eleições (e nas eleições, as repetidas tentativas vinham fracassando uma após a outra). Basta ver a Fiesp com seus patos amarelos.
Mas havia também uma base popular nos protestos, ainda que esse “popular” precise ser matizado pelo fato de não serem em geral as classes operárias quem protestava contra Dilma e o petismo.
De todo modo, comandado por Cunha e Temer, o processo de fato levou Dilma para fora dos palácios. E um projeto totalmente diferente de governo (diferente inclusive, e principalmente, daquele em que as pessoas haviam votado) tomou o poder. Elegeu-se a esquerda, assumiu a direita.
E a pauta do novo governo começou a incomodar o outro lado daqueles protestos de 2013. O lado que tinha ido às ruas por uma política mais à esquerda do que o PT oferecia. Mais previdência. Mais Estado de bem-estar social. Mais políticas afirmativas. Mais assistência social.
Esse pessoal, derrotado com o impeachment, não quer se deixar ser derrotado por Temer. E ao ver a pauta de conversão à austeridade e a reforma do ensino médio pôs-se de novo na jogada. Primeiro, aos poucos, com estudantes tomando prédios aqui e acolá. Agora, com mais força.
Mais força em todos os sentidos. Por mais que a esquerda e os próprios ocupantes do prédio neguem, houve sim mais violência na tomada da Santos Andrade do que nas demais ocupações. Até porque agora não são mais secundaristas, e sim a Antifa que está por trás disso. Outros métodos. Novas tensões.
Mas se por um lado essas ocupações todas mostram força de reação contra Temer, há também a contrarreação. E cada vez mais se veem protestos contra os protestos. E são protestos tão legítimos quanto a tomada dos prédios públicos. Ação e reação. Direita e esquerda? Talvez.
Assim como o movimento que foi às ruas em 2015 queria conscientizar a população contra os erros do governo Dilma, a pauta das ocupações, que começou sendo um ato contra a MP do ensino médio, não pode mais ser vista apenas como um ato isolado.
É parte do processo de divisão e insatisfação coletiva que tem levado cada vez mais à radicalização dos dois lados.
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