O governo Temer quer exigir que todo trabalhador complete 65 anos antes de se aposentar. Há dois argumentos principais para se colocar uma idade mínima para a aposentadoria no Brasil. Um deles é o aumento da expectativa etária no país. O outro é que a Previdência está ficando cada vez mais cara, tirando supostamente recursos de outras áreas.
Que a Previdência tem problemas é fato. Até recentemente, os dados mostram que a Seguridade (mais ampla do que o sistema de aposentadorias) continua superavitária. Em 2014, por exemplo a associação dos auditores da Receita Federal comparou as receitas da seguridade e as despesas. O resultado foi que sobraram R$ 54 bilhões.
Essas contas tendem a se deteriorar, até porque efetivamente a população está envelhecendo. O “rombo” da Previdência, porém, é normalmente inflado pelo governo, que conta desvinculações de receitas como prejuízo – o que não faz o menor sentido.
O envelhecimento da população é o outro argumento. Diz-se por exemplo que nos países ricos (a OCDE) a maior parte dos países já tem média de aposentadoria aos 64,2 anos. Enquanto isso, no Brasil, a média de idade ao se aposentar está em cerca de 58 anos. Na comparação, estamos nos aposentando cedo demais.
Recentemente, um presidente da República já falou da aposentadoria “precoce” dando a entender que quem se aposentava cedo demais era “vagabundo”. Foi Fernando Henrique, na época da última reforma previdenciária do país. Mas será que o brasileiro é vagabundo?
Evidente que não. A comparação com a OCDE, por exemplo, é cruel. Dificilmente alguém na Noruega, na Suécia ou no Japão começa a trabalhar com a idade que os meninos e meninas de regiões pobres brasileiras começam. Dificilmente fazem os mesmos trabalhos pesados.
Comparar o Brasil com a OCDE é comparar gente que começa a lavar vidro de carros nas esquinas ou a trabalhar em carvoarias aos 10 anos, parando de estudar assim que aprende a ler, com alemães que só começam a trabalhar depois de formados na universidade.
Mas há um dado ainda mais cruel. Na maior parte dos países ricos, a expectativa de vida média da população é de cerca de 80 anos. Em várias regiões do Brasil, ela fica pouco acima dos 65 anos desejados por Temer.
Segundo dados do Atlas de Desenvolvimento Humano, da ONU, há lugares no Brasil com expectativa de vida de 65,3 anos. Como Cacimbas, na Paraíba, ou Roteiro, em Alagoas. Seria tempo suficiente apenas para fazer o processo no ISS. Ou nem isso.
E isso não se restringe apenas a zonas pobres do Nordeste. Na região de Curitiba, por exemplo, há áreas com expectativa de vida pouco acima disso. Na Vila Grécia, em Almirante Tamandaré, eram 67,5 anos de expectativa de vida em 2010.
A imposição de uma idade mínima torna quase impossível a aposentadoria para quem começa mais cedo, trabalha mais duro e, sejamos cruéis, morre mais cedo. Quem se aposentará são os que começam a trabalhar mais tarde e vivem mais. Os mais ricos. Aos pobres, restará trabalhar até morrer. Simples assim.
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