Da coluna Caixa Zero, publicada nesta quarta-feira, na Gazeta do Povo:
Qual é a melhor situação do mundo para se negociar algo? Fácil. Você tem algo de que alguém precisa e que, pelo menos no curto prazo, só você pode oferecer. Se for algo realmente necessário, você pode cobrar o que quiser e, mesmo assim, vai fechar negócio. Uma barraquinha de água gelada no meio deserto é o exemplo ideal.
Monopólios são perversos justamente por isso. E uma das grandes vantagens de não estarmos na antiga União Soviética é o fato de você poder escolher de quem vai comprar algo. Havendo mais de um vendedor, provavelmente sua atenção será disputada e o preço tenderá a ser mais justo. (Um amigo que saiu da antiga Iugoslávia dizia que os restaurantes do Brasil o deixavam confuso porque na Croácia ele só precisava ia “ao restaurante” e pedir “o almoço”. Nada de escolhas.)
A greve desta semana mostra mais uma vez que os monopólios são parte do nosso dia a dia. E que lidar com eles pode ser de arrancar os cabelos. Os empresários do sistema de transporte coletivo estão exatamente na situação que lhes convém. São donos de todos os ônibus da cidade. Sem eles, não existe transporte coletivo na cidade. As regras impedem que eles parem de operar, mas nada impede que eles deixem os trabalhadores sem salário – sabendo que imediatamente isso levará a uma greve.
Alguém pode dizer que não se trata de monopólio. Há dois argumentos para isso. Primeiro, houve licitação –e outras empresas poderiam ter concorrido. Segundo, são várias empresas, em três consórcios, e não apenas um fornecedor. Mas não é bem assim: na malfadada (e malfeita) licitação de 2010 não apareceu nenhuma outra empresa para concorrer com os donos do negócio. Foram montados três consórcios que na verdade pertencem majoritariamente a uma mesma família, os Gulin – eles estão presentes em metade das empresas e em todos os três consórcios.
Na nova greve os empresários voltaram a falar em devolver a concessão para a prefeitura, alegando que o contrato não é respeitado e que não estão tendo lucro. Não há provas de que haja prejuízo, até porque não há transparência da porta para dentro das empresas. Mesmo que houvesse, a devolução das concessões teria duas consequências: a indenização pelo rompimento do contrato, em primeiro lugar; e a contratação das mesmas empresas para fazer o mesmo serviço em caráter emergencial.
O próprio prefeito Gustavo Fruet já admitiu em entrevistas. Não há mais ninguém para fazer o serviço. Pelo menos não a curto prazo. O plano de Fruet para resolver o problema só funciona no longo prazo e inclui criar modais alternativos, como o metrô, que coloquem novas empresas no jogo. Uma sombra, que seja, para expulsar o fantasma do monopólio. Mas e por enquanto? Parece que só resta achar um meio de convivência que seja viável e que não cobre tão caro (em vários sentidos) da população.
Dar transparência ao que é feito com o dinheiro das empresas é o primeiro passo. Uma negociação franca e permanente envolvendo um conselho de usuários pode ser mais um passo. Criar algum tipo de concorrência, com lotações, por exemplo, ou com uma frota do município, como já se tentou nos anos 80, talvez ajudasse. Mas solução mesmo de curto prazo não há. O monopólio, em Curitiba, mais uma vez está vencendo.
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