Dez da manhã. Na frente da Câmara de Curitiba, uma pequena multidão de sindicalistas e servidores públicos protesta contra o pacotaço de ajuste fiscal do prefeito Rafael Greca. Eles não podem entrar no prédio. A prefeitura e a Câmara – que como sempre vota fechada com o prefeito, seja ele quem for – decidiram restringir ao máximo a entrada da população. E conseguiram.
Com laudos na mão, provaram (pelo menos do ponto de vista deles), que se entrassem mais de 80 pessoas haveria problemas de segurança. Claro que haveria: para eles. Os vereadores estavam votando praticamente sem discutir com a população, em regime de urgência, uma série de projetos que retiram benefícios dos servidores, tiram dinheiro da aposentadoria, aumentam a cobrança no salário etc. Evidente que quanto menos gente vendo isso, melhor.
Barrados, os servidores decidiram fazer tudo o que podiam para atrapalhar a sessão. Impediram a entrada de vereadores (mas só dos que eram a favor do pacote). Botaram um gigantesco caminhão de som na Barão do Rio Branco que, literalmente, bloqueava meia rua. E numa janela de vidro ao lado do plenário, botaram dois batuqueiros que, sem a menor noção de ritmo, maltratavam uma zabumba e uma caixa para atazanar quem estava do outro lado.
Do lado de fora, o boato era de que os vereadores favoráveis ao projeto tentariam uma solução Mandrake para fazer a votação do pacotaço de qualquer jeito. Com os servidores da Câmara em greve e passando para o lado de fora, eles pretenderiam usar seus comissionados para fazer a ata e tocar em frente o tratoraço. Foi quando este repórter, que estava do lado de fora, decidiu tentar entrar para ver se isso ia mesmo acontecer.
Imprensa barrada
Impedidos de entrar, porém, os servidores decidiram fazer o mesmo. Na escadaria que dá acesso à entrada principal nem havia como passar. O portão estava fechado e havia camadas de servidores protestando. Há pelo menos mais três entradas. O estacionamento estava fechado. Sobravam as portas dos anexos.
Da porta do Anexo 2, na Visconde de Guarapuava, já quase na Travessa da Lapa, não havia bloqueio de servidores. Os sindicalistas estavam parados ali, mas só o que impedia a entrada eram as grades e a fechadura. Liguei para o chefe da Comunicação. “Não tem bloqueio de servidores? Deixa que eu vou tentar abrir, então.”
No entanto, assim que os servidores souberam que a porta ia abrir por um segundo para alguém entrar, começaram a gritar: “Se ele entrar, entra todo mundo”; e “Pessoal, vamos chegar mais perto que nós vamos invadir se abrirem aqui”. Uma senhora, vendo o tumulto que estava prestes a acontecer, sussurra ao repórter que a entrada do outro anexo pode ser uma melhor ideia.
Mas assim que se aproxima pelo outro lado, na Eufrásio Correia, os servidores, que estavam um tanto dispersos, obedecem ao comando de uma mulher que grita: “Opa! Opa! Aqui ninguém entra!” Mostro a credencial de imprensa. Tento explicar que quero fiscalizar a possível sessão secreta. “Não, já temos nosso pessoal lá dentro.” Nada feito, nem conversa, só gritaria e aplausos quando me afasto.
Mais longe um pouco, digo a um dirigente sindical que eles não podem cercear o trabalho da imprensa. Que estão sendo tão autoritários quanto o prefeito e o presidente da Câmara. Ele ameaça contar aos colegas, à multidão. Digo que tudo bem. “Vai ficar bonito pra vocês me tirarem à força daqui.” Ele desiste. Dizem que devo procurar os vereadores que são contra o projeto. A maioria está no caminhão de som.
Noêmia
Vou até lá. Encontro a vereadora Noêmia e explico a situação. A imprensa está sendo barrada. A vereadora diz que isso é um absurdo e resolve interceder. Junto comigo vai o repórter Narley Resende, da rádio BandNews FM. No caminho, a vereadora é aplaudida. Como estou com ela, um grupo de pessoas até pede para tirar uma foto comigo. Digo que não é o caso. A vereadora insiste. Se for o preço para passar na porta, que seja. Estranho, mas vá lá.
Caminhamos até o mesmo lugar em que fui barrado da primeira vez. E agora, mesmo com a vereadora que vota com os sindicalistas, a hostilidade permanece. “Opa! Opa!” “Noemia, você entra, eles não.” A vereadora tenta conversar. Não há conversa. A imprensa, eles explicam, é inimiga da causa.
Começa um bate-boca. Digo que eles estão sendo autoritários, que o prédio é público. Eles dizem que não estou lá para ajudar. Digo que é verdade, não estou mesmo. Estou lá para relatar. O tom só sobe. Gritos de guerra. O sujeito que finge negociar comigo é o mesmo que pouco antes me disse: “Ok, você quer entrar? Passa lá.” E aponta para fileiras de gente com cara de que não vai deixar ninguém nem chegar perto. “Você está me ameaçando?” “Imagina, quer entrar? Passa ali por eles”, ele diz.
Não passei. Só quem passa, afinal, são os favoráveis à causa. E esses, é claro, serão barrados pelos vereadores, que não querem ninguém fiscalizando sua estranha relação com o prefeito.
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