Chico Marés, interino

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Quando nossos ilustríssimos fazem alguma lambança, como contratar a sogra de chefe de gabinete ou dobrar o próprio salário com uma canetada, sempre aparece alguém para comentar sobre a necessidade de importarmos políticos suecos. Não é – obviamente – um pedido sério; se trata apenas de uma crítica aos hábitos de nossos representantes. É reconfortante saber que em algum lugar do mundo o Eduardo Cunha não tem vez. Entretanto, volta e meia alguns governantes resolvem “levar a sério” e importam algumas poucas políticas suecas. E aí, a resposta é sempre a mesma: muita chiadeira.

Estes dias voltava do trabalho e ouvi uma reportagem no rádio sobre a cobrança de taxa para uso de sacolas plásticas em São Paulo. Quase todos os consumidores entrevistados falavam do absurdo de pagar por algo que antes era de graça.

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Na Dinamarca – que não é bem Suécia, mas é quase lá – essa prática já é comum desde 2003, por um motivo bem simples: sacolas plásticas são um desastre ambiental. Gasta-se muito petróleo para produzi-las. Elas demoram milênios para se desintegrar quando viram lixo. É um dos materiais mais poluentes do mundo, e, por isso, faz sentido desestimular o uso. Mas o cidadão brasileiro não parece estar disposto a sacrificar esse conforto mínimo do cotidiano.

Outra bronca permanente são as ciclovias. Moradores do Bigorrilho chegaram a fazer um abaixo-assinado para tentar impedir a criação de uma via calma na Padre Anchieta – antes mesmo que a prefeitura de Curitiba apresentasse um projeto!

A via calma é uma resposta bastante tímida da prefeitura à necessidade de se incentivar o uso de bicicletas. Ainda assim, é um passinho na direção certa. Todas as cidades do mundo desenvolvido, hoje, buscam alternativas para o carro. Entretanto, em Curitiba, mesmo a medida mais modesta é vista com maus olhos.

Por fim, há a nossa eficaz solução contra o crime, que consiste basicamente em criminalizar tudo e todos e jogar mais policiais na rua, quanto mais treinados para o combate e menos preocupados com essas bobagens de direitos humanos, melhor. Não sei o que chocaria mais um político sueco: nosso discurso sobre o combate ao crime, nossa prática ou nossas estatísticas.

A Suécia inteira tem uma média de cem assassinatos por ano – o equivalente a um mês tranquilo no município de Curitiba. E, por mais abominável que seja o crime cometido, o direito a defesa e a condições decentes de encarceramento não são desrespeitados. Tortura, violência policial, quando ocorrem, são motivo de escândalo nacional. É claro, há outros motivos que explicam a diferença nas estatísticas, mas é fato que nenhuma sociedade conseguiu resolver seu problema de segurança na base da porrada.

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Em uma democracia, os políticos nunca vão ser melhores – ou muito piores – que seus representados. Eles acabam sendo um retrato razoavelmente preciso da sociedade em que vivem. E se os políticos suecos não têm mamatas, vivem com um salário meio mixuruca e não precisam de cinquenta cargos na prefeitura para acomodar o staff de campanha, é porque a sociedade sueca aprendeu a fazer alguns sacrifícios individuais para que todos vivam melhor.

Fico imaginando se um dia resolvêssemos importar o sr. Larsen e a sra. Andersen – vale lembrar, quase metade dos deputados suecos são mulheres – para tomar conta do Congresso. Meu palpite é que, minutos depois de proibirem sacolas plásticas, encherem as cidades de ciclovias e mandarem a PM parar de distribuir o cassetete na perifa, o povo já estaria nas ruas clamando pela volta de Renan Calheiros.

E eles sairiam de bom grado. Se a capital ainda fosse o Rio, dava para aguentar a pressão. Mas na secura de Brasília, o sr. Larsen e a sra. Andersen já estariam loucos para voltar para o hotel tomar uma caipirinha nos primeiros dez minutos de discurso do Heráclito Fortes.