Luis Fernando Verissimo escreveu dia desses que estamos todos, ainda, vivendo um pós-escrito de 1945. É verdade. Às vezes tem-se a impressão de que tudo que acontece de realmente relevante nos Estados Unidos e na Europa, puxando bem puxadinho o fio, vai dar na Segunda Guerra Mundial.
No Brasil, acho que também vivemos um pós-escrito, mas de outra data. De 1964. Nossa política atual, ao fim e ao cabo, ainda discute o que aconteceu na data em que os militares acharam que tinham o direito de tomar o país para si.
O atual presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, tem sua origem na ditadura militar. Como líder sindical, apareceu ao enfrentar o regime. Não pedindo mudanças em Brasília. Mas pedindo direitos trabalhistas para os operários.
Os dois principais candidatos a ocupar sua cadeira a partir de 2011 também surgiram para a vida política no mesmo período. Serra, como presidente da UNE, discursou em comícios com Jango (elogiando e criticando presidente que logo seria derrubado).
Dado o golpe, acabou indo para o exílio. Voltou e ajudou na redemocratização do país. Foi constituinte. Fundou o PSDB. E rumou com seu partido para a centro-direita.
Dilma aparece na vida política do país ligada a movimentos de combate à ditadura militar. Participa de organizações “subversivas”, não se sabe até hoje exatamente em que papel. Acaba presa, torturada e liberada três anos depois.
Na democracia, participa de governos em cargos administrativos, entra primeiro no PDT, depois no PT. E segue na esquerdam até hoje.
Mas não são apenas os personagens. O clima às vezes também lembra que estamos ainda no pós-64.
As acusações contra Dilma de que quer radicalizar não são, grosso modo, do mesmo tipo das que pesavam contra João Goulart?
Por outro lado, as críticas ao suposto conservadorismo de Serra e sua trupe não são do mesmo tipo das que se faziam à UDN de 1963?
O país mudou, obviamente. E para melhor. Economicamente, o Brasil é melhor hoje do que em qualquer época pré-dutadura ou do que em qualquer fase do regime militar (considereando que o “milagre” nada mais era do que uma bolha que nos levou à hiperinflação).
Milhões de brasileiros que votam hoje nem sequer viveram um dia sob a ditadura. Só quem tem 49 anos ou mais chegou à maioridade antes da Lei da Anistia.
E, ainda assim, vivemos sempre à sombra de 1964.
Nos estados, e mesdmo na política nacional, começam a aparecer lideranças que, na casa dos 40 anos, começam a pensar o país sem o viés da ditadura. Gente que aprendeu a fazer política na democracia e que, graças a Deus, só sabe fazer as coisas nesse regime.
Em breve, serão esses os políticos a governar o país.
O que me pergunto, no entanto, é se os atuais líderes (e aqui contam não só os políticos, mas também a imprensa e a sociedade) terão a sabedoria de discutir cada vez mais o aperfeiçoamento da democracia e se serão capazes de deixar de lado os rancores mesquinhos que guardam de parte a parte.
Ou, trocando por outras palavras, o que se teme é que os políticos da atual geração se limitem a ser sombras do passado em que viveram e transmitam o ódio ao adversário para as próximas gerações.
Em certa medida isso já acontece. Estão aí os Índios para demonstrá-lo em frente à nação.
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