Imagine que você contrata uma pessoa para fazer uma obra em casa. O sujeito começa a fazer o serviço mas você não está gostando por dois motivos: está saindo caro e mais lento do que você gostaria. Você vê que vai ficar difícil pagar e decide chamar um outro sujeito, uma segunda opinião.
O segundo pedreiro chega, dá uma olhada no que está sendo feito e diz que aquilo ali é bico. Não tem porque demorar tanto nem sair tão caro. “Já fiz esse mesmo tipo de serviço, é moleza. Se tá difícil pra esse cara, deixa que eu faço.” Todo empolgado, você troca um pelo outro.
Logo que chega para trabalhar, porém, o sujeito novo diz que não era bem assim. Que o material subiu, que ele não sabia que o antecessor tinha feito uma gambiarra e que só agora ele viu que vai sair mais caro e, veja bem, se não tiver de onde tirar mais dinheiro acaba que não vai ter como fazer é nada.
A metáfora é tão evidente que nem se precisaria dizer que o segundo sujeito é o prefeito Rafael Greca, que agora paga por ter a língua comprida demais e por ter contado vantagem antes da hora. O que ele fez é o que popularmente se chama de “estelionato eleitoral”.
Qualquer um que conhecesse a realidade da cidade em 2016 sabia que Greca estava inventando muita moda para pouco dinheiro. Tudo ele dizia que faria. As unidades de saúde: inauguraria. O problema das creches: resolvido. Asfalto? Quatrocentos quilômetros por ano. Faltou dizer que cada mendigo viraria um milionário. Mas chegou a falar em escada rolante em praça pública para levar as velhinhas de uma a outra avenida do Bigorrilho.
Quem tem memória lembra: a segunda hora da sabatina do candidato na Gazeta do Povo foi dedicada insistentemente à mesma pergunta: “Candidato, mas de onde haverá dinheiro para isso?” E Greca se irritava, tirava sarro dos entrevistadores que estariam boicotando sua possibilidade de traçar planos mirabolantes para Curitiba.
A quem fazia perguntas com o pé no chão ele reservava epítetos como “gente aziaga”, “mau-humorados e deprimidos”, “barbudinhos perversos”. Este repórter virou “Lobo Mau”. E todos estavam alertando apenas para o óbvio: as promessas eram superlativas num orçamento que não aceitava sequer diminutivos.
Agora, Greca teve de admitir que o buraco era bem mais embaixo. Não admite que mentiu. Mas, falando em português claro, foi isso. Mentiu. Aos servidores, prometeu que manteria seus planos de carreira. Mentiu. Agora “suspendeu” tudo por tempo indefinido. Prometeu valorização aos “colegas” de prefeitura; e agora arrocha-os; aos que protestam, chama de milícias fascistas. Não eram colegas?
Rafael Greca parece inapropriado para uma discussão sobre política e governo no século 21. Na campanha, esqueceu que há câmeras em toda parte (ao contrário do que ocorria em 1992). A cada passo, dizia uma bobagem (“Vomitei com o cheiro de um pobre!”) e depois tinha que sair correndo pedir desculpas. Falou de tudo sobre Richa nas redes sociais e depois pediu arrego ao governador como seu novo padrinho político (esquecendo que a internet tem memória). Criticou a não mais poder o 29 de abril e agora repetiu tudo a seu modo.
Greca governou sem internet, sem Lei de Responsabilidade Fiscal, sem plateia virtual. Agora, descobre que o mundo mudou. E se atrapalha como hipopótamo em loja de cristais. Quer aprovar tudo com uma Câmara submissa como sempre teve, mas percebe que agora a população não aceita mais tudo passivamente. Revoltado contra a conspiração antes aceita pacificamente, grita em público e só piora a situação.
Em seis meses, o prefeito nada fez além de desmentir o passeio que prometeu nos seis meses anteriores. E não há qualquer motivo para achar que a grana que vai tirar da previdência lhe permitirá fazer metade do que prometeu. Ou alguém ainda acredita em faculdade pública para servidores; em escada rolante no Bigorrilho; em trenzinho intershoppings; em redução de impostos; em passe livre para estudantes? E em tudo isso junto?
Por enquanto, se tivermos remédio no postinho e funcionários sem apanhar já será algo.
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