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No caso José de Abreu, que virou mais um símbolo dos dias de intolerância em que vivemos, o ator diz ter sido acusado, entre outras coisas, de receber dinheiro da Lei Rouanet e desviar para comprar bens pessoais. Ou, mais especificamente: a mulher dele estaria usando uma bolsa comprada pela Lei Rouanet.

Tem sido comum a acusação: se o sujeito recebe dinheiro da Lei Rouanet, é suspeito; se consegue financiamento e ainda por cima se declara favorável ao governo, está sendo comprado. O cálculo é de que a ideologia se forma de acordo com o dinheiro recebido; ou, às vezes, de que o sujeito só consegue o patrocínio por ser petista.

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A Lei Rouanet tem 25 anos (a completar, aliás, em dezembro deste ano). Foi formulada por Sérgio Paulo Rouanet e sancionada pelo então presidente Collor – aparentemente para favorecer o petismo que Collor derrotara em 1989. Desde então, financiou milhares de discos, peças de teatro, filmes (inclusive da Globo Filmes, essa perigosa instituição gramsciana), livros etc.

As leis de incentivo à cultura têm sido responsáveis em grande medida pela existência de um padrão mínimo de cultura no país. Sem ela, muito do que hoje podemos ler e ver de cultura nacional não existiria. Mas em nome de uma disputa política momentânea, há gente disposta a classificar tudo isso como um mero processo de compra de consciências e de desvios de  verbas.

Como tudo que envolve dinheiro, a Rouanet certamente foi usada para desvios. Investigue-se e puna-se. Mas nem parece que é isso que esteja em jogo aqui. O que parece haver é um desprezo pela ideia de cultura, um anti-intelectualismo que caracteriza movimentos totalitários.

Artistas, nessa ótica, são vagabundos. São pseudointelectuais. São gente que não trabalha de verdade. Gente que ganha dinheiro fácil do governo para projetos ridículos. Gente que merece ser criticada pela sua própria condição profissional.

Uma das funções da arte é ser crítica em relação à sociedade. Quanto mais livres seus artistas, mais democrática é uma nação. E o ideal, claro, seria que a cultura se autofinanciasse, até para não ficar dependente de governos e de empresários (os grandes gestores da cultura nacional, que podem negar ou garantir um projeto com uma simples canetada).

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A discussão sobre o autofinanciamento da cultura é lícita e necessária. Mas não é disso que se trata. Incomodada com o fato de grande parte dos intelectuais e artistas do país se posicionar à esquerda e, em muitos casos, defender o PT, prefere-se colocar um rótulo de pelego em todos. Quando por décadas todos estiveram contra o governo (militar e civil), arcando com os custos disso.

Acusar todo mundo que defende um partido ou uma ideologia de pilantra pode ser vantajoso na guerra política. Mas é extremamente prejudicial ao país.

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