A vitória de Trump significa muitas coisas. Mas a que mais assusta é a derrota da ideia de que devemos ser tolerantes com o diferente. Uma ideia que vem sendo construída, dolorosamente, lentamente, desde a Reforma.
Nos últimos 500 anos, a humanidade (a Europa primeiro) teve de aprender que as pessoas têm ideias diferentes do que seja uma boa vida. E a melhor solução encontrada foi a da tolerância política. Ou seja: o governo não se mete no tipo de vida que você quer levar. Nada de tentar decidir tua religião e nem teus costumes.
À ideia de que o Estado deve ser laico seguiu-se a de que deve ser “neutro” em relação a qualquer projeto mais geral que deva ser “imposto” aos outros. Isso levou a uma espécie de “revolução liberal”.
No mundo liberal (liberalismo político, não econômico) você pode ser o que quiser, desde que deixe os outros serem o que quiserem. Gay? Sem problemas. Muçulmano? E daí? Ninguém tem nada a ver com tua vida pessoal, desde que você seja respeitoso, pague os impostos etc.
Isso levou a várias ideias modernas para o tipo de vida que temos hoje. Multiculturalismo, por exemplo. Pluralidade. Reconhecimento. Até a ideia do politicamente correto – a ideia de que não é desejável tratarmos os outros com desdém por serem diferentes de nós.
Mas isso tudo, aparentemente, gera revolta. Em vários países de primeiro mundo, a tolerância com o estrangeiro (visto com o alguém que vem de lugares mais pobres para roubar empregos) é vista como fraqueza. A tolerância religiosa passou a ser vista como conivência com o fundamentalismo. E o politicamente correto é atacado como se tornasse o mundo mais chato.
O apelo de populistas como Trump, Le Pen e outros é justamente esse – o de dar vazão àqueles que não têm mais paciência com a tolerância, com a ideia de que o outro deve ter tantos direitos quanto você – com a ideia, em última instância, de que todos devemos ser respeitados como iguais.
Trump é a vitória da intolerância. A vitória do muro sobre a ponte. Do degredo sobre a inclusão. Do eu sobre o outro. Do mais forte contra o mais fraco. Do centro sobre a periferia. Do egoísmo sobre a solidariedade. Do medo sobre a esperança. É a derrota do frágil mundo de direitos humanos e a vitória de quem deles escarnece.
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