Criminosos e seu principal líder, punidos pelo trabalho saneador da Operação Lava Jato e posteriormente anistiados por aqueles que teriam o dever de proteger a sociedade, tentam construir narrativas com a finalidade de apagar os fatos, recriar a história e transformar delinquentes em modelos de virtude e exemplos de boa política.
Argumentam, armados de um cinismo cortante, que a Operação Lava Jato, “com sua sanha punitiva”, destruiu empresas, criminalizou a política e condenou inocentes. Como se não existissem confissões documentadas, provas robustas e milhões devolvidos aos cofres como resultado de acordos. Quem devolve, por óbvio, reconhece o roubo. Para essa gente, no entanto, tudo isso precisa ser apagado com a pedagogia do mestre Goebbels, nazista cruel e braço direito de Hitler: “Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade”. Mentem. Compulsivamente. Mentem com voz melíflua, sem ruborizar e mover um músculo do rosto. São exímios na arte do engodo.
Têm aliados importantes nas instituições da República. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, ao se referir à decisão que beneficiou o ex-presidente Lula, deixou claro que não significou uma absolvição, mas algo puramente formal. O crime ocorreu, sim. Trata-se do pensamento explícito do presidente da corte que, de resto, sempre manifestou uma posição de aberto apoio ao trabalho da Lava Jato no combate à corrupção. Mas uma andorinha só não faz verão. Infelizmente.
Questões formais e bastante discutíveis promoveram, na prática, a higienização da ficha suja de Lula e abriram as portas para um condenado por crime de corrupção disputar a Presidência da República
O ministro Fachin, misteriosa e surpreendentemente, tratou de ressuscitar argumentos já analisados (e rebatidos) à exaustão sobre a competência da 13ª Vara de Curitiba para julgar as ações contra Lula. Questões formais e bastante discutíveis promoveram, na prática, a higienização da ficha suja de Lula e abriram as portas para um condenado por crime de corrupção disputar a Presidência da República. Eis a verdade. O resto é retórica vazia.
Na verdade, quando o assunto é combate à corrupção, o Brasil está em queda livre. Na edição do Índice de Capacidade de Combate à Corrupção 2021, o país sofreu a maior queda entre as 15 nações da América Latina analisadas. “O Brasil tem apresentado uma das trajetórias mais preocupantes entre os países da América Latina”, sublinhou Thomaz Favaro, diretor da Control Risks.
Desanima? Certamente. Otimista por natureza, embora duramente testado nos últimos tempos, ainda acredito na capacidade de reação da sociedade. O mal não tem a última palavra. Os brasileiros ficaram trancados em casa por causa da pandemia. Mas ela vai passar. Se Deus quiser. E então, senhores políticos e autoridades, apertem os cintos e revisitem as imagens das imensas passeatas da cidadania que sacudiram o país. Não eram iniciativas convocadas por partidos políticos. Eram famílias, gente normal e pacífica, mas cansada do sequestro do seu presente e da condenação do seu futuro.
O combate à corrupção é uma das demandas mais fortes da sociedade. A corrupção algema a sociedade. A corrupção desvia para o ralo da bandidagem recursos que podiam ser investidos em saúde, educação, segurança pública etc. A corrupção empurra crianças famintas para a catástrofe da prostituição infantil. O Brasil não vai mais contemporizar.
Cabe a nós, jornalistas e formadores de opinião, assumir o papel de memória da cidadania. Não podemos deixar cair a peteca. Revisitaremos todos os meandros daquele que já foi definido como o maior escândalo de corrupção da história do mundo, o petrolão, um esquema bilionário de corrupção na Petrobrás durante os governos Lula e Dilma, que envolvia cobrança de propina das empreiteiras. Trata-se de um dever ético inescapável.
Cabe a nós, jornalistas e formadores de opinião, assumir o papel de memória da cidadania. Revisitaremos todos os meandros daquele que já foi definido como o maior escândalo de corrupção da história do mundo, o petrolão
Mas, para além das trincheiras internas, a guerra contra a corrupção brasileira ganhou dimensão internacional. Como salientou a promotora Luciana Asper em entrevista exclusiva que me concedeu, a irrefutável gravidade dos impactos da corrupção para o desenvolvimento socioeconômico do Brasil, a certeza de que as estratégias de enfrentamento da corrupção estão globalizadas, a notoriedade internacional do Brasil como país de elevada percepção da corrupção, a aplicação prática dos tratados e cooperações internacionais para o combate à corrupção e a imposição da cultura da integridade pública mudam, por completo, o paradigma de fazer negócios no Brasil e com o Brasil. Resistir a essa verdade e não se adaptar é o mesmo que receber o diagnóstico de uma doença grave e acreditar que ela vai desaparecer sem o devido tratamento.
Resumo da ópera: diante da dicotomia entre as reiteradas tentativas internas de estabelecer caminhos para a impunidade e as iniciativas internacionais de avançar com os tratados e cooperações para o combate à corrupção global, os poderes públicos brasileiros vão ser forçados a mudar.
A corrupção como modelo de negócio está com seus dias contados. A governança do roubo e da delinquência será um suicídio político e empresarial. Nós, jornalistas e formadores de opinião, temos o dever profissional e ético de jogar muita luz nas trevas da corrupção. Trata-se de um crime que paralisa, agride e mata.
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