O país foi sacudido por mais uma ação espetacular desencadeada pela Polícia Federal por decisão do ministro Alexandre de Moraes: a Operação Tempus Veritatis.
A operação que investiga Jair Bolsonaro sob suspeita de tramar um golpe de Estado focou no ex-presidente e alguns de seus auxiliares mais próximos, com 33 mandados de busca e apreensão, 4 mandados de prisão e 48 medidas cautelares. Entre os alvos estavam os generais Augusto Heleno, ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional; Braga Netto, ex-ministro-chefe da Casa Civil e candidato a vice na chapa de Bolsonaro à reeleição; e Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa. Entre os presos, o coronel Marcelo Costa Câmara, ajudante de ordens do então presidente; e Filipe Martins, ex-assessor internacional. O próprio Bolsonaro foi alvo, com a determinação de retenção do seu passaporte. A operação também envolveu o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, que acabou preso por um motivo paralelo, o de porte ilegal de arma de fogo.
Pelo que veio à tona até aqui, as evidências e os contornos da trama são graves. A decisão, de pouco mais de 130 páginas, traz transcrições de conversas entre vários dos investigados referentes à organização de atos populares de repúdio à vitória eleitoral de Lula, realizados em 15 de novembro. Devem, sem dúvida, ser aprofundadas com serenidade, sem pirotecnias e em estrito respeito à lei.
O ativismo judicial, a forte politização do STF, o excesso de protagonismo (inclusive fora dos autos) e certa dose de messianismo justiceiro, sempre em nome de uma boa causa, acabam comprometendo a credibilidade das decisões e a imagem pública da corte
Como bem salientou editorial do jornal O Estado de S.Paulo, “O pior dos males, nessas circunstâncias definidoras da história, é o açodamento, a sanha punitivista, a espetacularização, os excessos cometidos em nome de uma simbologia política e midiática e o descumprimento dos mais estreitos limites dos direitos e liberdades individuais previstos na Constituição”. E prossegue o editorial: “A história recente informa, no entanto, que alguns limites têm se tornado bastante elásticos na busca de culpados pelos atentados à democracia brasileira. O STF e, em particular neste processo, o ministro Alexandre de Moraes têm atuado de maneira heterodoxa em muitos momentos”.
O ativismo judicial, a forte politização do STF, o excesso de protagonismo (inclusive fora dos autos) e certa dose de messianismo justiceiro, sempre em nome de uma boa causa, acabam comprometendo a credibilidade das decisões e a imagem pública da corte.
A deflagração da operação policial se deu dentro do inquérito aberto no STF para investigar as chamadas “milicias digitais” e as fake news (jocosamente chamado por Marco Aurélio Mello – ele mesmo ex-ministro do STF – de “inquérito do fim do mundo”). Esse inquérito foi instaurado em 2019 pelo então presidente da corte, ministro Dias Toffoli. Depois da instauração, sem que se fizesse nenhum sorteio do ministro responsável pela condução do inquérito, ela foi atribuída ao ministro Alexandre de Moraes. Esse inquérito – que ainda tramita até hoje, decorridos mais de quatro anos – já nasceu com um vício de origem: Não pode haver o acúmulo das posições de vítima, investigador, acusador e julgador que profere a decisão final. É exatamente o caso do ministro Moraes. Num crescente contorcionismo da interpretação elástica do artigo 43 do Regimento Interno do STF, tudo é trazido para o arbitrário inquérito.
O Brasil, um país polarizado e radicalizado, precisa recuperar a tranquilidade e a segurança jurídica. Não podemos ter medo de pensar e de opinar. A liberdade de expressão, cláusula pétrea da Constituição, não pode estar submetida aos fervores punitivos dos que se consideram donos da nação.
Ninguém pode ser considerado culpado até prova em contrário. E não só as provas precisam ser seguras e confiáveis, como aos suspeitos deve ser garantido o amplo direito de defesa.
O STF precisa atuar com cautela. Caso contrário, pode sofrer as mesmas acusações de abusos e excessos que alguns de seus ministros fizeram ao trabalho da Operação Lava Jato
Como salientou recente editorial da Gazeta do Povo, “o Código Penal só trata dos crimes consumados ou tentados, o que obviamente não é o caso do golpe que teria sido tramado contra o resultado eleitoral de 2022”. Se a minuta do golpe jamais se tornou um decreto, o golpe, rigorosamente, nunca aconteceu. Quando Moraes afirma que “está comprovada a materialidade dos tipos penais de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito (art. 359-L do Código Penal e de tentativa de golpe de Estado (art. 359-M) do Código Penal”, subverte as normas legais, já que, rigorosamente, não houve golpe. Segue o editorial: “Teria havido, sim, a preparação, mas redigir minutas não é crime. Na mais extrema das hipóteses, seria admissível uma denúncia por associação criminosa, por incitação ao crime por parte daqueles que buscaram angariar apoio de militares para seus planos, ou por constrangimento, no caso das tentativas de pressionar generais a aderir ao possível golpe”.
“Quem defendeu ou planejou uma ruptura institucional estando plenamente consciente do que defendia ou planejava tem de ser devidamente investigado e punido pelos crimes que porventura tenham sido efetivamente cometidos, mas não pelos meramente cogitados ou planejados”, conclui o editorial da Gazeta.
O STF precisa atuar com cautela. Caso contrário, pode sofrer as mesmas acusações de abusos e excessos que alguns de seus ministros fizeram ao trabalho da Operação Lava Jato. A hora é de prudência e de estrito respeito à lei.
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