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Carlos Alberto Di Franco

Carlos Alberto Di Franco

Liberdade de expressão – valor inegociável

(Foto: Bigstock)

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Bons propósitos não justificam o recurso a meios ilegais ou antiéticos. É isso que, infelizmente, estamos assistindo no Brasil. Usando como pretexto os criminosos atos de depredação contra as sedes dos Três Poderes em Brasília, em 8 de janeiro, o governo Lula deve enviar ao Congresso um pacote com medidas supostamente para coibir novas ações de vandalismo contra as instituições.

O pacote deve priorizar quatro eixos: uma emenda constitucional para criar a Guarda Nacional; uma medida provisória sobre internet; e dois projetos de lei, um para aumentar penas para crimes contra o Estado Democrático de Direito, e outro para agilizar a perda de bens para quem participa de crimes contra o Estado.

Trata-se, creio, de um conjunto de medidas pouco alinhadas com as práticas das democracias maduras e com visível afinidade com sistemas autocráticos. O mimetismo não teve sequer a preocupação de disfarçar: Guarda Nacional está, por óbvio, inspirada na Guarda Nacional Bolivariana da Venezuela.

Trata-se de medida desnecessária e de alto risco, que pode criar um exército paralelo sob o comando do Executivo. Deixa de ser uma força de Estado para satisfazer as demandas do governante de turno.

O Congresso Nacional, mais uma vez, ficou calado e não assumiu o protagonismo que lhe cabia na verdadeira proteção da democracia. Como o poder não admite espaços vazios, o governo ocupou rapidinho.

No que diz respeito à liberdade de expressão, o procurador-geral da União, Marcelo Eugênio, confirmou que o governo do presidente Lula da Silva vai atuar para pedir a exclusão das postagens que considerar desinformativas. A iniciativa é de alto risco para a liberdade de expressão, garantia maior da Constituição. Afinal qual conceito será adotado para definir o que é ou não desinformação? Quem vai empunhar a tesoura da censura? O governo? Assim começaram todas as ditaduras. Motivos aparentemente legítimos, mas intenções opacas. A liberdade de expressão, valor essencial, acaba sendo sufocada em nome da defesa do Estado Democrático de Direito. Já vimos isso no Brasil. E não queremos isso de novo. Lula é inteligente. Ele sabe que o poder, mesmo despótico, é sempre temporário, mas a biografia é definitiva.

Afinal qual conceito será adotado para definir o que é ou não desinformação?

O que me preocupa, e muito, é a crescente sintonia de ideias heterodoxas sobre a liberdade de expressão que existe no Executivo e no Judiciário. Isso já começa a ser percebido por importantes veículos no exterior. Basta pensar na preocupação manifestada com as liberdades no Brasil em matérias dos jornais The New York Times e The Washington Post, entre outros.

O governo Lula foi precedido por um conjunto de medidas extravagantes do Supremo Tribunal Federal (STF), particularmente do ministro Alexandre de Moraes.

Alexandre Moraes, em que pese meu respeito por sua pessoa e pelo cargo que ocupa, é, hoje, um dos ministros cujas ações mais têm contribuído para corroer as liberdades democráticas no Brasil, graças à sua condução dos abusivos inquéritos das fake news, dos atos antidemocráticos e das “milícias digitais”. O verdadeiro problema, que está implícito nas falas de Alexandre de Moraes, é que o Judiciário parece disposto a se tornar o que não pode ser: árbitro do que é manifestação de opinião ou do que é fake news.

A rigor, o inquérito das fake news não poderia ter sido sequer instaurado, pois tem como base o artigo 43 do Regimento Interno do STF, que estabelece: “Ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do Tribunal, o presidente instaurará inquérito, se envolver autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição, ou delegará esta atribuição a outro ministro”. Uma vez que as alegadas infrações à lei penal teriam consistido -não se sabe ao certo- em críticas, insultos e deboches sistemáticos dirigidos aos ministros Dias Toffoli e Alexandre de Moraes no ambiente das redes sociais, não há cabimento para a instauração desse inquérito.

A gravidade dos vícios de origem do inquérito tem sido unanimemente apontada por vários juristas, procuradores e estudiosos do Direito. A relativização disso em face de um problema que se procura combater significa, neste caso, o abandono completo do princípio de que os fins não justificam os meios.

A gravidade dos vícios de origem do inquérito tem sido unanimemente apontada por vários juristas, procuradores e estudiosos do Direito

Se apenas porque o pretenso “inimigo” é alguém cuja conduta se considera muito reprovável nos damos ao luxo de abandonar não meras regras processuais, mas princípios basilares da Justiça, impomos não uma vitória contra o erro, mas uma derrota ao Estado Democrático de Direito.

Em um país onde já se instaurou, na prática, a existência do “crime de opinião”, no qual a perseguição ocorre sob o aplauso de parte da sociedade e de intelectuais e até mesmo de jornalistas, e em que repressão se dá sem respaldo constitucional, a carta branca dada a Alexandre de Moraes será uma ameaça à democracia muito maior que aquela que o próprio ministro diz querer combater. Na prática, a censura e a autocensura, fruto do medo da retaliação, já são tristes realidades. E exigem firme condenação.

Cabe ao Congresso cumprir seu papel, defendendo a liberdade expressão e evitando o avanço de medidas antidemocráticas.

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