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Carlos Alberto Di Franco

Carlos Alberto Di Franco

Mais jornalismo e menos narrativa

(Foto: Bigstock)

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As empresas de conteúdo, éticas e independentes, são essenciais para a democracia. Mas precisam se reinventar. E parte importante dessa transformação, urgente e necessária, passa pela decisão de não brigar com a realidade, com os números e os fatos.

Resgato um comentário cirúrgico do jornalista José Roberto Guzzo. Já se passaram quase quatro anos, mas é de uma atualidade plena. Ao analisar a eleição de Jair Bolsonaro em 2018, Guzzo afirmou que “a mídia convenceu a si própria de que não estava numa cobertura jornalística, e sim numa luta do bem contra o mal. Em vez de reportar, passou a torcer e a trabalhar por um lado da campanha, convencida de ter consigo a ‘superioridade moral’. Resultado: disputou uma eleição contra Jair Bolsonaro e perdeu, por mais de 10 milhões de votos de diferença. Não é função dos órgãos de comunicação disputar eleições”, concluiu.

Pois bem, amigo leitor, não fizemos a lição de casa. Passados quatro anos continuamos na mesma toada. Sirvo-me de um texto publicado no blog de José Fucs, competente e respeitado jornalista do Estadão, para corroborar minha hipótese. Ele fala por si. Comprova a imensa distância que separa analistas da realidade dos fatos.

Segundo especialistas, afirma Fucs, “o País vai fechar 2022 em recessão, a inflação está fora de controle e as contas públicas estão explodindo, ameaçando a estabilidade econômica. O quadro sinistro se completa, na visão dos catastrofistas, com o sumiço dos investidores estrangeiros, o tombo dos investimentos na produção e o alto índice de desemprego, que está deixando os mais pobres famintos”.

Os números compilados por Fucs, porém, revelam um cenário bem diferente do que o retratado pelos analistas e reproduzidos acriticamente pelas narrativas militantes.

Crescimento econômico. Em oposição às previsões mais pessimistas, a economia fechou 2021 com crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) de 4,6% e voltou praticamente ao nível em que estava antes da pandemia, em 2019. Com a alta dos juros, para combater a inflação, que não é exclusividade nossa e se espalhou pelo mundo e afetou os preços dos combustíveis e dos alimentos, o ritmo de atividade perdeu força e já apareceu gente prevendo que o País fechará o ano em recessão.

Como os Estados estão com o caixa recheado, com algo em torno de R$ 100 bilhões, em razão do congelamento salarial do funcionalismo nos últimos dois anos, alguns estudiosos acreditam que isso deverá resultar em mais obras públicas e em reajustes para os servidores, oxigenando a economia. Se somarmos os investimentos privados já contratados para a área de infraestrutura em 2022, de cerca de R$ 390 bilhões, o equivalente a 4,5% do PIB, de acordo com estimativas do Programa de Parceria de Investimentos (PPI), parece viável que a taxa de crescimento surpreenda os mais céticos novamente neste ano.

E parte importante dessa transformação, urgente e necessária, passa pela decisão de não brigar com a realidade, com os números e os fatos

Inflação. Embora o remédio seja amargo, com efeitos perversos na atividade econômica, tudo indica que o Banco Central está conseguindo conter a inflação com a alta dos juros, apoiado em um resultado fiscal que está muito longe do caos previsto por muitos economistas. Depois de atingir 10,38% em 12 meses em janeiro, a inflação deverá ficar em 5,6% em 2022, praticamente a metade do índice atual, de acordo com as projeções dos bancos compiladas no Relatório Focus, do Banco Central.

Contas públicas. É provável que nenhum outro indicador tenha comprometido tanto a reputação dos profetas do negativismo quanto o das contas públicas. Em vez do caos previsto, o setor público consolidado, que inclui a União, os Estados e os municípios, fechou 2021 com um superávit primário de R$ 65 bilhões, o primeiro desde 2013, equivalente a 0,75% do PIB.

Investimento estrangeiro. Dizem, diariamente, que os investidores externos estão dando no pé. Pois bem, o Brasil fechou 2021 em 7º lugar no ranking dos países com o maior volume de investimentos estrangeiros diretos, com um total de US$ 58 bilhões. Nos dois primeiros meses de 2022, investimentos externos na Bolsa chegaram a R$ 56,8 bilhões. Não está mal. Está longe de representar um voto de desconfiança no País.

Investimentos na produção e infraestrutura. As narrativas dos catastrofistas apostavam numa forte marcha à ré. O que se vê, porém, é que não só os investimentos não estão caindo como estão subindo de forma considerável. Em 2021, a taxa de investimento foi de 19% do PIB, maior nível desde 2015.

O saldo da balança comercial em 2021 foi de U$ 61 bilhões, maior nível da história. No ano passado, o País criou 2,7 milhões de empregos formais, melhor resultado desde 2016.

É fato que, em três anos de governo, nenhuma estatal emblemática foi privatizada.

Ao mesmo tempo, o presidente Jair Bolsonaro não se empenhou para acelerar o processo como deveria, descumprindo sua promessa de campanha de reduzir a presença do Estado na economia.

Aí estão os números e os fatos. O governo tem problemas? Sim. Mas não dá, com honestidade intelectual, para dizer que estamos indo para o abismo. Façamos mais jornalismo e menos narrativa.

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