Recentes editoriais do jornal O Estado de S.Paulo puseram o dedo numa ferida que demanda urgente tratamento: o ativismo judicial e o excessivo protagonismo monocrático do ministro Dias Toffoli no processo de desconstrução da verdade sobre o maior caso de corrupção da nossa história.
O primeiro editorial foi publicado no dia 23 de maio. O jornal, com clareza e elegante contundência, mostra ao leitor e à sociedade a violência contida nas recentes canetadas do ministro.
A narrativa sobre a Operação Lava Jato a que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli tem se dedicado a escrever nos últimos meses ganhou mais um capítulo. “Monocraticamente, como se tornou habitual, o ministro declarou a ‘nulidade absoluta’ de todos os atos processuais e investigações em desfavor de ninguém menos que o notório empreiteiro Marcelo Odebrecht, uma das figuras mais identificadas como o esquema do ‘petrolão’ do PT”.
Prossegue o editorial, apoiado numa lógica afiada: “De antemão, é preciso registrar que, fosse Dias Toffoli minimamente cioso das obrigações que as leis, a ética profissional e o senso de decência impõem à toga, ele não deveria assinar uma lauda sequer em processos envolvendo a Novonor (antiga Odebrecht) ou seus altos executivos, por absoluta suspeição. Como é público, Marcelo Odebrecht já identificou Dias Toffoli, em depoimento oficial, como sendo ‘o amigo do amigo do meu pai’, numa referência ao presidente Lula da Silva, à época investigado no âmbito da Lava Jato, e ao pai do empresário, Emílio Odebrecht – de fato, um amigo de longa data do petista”.
Convém registrar que o que motivou a instauração do inquérito das fake news foi a publicação de uma matéria na revista Crusoé que trazia uma referência ao ministro Dias Toffoli durante apuração feita na Operação Lava Jato. Esse inquérito – que ainda tramita até hoje, já decorridos cinco anos – tem permitido a tomada de uma série de medidas, também monocráticas e flagrantemente ilegais, contra pessoas que nem mesmo poderiam ser julgadas no STF – o que, por si só, torna abusivas as medidas determinadas.
Num crescente contorcionismo da interpretação elástica do artigo 43 do Regimento Interno do STF, tudo é trazido para o arbitrário inquérito. A liberdade de expressão, garantia maior da Constituição, foi para o ralo da ditadura judicial.
Mas o salto olímpico de desrespeito à Constituição e de agressão às liberdades se deu durante o mandato do ministro Alexandre de Moraes na presidência do TSE. O que se viu foi uma escalada de medidas explícitas de censura e prisões arbitrárias.
Mas voltemos, amigo leitor, às surreais canetadas monocráticas do ministro Toffoli.
Na terça-feira, 28 de maio, o Estadão publicou novo editorial alertando para as consequências das decisões daquele que disse que os ministros da corte são “editores de um país” e que, agora, armado de notável diligência, está empenhado na demolição da verdade e reconstrução da história.
O ministro é o executor “da narrativa lulopetista de que o esquema de corrupção do petrolão foi na verdade invenção de uma conspirata de procuradores e magistrados em conluio com agentes internacionais para alijar ‘guerreiros do povo brasileiro’ do poder”.
“A história narrada e comprovada pelos envolvidos em acordos com o Ministério Público é bem diferente. Executivos da Petrobras recebiam propinas das empreiteiras para fechar contratos superfaturados. No exterior, os governos lulopetistas abriam as portas para governos alinhados para a contratação de obras viabilizadas com linhas de créditos do BNDES. Segundo o Tribunal de Contas da União, em uma década a Odebrecht foi beneficiada com 80% desse crédito. Enquanto isso, os marqueteiros de partidos políticos se encarregavam de lavar o dinheiro do financiamento ilícito de campanhas.”
Tudo isso foi descrito em detalhes por delatores como Marcelo Odebrecht em acordos de leniência e colaboração premiada homologados pelo STF. No caso do processo da Odebrecht, Toffoli, como já foi dito anteriormente, nem sequer deveria ser o relator. Identificado nas planilhas da empreiteira como “o amigo do amigo [Lula] de meu pai [Emílio Odebrecht]”, deveria ter se declarado impedido. Não o fez. Lamentavelmente.
Como apontou em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo o diretor da Transparência Internacional no Brasil, Bruno Brandão, sob volumosas pás de cal lançadas por sua corte suprema, “o Brasil se tornou um grande cemitério de provas de corrupção transnacional” e agora, “depois de exportar corrupção, está exportando impunidade”.
Respeito o Supremo Tribunal Federal e conheço alguns dos seus ministros. O próprio ministro Alexandre de Moraes é um bom constitucionalista. O ministro Gilmar Mendes e o atual presidente da corte, Luís Roberto Barroso, têm sólida formação jurídica.
No entanto, em razão das sucessivas canetadas monocráticas, incluindo essas últimas de Toffoli, alguns correm o risco de entrar para a história como especialistas na promoção da impunidade, no cerceamento das liberdades e na apologia da agenda identitária.
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