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Foto: Pedro Serapio/Gazeta do Povo
Foto: Pedro Serapio/Gazeta do Povo| Foto:

Eu e meu filho andamos bem ocupados por estes dias. O Remoinho, nosso amado fusquinha 1973, não tem luz de ré, o que faz com que seja complicado sair da garagem de noite e manobrar na nossa ladeirinha, que é completamente escura se não houver luz da lua. Alegrias de morar na roça. Resolvemos então adaptar uma luz de ré no Remoinho – que tem este nome porque remoinho é meio de transporte de saci, e como sou perneta e fumo cachimbo… Comprei pelo Mercado livre um par de faixas de leds por vinte reais (frete incluído), e lá fomos nós instalá-las. A escolha de lugar foi fácil: no para-choques, onde elas mal aparecem. E lá fiquei eu, de cabeça para baixo, soldando fios escondidos dentro dos para-choques até termos uma luz mais forte que a que eu imaginava iluminando nossas investidas para a retaguarda.

Depois resolvemos aproveitar o ensejo para fazer outra adaptação, esta um pouquinho mais complicada. O negócio é que não usamos o banco de trás do fusca. Na verdade, o assento dele fica guardado num canto da garagem e o encosto fica permanentemente rebaixado para a frente, para que caiba minha cadeira de rodas no espaço de trás. O resultado de botar cadeira e tirar cadeira algumas vezes por dia é que acaba sendo rasgado e marcado por todo lado o curvim, aquele material plástico imitando couro que alguns comerciantes chegam ao ponto de picaretagem de chamar de “couro ecológico” ou coisa que o valha. Resolvemos, então, ir mais longe. Compramos uns pedaços de teto de ônibus desativado, umas placas de alumínio grossas e resistentes, e nos metemos a substituir o encosto do banco de trás e todo o forro do “buraco” que fica atrás do banco de trás dos fuscas com alumínio. Basicamente, a ideia é transformar a parte de trás do fusca num bagageiro de metal resistente.

Passamos outra tarde neste afã, sem conseguir todavia concluí-lo. Mas quase; paramos quando escureceu, mas já havíamos cortado com perfeição as placas de alumínio para que se acomodassem na traseira do banco de trás e no fundo do veículo. Ficou faltando apenas a parte mais chata, que é tirar a tinta cor de ônibus que ainda reveste o alumínio e aparafusar tudo definitivamente no lugar. Vai ficar um bagageiro resistente, ótimo para carregar a cadeira, e prateado como algo vindo do espaço sideral.

Na verdade, isso é que é ser dono de um carro (ou de qualquer outra coisa). Quem não é capaz, por qualquer razão que seja, de consertar ou melhorar um bem que possui na verdade não é o dono daquele bem. Se a garantia do fabricante nos impede de fazer isso ou aquilo, é porque o dono daquilo é o fabricante, não nós mesmos. Mas vai convencer o fabricante! Nos EUA houve um escândalo porque os tratores de uma determinada marca só aceitavam que as trocas de peças fossem feitas no representante; se o dono trocasse a peça por conta própria, o trator cessava de funcionar. Acabaram tendo que inventar todo um sistema pirata para enganar os sensores do trator e possibilitar o conserto pelos próprios donos, que é evidentemente um direito inalienável. Quem é o dono, afinal?! Mas o mesmo acontece com os telefones mais famosos: ai de quem se meter a gato-mestre e trocar em casa uma bateria velha ou um visor quebrado de um iphone!

Ser realmente dono de algo é conhecê-lo, é perceber como ele funciona e como ele deixa de funcionar; perceber suas manias e idiossincrasias – porque mesmo dois carros do mesmo modelo e ano, com números de série sucessivos, vão se comportar de maneira levemente diferente – e saber lidar com elas. Consertar alguma coisa, ainda que simples. No mínimo, no caso de um carro, trocar o pneu, trocar o óleo, trocar as velas, os limpadores de para-brisa… Cuidar de algo é fazer daquele objeto algo realmente seu, ao invés do contrário. Quem não cuida do bem que tem, mas espera que o bem mande no dono – como tanto ocorre com telefones celulares – não é dono dele. Troque a memória do seu computador. Reinstale o sistema operacional. Abra a torre e limpe-o com um aspirador. Faça dele algo realmente seu.

É fuxicando nas coisas que tomamos posse delas. Vamos lá, coragem! Tente fazer voltar a funcionar aquilo que parou. Tente melhorar aquilo que já é bom. Seja dono de suas próprias coisas. Elas ficarão mais felizes ao perceberem que têm dono.

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