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Hugo e Oskar provavelmente nunca teriam se encontrado. O primeiro, de sobrenome Cabret, viveu na Paris do fim da década de 20 e amava o cinema mudo. Já estaria morto, ou muito idoso, quando o outro garoto, na dilacerada Nova York do pós-11 de Setembro de 2001, empreendeu a sua grande aventura, planejada nos mínimos detalhes. Mesmo assim, esses dois meninos, personagens principais, respectivamente, de A Invenção de Hugo Cabret e Tão Forte e Tão Perto, indicados neste ano ao Oscar de melhor filme, têm muito em comum.

Filho de um relojoeiro, também funcionário de um museu, Hugo (Asa Butterfield) perde o pai (Jude Law) em um incêndio. Órfão, é levado pelo tio bêbado para viver numa estação de trem, onde recebe a tarefa de ajustar os relógios. Nada mais lógico. Como herança, ganha apenas um autômato, espécie de robô primitivo, que, caso volte a funcionar, talvez seja capaz de oferecer ao menino uma resposta que de alguma forma lhe explique por que ficou só no mundo. Mas para isso ele tem de encontrar uma chave, em forma de coração, que coloque a máquina de novo em funcionamento.

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O pai de Oskar (Thomas Horn) também morre. Não em um incêndio, mas nos ataques terroristas às Torres Gêmeas. Era joalheiro e estava em um dos prédios para uma reunião. Seu corpo nunca foi encontrado e o garoto teve de ir ao enterro de um caixão vazio, por insistência da mãe. Aspirante a inventor, ele pensa como um futuro homem da ciência: necessita de provas.

Mas, como o sonhador Hugo Cabret, Oskar também precisa acreditar na existência de uma pista, de um sinal que o reconecte à figura paterna, e lhe dê algum tipo de explicação para a tragédia. Curiosamente, a solução para esse enigma também se materializa sob a forma de uma chave, encontrada por Oskar dentro de um envelope marcado com o sobrenome “Black”, guardado dentro de um vaso no closet do pai, vivido por Tom Hanks.

Essa chave pode abrir uma caixa de correspondências, um armário, um cofre ou uma porta qualquer. Pouco importa, na verdade. O que vale aqui é a esperança de Oskar. Ele crê que, atrás dela, escondida em algum lugar, possa estar a resposta que tanto busca. Resta-lhe, então, partir em sua jornada, que o levará à casa de todos que tenham sobrenome Black na lista telefônica.

Tanto Oskar quanto Hugo esperam ter sido presenteados com uma derradeira lição. Um alento ou um afago, capazes de cicatrizar o flanco aberto pela perda que sofreram, de suavizar a inevitável e dolorosa constatação de que, dali para frente, terão de caminhar sozinhos, com os próprios pés. E não se dão conta de que já estão fazendo isso ao se colocarem em movimento.

Todos nós acreditamos, em algum momento da vida, por mais breve que seja, que nossos pais, e somente eles, serão capazes de nos guiar em segurança rumo ao mundo dos adultos. Eles teriam nos bolsos essas tais chaves capazes de, figurativamente ou não, abrir portas, desvendar mistérios, dar sentido e prover respostas ao que não compreendemos. E de nos apontar caminhos mais seguros. Mas nem sempre é o que ocorre dentro ou fora da tela.

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Curiosamente, em nenhum dos dois filmes, as tais chaves são instrumentos moldados ou destinados intencionalmente pelos pais aos meninos com o intuito salvá-los. Ninguém, afinal, tem mesmo esse poder – a não ser os próprios garotos.

É na busca, e não no resgate das chaves em si, que Oskar e Hugo, por meio de encontros (muitas vezes com desconhecidos, que entram em suas vidas com a força transformadora do afeto sincero, da amizade e da soliedariedade) que eles conseguem reconfigurar seus caminhos e desenvolver remédios alternativos capazes de aplacar a dor e a solidão, terríveis em certos momentos, que deveras sentem. Mas esse sofrimento não é uma sentença de morte.

Eles se transformam, de alguma forma, em pais de si mesmos, ainda que suas feridas, em vez de se cicatrizarem por completo, também se tornem parte do que são.