Ensaio sobre a Cegueira, lançado na última sexta-feira, estreou muito bem no Brasil. Com 95 cópias distribuídas pelo País, o filme de Fernando Meirelles inspirado no romance homônimo do escritor português José Saramago levou mais de 120 mil pessoas aos cinemas no primeiro fim de semana de exibição. Esse resultado confere ao filme a melhor média por cópia de todo o mercado.
A boa resposta do público brasileiro confirma que Meirelles tornou-se uma espécie de “atestado de qualidade” quando oassunto é cinema nacional, pelo menos na cabeça do grande público.
Eu gostei bastante do filme, que admite diversas leituras.Pode ser visto como um filme de suspense, com toques de ficção científica e de saga futurista, na linha do ótimo Filhos da Esperança, de Alfonso Cuarón. Também pode ser interpretado como uma fábula poderosa e sombria sobre o estado de cegueira em que vivemos no mundo contemporâneo, incapazes de enxergar injustiças sociais, atos de crueldade e opressão que acontecem muitas vezes ao nosso lado sem que tomemos conhecimento.
Para Saramago, um homem de esquerda, o individualismo crescente é uma praga e apenas um surto, um choque das proporções da epidemia assola o mundo no longa de Meirelles, é que poderá, talvez, forçar os seres humanos a olhar para dentro de si mesmos e a tentar rever suas atitudes e valores.
Um dos aspectos que mais chamou minha atenção em Ensaio sobre a Cegueira,além da brilhante atuação de Julianne Moore, foram os excepcionais trabalhos do diretor de fotografia (Cesar Charlone, de Cidade de Deus) e da direção de arte. Eles foram capazes de se apropriar de locações em São Paulo (e Montevidéu), para criar um mundo esfacelado, caótico e barbarizado que em momento algum me pareceu fakem cosmético.
Embora alguns personagens – como o crudelíssimo barman encarnado por Gael García Bernal – sejam menos complexos e mais manqueístas do que deveriam, tal o peso que têm na história, recomendo Ensaio sobre a Cegueira com entusiasmo. Vejam!