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É redundante dizer aqui que sou um apaixonado pelo cinema. Mas, quando fico sabendo que um grande livro vai se transformar em filme, fico dividido. Foi isso que senti ao descobrir que A Estrada, o extraordinário romance de Cormac McCarthy, um dos maiores escritores norte-americanos vivos, seria adaptado.

Vencedor do Prêmio Pulitzer, o romance de McCarthy é devastador. Em um futuro indeterminado, depois de uma hecatombe, um homem e seu filho vagam em um mundo quase morto, onde as árvores secaram, a comida é escassa e a luz do sol é pálida. Os seres humanos sobreviventes resistem numa terra sem lei, perdem aos poucos as referências de civilização e muitos recorrem à bestialidade, tornando-se canibais, estupradores, assassinos.

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Na competente adaptação de John Hillcoat, não completamente fiel à obra que o originou, foi preservado o principal: o clima de profundo desolamento e de falta de esperança que contrasta com o infinito amor que une o homem (Viggo Mortensen, que merecia ter sido indicado ao Oscar de melhor ator) e o seu menino (Kodi Smit-McPhee, excelente). Isso é motivo de alívio e certo júbilo. Pode até não ser tão sensacional quanto o romance, mas não o envergonha de forma alguma.

Durante a sessão à qual assisti ontem à tarde no UCI Estação, alguns espectadores saíram antes do fim da sessão. O filme incomoda muito, sim. É árido, cruel e, por vezes, insuportável para quem vai ao cinema em busca (apenas) de diversão. Para mim, isso é um bom sinal. Acho importante quando o cinema provoca esse desconforto e rejeição. Quem não aguenta, tem o direito de ir embora. Melhor do que ficar conversando durante a projeção.

O brilhante trabalho do diretor de fotografia Javier Aguirresarobe (de Vicky Christina Barcelona e Lua Nova), espanhol que começa a ganhar espaço no cinema americano, ajuda a transportar o público a esse mundo quase no fim, horrível e opressivo. Assim como a direção de arte, os figurinos e a trilha sonora (coassinada por Nick Cave).

Embora tenha um desfecho levemente mais otimista do que o livro, isso não chega a ser uma concessão grave ou uma traição ideológica ao romance. A Estrada é um filme do qual não se sai ileso. Isso é ótimo.

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