O governo federal propôs em outubro, no contexto da reforma tributária, taxar livros em 12%. Hoje, o mercado de livro é protegido pela Constituição de pagar impostos (art. 150). A lei 10.865, de 2004, também garantiu ao livro a isenção de Cofins e PIS/Pasep. Em outra frente, na última quarta-feira (9), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) anunciou que a Câmara de Comércio Exterior (Camex) zerou o imposto de importação cobrado sobre armas de fogo, como revólveres e pistolas.
Estudos mostram que em países ricos se lê mais que em países pobres. Na França, por exemplo, uma pesquisa do Centro Nacional do Livro (CNL) constatou que cada habitante leu 21 livros, em média, no ano de 2019. No Brasil, a pesquisa Retratos da Leitura, do Instituto Pró-Livro, revela que 44% da população não lê e 30% nunca comprou um livro. A média de obras lidas por pessoa ao ano é de 4,96, isto é, mais de quatro vezes menos que a dos franceses.
De outro lado, o número de pessoas assassinadas com armas de fogo no Brasil cresceu 6,8% no país entre 2016 e 2017, de acordo com dados do Atlas da Violência de 2019. O estudo é do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Em 2017, 65.602 mil pessoas foram mortas no Brasil, sendo que 47.510 mil (72,4%) foram mortas por tiros.
Esses dados colocam o Brasil como o país com maior número de mortes por arma de fogo no mundo, segundo a Pesquisa Global de Mortalidade por Armas de Fogo (Global Mortality from Firearms).
No Japão, que tem menos de uma arma (0,6) para cada grupo de 100 pessoas, segundo dados do governo, o número de mortes por armas de fogo é próximo de zero. Em 2015, por exemplo, o país registrou 6 mortes com armas de fogo. Isso mesmo: 6 mortos durante um ano inteiro, em uma população de cerca de 130 milhões de habitantes.
Zerar impostos sobre importação de armas e, ao mesmo tempo, taxar livros são medidas contraditórias com risco de consequências ruins para o Brasil. Por um lado, dificulta o acesso ao conhecimento, ao ensino e ao lazer. Por outro, amplia as possibilidades de mais armas nas ruas, mais pessoas armadas.
Levantamento do Instituto Sou da Paz revelou que cerca de 68% das armas apreendidas em flagrantes na capital paulista têm origem legal e que 40% delas não tiveram a numeração raspada. Em um país em que o crime escapa ao controle das forças de segurança, especialistas concluem que um maior número de armas terá como consequência mais violência e mortes.
A medida do governo federal para isentar de impostos sobre importação de armas atende as prioridades da população brasileira no momento? Essa é uma pergunta que os tecnocratas e líderes políticos do governo deveriam responder.
O Instituto Ipsos, terceira maior empresa de pesquisa e de inteligência de mercado do mundo, entrevistou pessoas de 28 países, incluindo o Brasil, para saber quais as suas maiores preocupações. As entrevistas foram feitas entre 20 de março de 03 de abril deste ano. A “covid-19” ficou em primeiro lugar no ranking, com 52%. A segunda posição, “acesso ao sistema de saúde”, teve 46%. Para completar o pódio, o “desemprego” foi citado por 39% dos ouvidos no Brasil. Em quarto ficou “pobreza e desigualdade social”.
Armas não são prioridades no Brasil. O país precisa recolher impostos de setores não essenciais para poder compensar e tomar medidas que possam reduzir a carga tributária e os preços de produtos de sobrevivência da população, principalmente alimentos e remédios, além serviços essenciais, como educação, saúde, saneamento básico.
Os preços dos alimentos sofreram alta de 2,54% em novembro, segundo dados divulgados no último dia 8 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Com o resultado de novembro, a alta acumulada de janeiro a novembro alcançou de 12,14% — a maior para um ano desde 2002, quando os alimentos subiram 19,47%.
Grande parte dos brasileiros não tem dinheiro hoje para comprar carne, arroz, feijão, leite e legumes. As pessoas não se alimentam de armas. Seres humanos precisam de comida para se alimentar, profissionais de saúde capacitados e bem remunerados, hospitais, livros, escolas e professores. Não precisam de revólveres e pistolas para matar ou morrer.
Há algumas frases que mostram a importância dos livros na formação de uma pessoa, de um país e da civilização. Uma dessas frases é atribuída ao poeta Mario Quintana: “Livros não mudam o mundo, quem muda o mundo são as pessoas. Os livros só mudam as pessoas”. Quem sabe, se o pessoal do governo lesse um pouco mais, as soluções para os problemas do Brasil se tornariam mais fáceis.
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