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Uma das urgências em todo o mundo é como bloquear a onda de desinformação. Além da desmonetização de canais disseminadores de informações falsas, há necessidade de regular as chamadas big techs e fortalecer o jornalismo como antídoto às fake news. A regulamentação das grandes empresas de tecnologia abrange várias questões, com destaque para a taxação dessas companhias. E nesse ponto específico há um emaranhado de interesses que ameaça excluir quem produz informações de interesse público: os jornalistas e as jornalistas.
De um lado, empresas de mídia tradicionais buscam acordos com big techs, como Alphabet Inc. (Google, YouTube), Meta Platforms (Facebook, Instagram, WhatsApp), Apple e Microsoft (Windows, Office, Skype), para obter remuneração pelos conteúdos jornalísticos que circulam nessas plataformas. Ao mesmo tempo, governos de vários países buscam taxar essas grandes empresas de tecnologia em busca de estancar a evasão de impostos. E nesse meio estão os jornalistas, responsáveis pela produção de informações seguras de interesse público.
Não basta apenas estabelecer regras para que as gigantes de tecnologia sejam mais transparentes, que adotem medidas eficazes de combate à desinformação e que paguem devidamente impostos, como qualquer outro setor tributado. É preciso que essas empresas contribuam diretamente com o jornalismo de interesse público e os jornalistas, condição para enfrentar a onda de desinformação e fortalecer a democracia em todo o mundo.
A Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) tem posição clara a favor da taxação das grandes plataformas digitais. Para isso, lançou em fevereiro deste ano uma campanha em defesa da taxação das big techs, com a consequente criação do Fundo Nacional de Apoio e Fomento ao Jornalismo (Funajor). Os recursos do fundo seriam destinados exclusivamente para fortalecer a profissão por meio da implementação de formas de financiamento público para a produção jornalística. A medida conta com o apoio de entidades internacionais, como a Federação Internacional dos Jornalistas (FIJ) e da Fundação Friedrich Ebert (FES).
A proposta da Fenaj é a que mais representa os interesses da população entre as que foram colocadas na mesa até agora. Especificamente, a proposição apoiada por jornalistas de todo o Brasil e de outros países prevê a criação de uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE). Trata-se de um imposto especial que permite sua destinação a determinado fim, neste caso, ao Funajor, fundo que financiaria a produção de informação de interesse público (jornalismo) e daria suporte aos jornalistas.
Medidas já adotadas em alguns países, inclusive no Brasil, que privilegiam acordos separados das big techs com empresas de mídia tradicional, não são o melhor caminho por excluírem quem produz jornalismo, isto é, os jornalistas. Na Austrália, por exemplo, onde foi aprovada lei para pagamento de conteúdos jornalísticos por parte das big techs, os acordos não têm transparência e não se sabe se os recursos estão sendo usados em jornalismo e com os jornalistas. Além disso, os acordos não beneficiam produtores independentes de jornalismo.
Também é prejudicial a ideia de o governo taxar as grandes empresas de tecnologia que faturam com jornalismo, destinando todos os recursos para o tesouro. Nesse caso, o governo ficaria com a prerrogativa de usar todo o montante arrecadado como bem entender.
Outras entidades e organizações ligadas aos jornalistas e ao jornalismo, como a Associação de Jornalismo Investigativo (Abraji) e o Fórum Nacional para a Democratização da Comunicação, também buscam garantir participação nesse debate vital para a democracia. O que não pode é continuar a situação atual, em que empresas como Google e Facebook lucram com conteúdo jornalístico, mas excluem os jornalistas dos ganhos e não oferecem garantias que beneficiem a informação pública como direito, alicerce do jornalismo e antítese à desinformação.