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Profissionais das duas áreas travam briga judicial pelo direito de fazer alguns procedimentos estéticos em pacientes

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A briga não é nova. Desde 2016, a disputa judicial entre entidades que representam médicos e dentistas pelo direito profissional tem se acirrado. Os cirurgiões dentistas alegam que estão defendendo a liberdade de realizar procedimentos estéticos em seus pacientes e que os médicos tentam impedir. Um dos pontos centrais da discórdia é a aplicação da toxina botulínica, popularmente conhecida como botox.

No último dia 29 de janeiro, quando o Conselho Federal de Odontologia (CFO) publicou a Resolução 198/2019, teve início um novo round dessa luta. O documento reconhece a aplicação de botox e de preenchimentos para fins estéticos no rosto e no pescoço (a chamada “harmonização orofacial”) como procedimento de cirurgiões dentistas. A resolução também normatiza a especialização na área, com carga-horária mínima de 500 horas.

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A decisão do CFO provocou reação imediata de entidades médicas. O Conselho Federal de Medicina (CFM), a Associação Médica Brasileira (AMB), a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) e a Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) entraram com ação judicial para impedir a ampliação da área de atuação dos dentistas. As entidades argumentam que procedimentos estéticos invasivos devem ser aplicados apenas por quem estudou Medicina.

“Há casos de invasão do ato médico praticados por meio de resoluções dos Conselhos Federais de Farmácia, Psicologia, Fonoaudiologia, Educação Física, Enfermagem e Fisioterapia, que foram rechaçados pelo Judiciário, sendo que em todos a fundamentação jurídica para a anulação das resoluções é a ausência de lei federal que permita e dê respaldo às atividades dispostas em ato normativo de caráter infralegal”, diz o CFM.

“Não tenho nenhuma dúvida de que a ação dos médicos é exclusivamente para reserva de mercado.”

Juliano do Vale, presidente do Conselho Federal de Odontologia (CFO).

Os dentistas acusam os médicos de buscarem reserva de mercado. “Essa prática é feita há anos em consultórios de cirurgiões dentistas. O que nós fizemos foi apenas regulamentar a prática e normatizar a especialização na área. Não tenho nenhuma dúvida de que é uma tentativa de reserva de mercado”, diz o presidente do CFO, Juliano do Vale. Ele ressalta ainda que em vários outros países os dentistas podem realizar esses procedimentos estéticos.

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As entidades médicas afirmam também que a formação do dentista em universidades ensina apenas a tratar doenças, e não questões estéticas. Caberia apenas ao médico fazer uso da técnica. Os cirurgiões dentistas rebatem e afirmam estar capacitados para fazer tais procedimentos estéticos pois estão autorizados a manipular botox e, em consultório, resolvem problemas de saúde mais complexos do que procedimentos estéticos.  Afirmam ainda estarem capacitados porque estudam especificamente a biologia do rosto e da face durante todos os anos da graduação.

“Essa não é a primeira vez que as entidades médicas tentam impedir a atuação profissional dos cirurgiões dentistas. Na primeira vez, o CFM nem parte da ação fez. Quem ingressou com as ações foram as associações de dermatologia e de cirurgia plástica. E a ação foi arquivada pela justiça. Mesmo com a nova ação judicial, a resolução do CFO continua valendo e os profissionais poderão continuar fazendo os procedimentos, que já vinham sendo feitos”, ressalva Juliano do Vale.

O presidente do CFO diz estar confiante em uma decisão da Justiça favorável aos dentistas. “Temos bastante segurança de que tomamos a decisão certa no sentido de melhorar a regulamentação da profissão, que é competência do Conselho, o que vai garantir uma melhor formação de especialistas em harmonização orofacial”, observa.

“A norma do CFO configura mais uma tentativa de ampliar irregularmente o escopo de atuação de dentistas, invadindo a esfera de atuação exclusiva dos médicos.”

Trecho de texto publicado pelo Conselho Federal de Medicina.

A disputa deve ir longe.  O CFM criou uma Comissão Jurídica de Defesa ao Ato Médico, composta por advogados e representantes de várias entidades, como os Conselhos Regionais de Medicina (CRMs), que vem estudando medidas. Desde então, o grupo tem proposto ações em diferentes âmbitos em defesa dos interesses dos médicos. Os médicos pedem apuração da responsabilidade de gestores que editaram medidas as quais possam ir contra o Ato Médico e denunciam casos de “exercício ilegal da medicina, com apuração da responsabilidade civil e criminal dos envolvidos nos inúmeros casos de prejuízo a pacientes”.

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A resolução do CFO

A resolução 198/2019 do Conselho Federal de Odontologia (CFO) inclui como área de competência do cirurgião-dentista especialista em Harmonização Orofacial vários procedimentos. Veja alguns deles:

– fazer uso da toxina botulínica, preenchedores faciais e agregados leucoplaquetários autólogos na região orofacial e em estruturas anexas e afins;

– ter domínio em anatomia aplicada e histofisiologia das áreas de atuação do cirurgião-dentista, bem como da farmacologia e farmacocinética dos materiais relacionados aos procedimentos realizados na Harmonização Orofacial;

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– fazer a intradermoterapia e o uso de biomateriais indutores percutâneos de colágeno com o objetivo de harmonizar os terços superior, médio e inferior da face, na região orofacial e estruturas relacionadas anexas e afins;

– realizar procedimentos biofotônicos e/ou laserterapia, na sua área de atuação e em estruturas anexas e afins;

– realizar tratamento de lipoplastia facial, através de técnicas químicas, físicas ou mecânicas na região orofacial, técnica cirúrgica de remoção do corpo adiposo de Bichat (técnica de Bichectomia) e técnicas cirúrgicas para a correção dos lábios (liplifting) na sua área de atuação e em estruturas relacionadas anexas e afins.