| Foto: Reprodução/andes.org.br
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Uma marca das eleições de 2022 é a disseminação de informações fraudulentas nas redes sociais para prejudicar adversários e angariar votos. A prática causa danos ao processo eleitoral e atinge toda a sociedade. Diante dessa aberração, a Justiça Eleitoral vem agindo no sentido de coibir fraudadores, mas as medidas têm se demonstrado ineficazes para reverter os estragos causados à democracia. As decisões de retirada dos conteúdos com informações falsas das plataformas digitais sempre chegam tarde: o mal já foi espalhado.

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O resultado muitas vezes estéril das determinações da Justiça Eleitoral pode ser verificado em vários casos recentes. Na terça-feira (11), por exemplo, o deputado federal mais votado do Brasil em 2 de outubro passado, vereador de Belo Horizonte Ferreira (PL), ironizou a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que determinou que ele excluísse das redes sociais vídeo com informação denunciada como falsa.

“O vídeo, só no Instagram, atingiu 30 milhões de visualizações. O TSE ainda não consegue fazer as pessoas ‘desverem’. O recado foi dado”, postou ironicamente o bolsonarista Nikolas Ferreira no Twitter.

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Com a velocidade de informações (dados) circulando em bits e bytes por segundo (não confundir as duas coisas), o efeito das decisões das autoridades judiciais para retirada de conteúdo falso das redes sociais é pequeno diante dos males provocados. Geralmente, quando a determinação chega, a informação fraudulenta já foi disseminada e atingiu milhões de pessoas. E não para por aí: a facilidade de baixar (downloads) arquivos torna possível que essas falsas informações continuem sendo replicadas.

O Whatsapp é um dos aplicativos mais usados para que esses conteúdos fraudulentos, proibidos pela Justiça eleitoral, continuem a se propagar. Há uso também de e-mails e os serviços de mensagens, como o Messenger. Mesmo que apagados do Instagram, Facebook, Twitter e outras plataformas, os arquivos com desinformação não desaparecem e, pior, são disseminados por meio de outros canais.

Além da ineficácia de decisões que apenas retiram das redes conteúdos fraudulentos que já foram amplamente disseminados, o trabalho para coibir falsas informações enfrenta riscos de ferir a liberdade de expressão. Existe uma linha muito tênue, sobre a qual a Justiça precisa atuar com a ciência de que, qualquer erro, pode também causar danos. Outro risco é o de retirar conteúdos verídicos, que está em conformidade com os fatos.

A sociedade civil e as instituições ainda enfrentam dificuldades para ter ferramentas eficientes no combate à desinformação, apesar da evolução rápida dos últimos anos por meio de mecanismos como as agências de checagem de informações.

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Essas dificuldades facilitam a atuação de quem age de má fé, mas não devem ser usadas como justificativa para "vista grossa", para deixar o campo aberto a quem espalha conteúdo fraudulento nas redes sociais e outros canais de informação. Não bastam apenas as decisões do Judiciário de retirada dos conteúdos fraudulentos das plataformas digitais. Além de agir com rapidez, é preciso ir além, com medidas reparadoras do estrago causado.

O Ministério Público do Trabalho (MPT) tem atuado nesse sentido no combate ao assédio eleitoral nos locais de trabalho e as medidas possibilitam reparar os erros.

Um caso emblemático da atuação eficaz do MPT envolve o proprietário da empresa Cerâmica Modelo, em São Miguel do Guamá, no Pará. Em um vídeo gravado no dia 4 de outubro, logo após a votação do primeiro turno, o empresário prometeu R$ 200 para os empregados em caso de vitória de Bolsonaro.

Após a repercussão do caso e denúncias ao MPT, no último dia 7 o empresário assinou um Termo de Ajuste de Conduta (TAC), em que aceitou gravar novo vídeo, em prazo de 48 horas, pedindo desculpas aos funcionários e à sociedade.

"Vim aqui, primeiramente, pedir desculpa a vocês, que são funcionários da minha empresa", diz ele no novo vídeo. "Ocorreu um erro e eu quero falar para vocês o seguinte: estou aqui me retratando. Se vocês deixarem de trabalhar para mim hoje e forem trabalhar para outro empresário, se o empresário fizer o que eu fiz, denuncie", acrescenta. "Vá ao Ministério Público. Não deixem cometer o mesmo erro que eu cometi. Simplesmente eu fiz uma grande burrice. Isso não vai prejudicar só a mim, mas vocês também. Porque o voto de vocês é livre", diz.

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A reparação pelo dano causado não se restringiu ao vídeo. Pelo acordo, o empresário terá que pagar R$ 150 mil a título de dano moral coletivo. Desse total, R$ 50 mil serão destinados ao custeio de campanha de conscientização política direcionada aos empregadores e veiculado nas emissoras de rádio do Estado do Pará; e R$ 100 mil para projetos sociais.

O proprietário da Cerâmica Modelo também terá de pagar R$ 2 mil a cada um dos seus trabalhadores com vínculo de emprego formalizado ou não formalizado. Também terá de assinar as carteiras de trabalho dos empregados sem registro – uma grave irregularidade – e fornecer equipamentos de proteção individual (EPI).

A Justiça Eleitoral deveria seguir o exemplo do MPT. Pessoas que espalham informações comprovadamente fraudulentas, sejam candidatos/candidatas ou não, deveriam ser responsabilizadas a reparar os danos que a desinformação causa à democracia e à sociedade. No caso de recusa em se retratar publicamente, as instituições deveriam estabelecer formas de fazer a reparação pública, de forma ágil e com rapidez.

O autor de divulgação de fraude informativa não pode ficar impune. A aplicação de multa, depois do processo transitado e julgado, em que o réu tem amplo direito de defesa, é uma forma de coibir quem hoje pratica a desinformação na certeza de que não será punido.

E isso não tem nada a ver com censura. Não se trata de impedir previamente a divulgação de informação - divulgar informação é um direito constitucional que deve ser garantido. Qualquer decisão que vete a circulação de conteúdo informativo verídico é inaceitável. O que se trata aqui é de informação fraudulenta, que fere a Constituição, a democracia e toda a sociedade.

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As pessoas são livres para divulgar o que quiserem - uma garantia fundamental de liberdade que não pode ser afetada -, mas devem saber que poderão sofrer consequências cabíveis em casos de fraude. A questão é como reparar danos causados por informações fraudulentas já divulgadas e amplamente disseminadas e punir responsáveis. A irresponsabilidade e a fraude ferem a liberdade.