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O empresário Luciano Hang, dono das lojas Havan, apoiador do presidente Jair Bolsonaro, disse que se Lula voltar ao governo ele vai repensar sua vida e que não se vê “investindo no Brasil”. As afirmações, feitas em entrevista à revista Veja, publicada no domingo (14), foram recebidas por muitos simpatizantes do ex-presidente como mais um capítulo de radicalização ideológica de Hang quando confrontadas com os resultados recordes que ele obteve na consolidação e expansão de sua rede de lojas durante os governos do PT. Hang afirmou ainda que “uma minoria” de empresários assinou uma “carta hipócrita”, se referindo à Carta em Defesa da Democracia, e que se o petista vencer as eleições deste ano todos “vamos ficar na miséria”.
Os números do crescimento da Havan, desde sua fundação, confirmam a tese de que houve um grande salto de Hang na transformação de sua pequena lojinha de roupas em um megaempreendimento durante o período entre 2002 e 2014. Nesses 12 anos, o Brasil foi governado por Lula, em dois mandados, e Dilma Rousseff, no seu primeiro mandato.
A Havan teve início em 1986, como uma loja de tecidos com apenas 45 metros quadrados, em Brusque, Santa Catarina. Era o ano do Plano Cruzado, do governo Sarney, que estabeleceu rigoroso controle de preços e desembocou em uma escassez sem precedentes de alimentos e vários outros produtos.
Hang demorou nove anos para conseguir levantar a primeira filial da Havan, em Curitiba (PR), em 1995. Nessa época, Fernando Henrique Cardoso havia chegado à presidência com o Plano Real. O país vivia uma onda de esperança por ter, finalmente, debelado o monstro da inflação. Mesmo com a estabilidade da moeda, o Real, e a inflação controlada, a Havan teve crescimento lento. Precisou de cinco anos para chegar à sua terceira filial, inaugurada em 2000, também em Curitiba.
Desde a fundação da lojinha de tecidos em Brusque, em 1986, até a virada do século, passaram-se 14 anos; e nesse longo período, Hang conseguiu somar apenas quatro lojas. Mas essa história iria mudar rapidamente a partir de 2002, exatamente após a chegada de Lula à Presidência da República.
Com o crescimento da economia, a elevação do poder aquisitivo das classes C e D e injeção de recursos obtidos por meio de empréstimo junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (Bndes), a Havan entrou numa fase de rápida expansão. Durante os governos de Lula e Dilma, Hang obteve mais de 50 empréstimos do BNDES, de acordo com dados divulgados em reportagem de 2020 do portal Metrópoles, com base na Lei de Acesso à Informação (LAI). O empresário contesta os empréstimos. Em vídeo publicado nas suas redes sociais em 2 de janeiro de 2020, Hang negou empréstimos junto ao banco público e afirmou que as informações eram falsas.
Nesse período (2002-2014), a cada ano surgiam novas filiais da Havan, em diversas cidades, especialmente de Santa Catarina, como Florianópolis, Joinville, Criciúma, Blumenau, Jaraguá do Sul e Chapecó. Em 2008, já no segundo mandato de Lula, Hang inaugurou quatro novas lojas em cidades catarinenses e paranaenses.
A partir deste momento, o “Véio da Havan”, como o próprio Hang se apresenta em campanhas de marketing da empresa, já era proprietário de um grande comércio varejista, mas a transformação no que muitos chamam hoje de “império do varejo” só aconteceu nos anos seguintes.
No primeiro ano do primeiro mandato de Dilma, em 2011, a Havan inaugurou 15 lojas. Foi um recorde até então. Mas esse não foi o auge. No ano seguinte, a rede chega à loja de número 50, saltando para 62 em 2013. O novo recorde viria no ano da reeleição de Dilma, em 2014, quando Hang comemorou a abertura de 24 novos empreendimentos em apenas 12 meses, uma média de 2 lojas por mês.
A Havan se consolidava em grande parte do país, com 86 lojas – mais da metade do que terminou em 2021 – espalhadas por estados muito além da região Sul, como Minas Gerais, Bahia, Pará e Rondônia.
De 2002, ano da posse de Lula, até 2014, término do primeiro mandato de Dilma, a Havan saltou de 4 lojas para 86 megalojas de departamentos, um crescimento de 2.000%. De 2015 a 2021, A Havan conseguiu seguir expandindo, mas em ritmo bem mais lento do que no período imediatamente anterior: terminou o ano passado com 168 lojas, um crescimento de pouco mais de 90% em sete anos.
Durante o governo Bolsonaro, do qual Hang é defensor, a Havan conseguiu seu melhor desempenho em 2021, quando repetiu o ritmo de crescimento dos anos petistas. No ano passado, a rede inaugurou 15 lojas, mas neste ano a expansão será bem menor. A previsão é de 8 novas lojas durante 2022.
Nos bastidores petistas há quem atribua os ataques de Hang como uma preocupação que ele teria com a possibilidade de um eventual governo Lula tomar medidas que venham a pressionar o aumento dos salários das faixas de trabalhadores com menor poder aquisitivo. Isso, no entendimento desses petistas, atingiria em cheio grande parte dos funcionários da Havan que recebe baixos salários. Nesse caso, obrigado a gastar mais com a folha de pagamento, Hang teria menos recursos para investir na expansão dos negócios.
O piso salarial da categoria em Curitiba, por exemplo, é de R$ 1.715,00, segundo dados fornecidos pelo Sindicato dos Empregados no Comércio de Curitiba (Sindicom). O valor fica abaixo do salário mínimo regional de algumas categorias profissionais no Paraná. Em 14 de janeiro de 2022, o Governo do Paraná anunciou que o valor do piso no estado passou a variar entre R$ 1.617,00 e R$ 1.870,00, de acordo com a categoria profissional.
Para esses aliados de Lula, se for mesmo essa a causa do temor de Hang com o PT, ele estaria equivocado. Na visão destes, um aumento geral de salários das classes C e D faria a roda da economia girar e beneficiaria especialmente o comércio, permitindo elevar as receitas das empresas e mais investimentos, como ocorreu entre 2002 e 2014. Sem considerar que aumento de salários dos funcionários traria melhor qualidade de vida à maioria da população.