Liceu Coração de Jesus, no Campos Elíseos, região central de São Paulo, foi fundado em 1885.| Foto: Reprodução/Página do Facebook do Liceu Coração de Jesus.
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O anúncio do fechamento do Liceu Coração de Jesus, uma instituição de ensino fundada há 137 anos, no Campos Elíseos, região central de São Paulo, provocou indignação. Não é para menos: em um país com dificuldades em oferecer escolas com estrutura adequada, carência de condições materiais nas instituições, déficit de ensino profissionalizante, elevados índices de repetência, baixa permanência dos alunos nas escolas e altas taxas de abandono de alunos, entre outras mazelas, a redução de oferta na deficitária rede educacional do país traz preocupação.

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O encerramento das atividades do Liceu, que já chegou a ter 3 mil alunos, tem um significado mais amplo: o da derrotada da sociedade brasileira para a violência, a miséria, o tráfico de drogas, a ineficiência do Estado em atender necessidades básicas nas áreas de educação, saúde e segurança. O colégio, um dos mais tradicionais do país, onde estudaram milhares de brasileiros, muitos deles conhecidos, como o ator Grande Otelo e o músico Toquinho, encontra-se hoje sufocado pela insegurança em seu entorno – assaltos, tráfico, alta concentração de consumidores de drogas nas ruas (cracolândia) e prostituição.

Teatro instalado no prédio do Liceu, em homenagem ao ator Grande Otelo, que estudou na instituição.| Foto: Reprodução/Google Earth
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O trancamento das portas do Liceu para o ensino simboliza não só um problema na educação. Retrata também a deterioração social e econômica de regiões da maior e mais rica cidade do país que antes eram exemplos de desenvolvimento. Localizada próximo à praça Júlio Prestes, a instituição de ensino foi erguida em uma região rica em arquitetura, com inúmeros prédios históricos, ruas arborizadas, e facilidades de acesso ao sistema de transporte público.

O Liceu é uma instituição privada, da Igreja Católica (Salesianos), mas é preciso interação entre o poder público e a igreja para que a estrutura não fique abandonada enquanto milhares de crianças carentes precisam de escolas de qualidade, bem equipadas.

Liceu em seus bons tempos. Hoje a instituição está no centro de uma região deteriorada socialmente, marcada por insegurança e tráfico de drogas. | Foto: Reprodução/saopauloantiga.com.br

Assim como o problema sem solução da despoluição dos rios Tietê e Pinheiros – por incompetência de gestores públicos, corrupção e desvio de recursos -, a recuperação e o estabelecimento de condições dignas de vivência de determinadas regiões do centro de São Paulo são inadiáveis.

Nas grandes cidades do mundo em que não se perdeu o senso de civilidade, o centro antigo continua vivo, as pessoas podem morar, estudar, ter suas atividades de lazer e cultura. Em São Paulo não: os ricos e a classe média alta vivem em suas prisões de luxo - condomínios fechados com seguranças particulares armados, bairros elitizados com casas reforçadas por meio de cercas elétricas, muros de três metros ou mais de altura e câmeras conectadas a empresas de segurança, além de ruas vigiadas por profissionais de vigilância armados 24 horas por dia.

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Os filhos das classes de maior poder aquisitivo são levados às escolas em carros blindados e ninguém pode colocar um pé para fora das instituições de ensino. O paulistano, da mesma forma que muitos moradores de capitais e grandes cidades brasileiras, perdeu o sentido de liberdade, de poder andar livremente por onde bem deseja. Perdeu-se o direito de ir e vir.